Primeira Circunavegação da Terra (Magalhães-Elcano): o que foi, causas e impactos

Qual foi o contexto histórico que impulsionou as Grandes Navegações?

O século XV e o início do XVI foram um período de intensa efervescência na Europa, marcados por uma série de transformações profundas que impulsionaram a era das Grandes Navegações. A busca por novas rotas comerciais para as cobiçadas especiarias do Oriente, como pimenta, cravo e canela, era uma força motriz central. Essas especiarias eram essenciais não apenas para preservar alimentos, mas também para uso medicinal e como símbolos de status. O monopólio veneziano sobre o comércio terrestre com a Ásia, controlando as rotas do Levante, tornava os produtos extremamente caros ao chegarem à Europa, estimulando outras potências a buscar alternativas.

A crescente riqueza e o poder dos reinos ibéricos, Portugal e Espanha, permitiram o investimento em projetos de exploração marítima de grande escala. Portugal, em particular, havia desenvolvido uma notável experiência náutica sob o comando do Infante D. Henrique, o Navegador, que financiou expedições ao longo da costa africana. Essas viagens pioneiras levaram à descoberta de novas terras e ao estabelecimento de entrepostos comerciais, como os da Guiné e de São Jorge da Mina, consolidando o conhecimento sobre as correntes oceânicas e os ventos favoráveis, cruciais para a navegação de longa distância.

O avanço da tecnologia naval desempenhou um papel indispensável na viabilidade dessas longas viagens. O desenvolvimento de embarcações como as caravelas e naus, mais resistentes, ágeis e capazes de navegar contra o vento, revolucionou a capacidade de exploração. A melhoria de instrumentos de navegação, como o astrolábio e o quadrante, permitiu aos marinheiros determinar sua latitude com maior precisão, embora a longitude ainda fosse um desafio considerável. A cartografia também evoluiu, com mapas mais detalhados e precisos sendo produzidos à medida que novas terras eram descobertas.

A expansão do Islã e a queda de Constantinopla em 1453 para os otomanos interromperam ou dificultaram seriamente as rotas comerciais terrestres tradicionais para o Oriente, aumentando a urgência de encontrar caminhos marítimos alternativos. Essa situação geopolítica forçou as potências europeias a olhar para o oceano como a principal via de acesso às riquezas orientais. A busca por uma rota marítima para as Índias Orientais contornando a África era a estratégia portuguesa, enquanto a Espanha se voltava para o oeste, impulsionada pela aposta de Colombo.

A ideologia da época, profundamente religiosa, também influenciou a expansão marítima. A difusão do cristianismo e a conversão de povos “pagãos” eram justificativas comuns para a colonização, fornecendo um propósito moral e religioso às expedições. Além do fervor religioso, a busca por glória pessoal e para a Coroa, a aquisição de novas terras e a competição entre reinos ibéricos por primazia no cenário mundial eram elementos motivadores fortes. A mentalidade renascentista, com seu ênfase na exploração e no conhecimento, também nutria um espírito de aventura e descoberta.

A pressão demográfica e econômica na Europa, com o crescimento populacional e a necessidade de novas terras cultiváveis e recursos, somava-se ao ímpeto exploratório. A promessa de ouro, prata e outras riquezas nas terras distantes servia como um poderoso incentivo para o investimento e o risco envolvidos nas viagens. A escassez de metais preciosos na Europa, que dificultava o comércio, também impulsionava a busca por novas fontes de riqueza para cunhar moedas e financiar os crescentes Estados nacionais, fortalecendo a ambição por domínio global.

Os êxitos de Vasco da Gama, que abriu a rota marítima para a Índia contornando o Cabo da Boa Esperança em 1498, e de Cristóvão Colombo, que “descobriu” as Américas em 1492, apenas intensificaram a corrida. Portugal solidificava seu império oriental, enquanto a Espanha se dedicava à exploração e colonização do Novo Mundo. A ambição de encontrar uma rota ocidental para as Molucas, as lendárias Ilhas das Especiarias, sem invadir as zonas de influência portuguesa, tornou-se o próximo grande objetivo estratégico para a Coroa espanhola, abrindo caminho para a proposta audaciosa de Fernão de Magalhães.

Quem foi Fernão de Magalhães e qual era sua visão para uma nova rota?

Fernão de Magalhães, nascido por volta de 1480 em Sabrosa, Portugal, era um navegador experiente com uma carreira notável a serviço da Coroa Portuguesa, tendo participado de várias expedições militares e comerciais ao Oriente. Sua vivência nas Índias Orientais, incluindo batalhas em Diu e Malaca, concedeu-lhe um conhecimento profundo das rotas marítimas, da geografia local e das cobiçadas Ilhas das Especiarias, as Molucas. Ele serviu com figuras proeminentes como Francisco de Almeida e Afonso de Albuquerque, acumulando experiência prática em navegação e conflitos no mar.

Magalhães, apesar de sua lealdade inicial a Portugal, enfrentou desencanto e frustração com a corte do Rei Manuel I. Suas propostas para novas expedições foram rejeitadas, e ele sentiu que seus méritos não eram devidamente reconhecidos, especialmente após ser acusado de comércio ilegal. A recusa do rei em aumentar sua pensão e em permitir-lhe uma nova missão foi um golpe considerável à sua ambição. Essa desavença pessoal com o monarca português foi um fator determinante para sua posterior decisão de buscar apoio em outro reino.

A visão audaciosa de Magalhães era encontrar uma passagem ocidental para as Molucas, navegando ao redor do extremo sul do continente americano, que ainda era em grande parte desconhecido. Ele estava convencido, baseado em seus estudos cartográficos e na crença na esfericidade da Terra, que as Ilhas das Especiarias, ricas em cravo e noz-moscada, estariam dentro da esfera de influência espanhola, conforme o Tratado de Tordesilhas. Esta crença era fundamental para sua proposta à Espanha, oferecendo uma rota que não violaria os acordos existentes com Portugal e que seria uma alternativa mais segura e direta.

Ele argumentava que a viagem seria mais curta do que a rota portuguesa ao redor da África e que evitaria os confrontos com as fortalezas portuguesas estabelecidas no Oceano Índico. Sua proposta incluía a ideia de que o oceano a oeste da América seria um vasto e tranquilo mar, uma suposição que se mostraria em parte verdadeira, mas que também subestimava as imensas distâncias envolvidas. A convicção de Magalhães na existência de um estreito no sul da América era baseada em relatos de outros navegadores e em mapas especulativos da época, alimentando sua determinação inabalável.

Para obter o apoio necessário, Magalhães procurou Juan de Aranda, um agente comercial influente na Casa de Contratación de Sevilha, e em seguida Diogo Barbosa, um parente e compatriota estabelecido na Espanha. Com o auxílio deles, ele conseguiu apresentar sua ousada proposta ao jovem rei Carlos I de Espanha (futuro imperador Carlos V). Sua argumentação era convincente, destacando o potencial econômico e estratégico da descoberta de uma nova rota para as Molucas, um tesouro inestimável para o império espanhol que ansiava por rivalizar com Portugal no comércio de especiarias.

A proposta de Magalhães não era apenas sobre encontrar uma passagem, mas sobre estabelecer uma rota comercial viável para a Espanha no coração do comércio de especiarias, garantindo acesso direto e exclusivo. Ele se comprometia a navegar para as Molucas, estabelecer relações comerciais com os governantes locais e retornar com uma carga valiosa. A visão de Magalhães era a de um empreendimento grandioso que não só enriqueceria a Coroa espanhola, mas também expandiria o conhecimento geográfico e validaria a teoria da Terra esférica, um feito monumental para a humanidade.

Apesar das dúvidas e da oposição inicial de alguns conselheiros espanhóis e da forte pressão diplomática de Portugal, a visão e a persistência de Magalhães prevaleceram. O rei Carlos I, com sua própria ambição de expandir o império espanhol e a necessidade de competir com Portugal, viu o potencial estratégico da proposta. A assinatura do contrato em 22 de março de 1518, concedendo a Magalhães e a seu sócio Rui Faleiro o comando da expedição e uma parte dos lucros, foi o passo decisivo que transformou uma visão audaciosa em uma realidade iminente.

Quais foram as motivações econômicas e políticas por trás da expedição de Magalhães?

As motivações econômicas para a expedição de Magalhães foram predominantemente impulsionadas pela insaciável demanda europeia por especiarias. Pimenta, cravo, noz-moscada e canela não eram apenas condimentos de luxo, mas também essenciais para a conservação de alimentos, produção de medicamentos e fabricação de perfumes. O acesso direto às Ilhas das Especiarias, as Molucas, representava a promessa de lucros astronômicos, capaz de enriquecer a Coroa e financiar as crescentes despesas do império. O monopólio veneziano e árabe sobre as rotas terrestres encarecia enormemente esses produtos, tornando a busca por uma rota marítima uma necessidade estratégica.

Do ponto de vista político, a expedição representava um movimento estratégico ousado da Espanha para desafiar a hegemonia marítima de Portugal. Desde o sucesso de Vasco da Gama em contornar a África e alcançar a Índia, Portugal havia estabelecido um império comercial lucrativo no Oriente. A Espanha, embora tivesse as Américas, sentia-se em desvantagem no controle do comércio asiático. A proposta de Magalhães de encontrar uma rota ocidental para as Molucas sem violar as rotas portuguesas era uma oportunidade de ouro para equilibrar essa balança de poder e afirmar a projeção global da Espanha.

O Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494, dividiu o mundo em duas esferas de influência entre Espanha e Portugal, uma linha imaginária a 370 léguas a oeste de Cabo Verde. A grande incerteza residia na delimitação da linha no hemisfério oriental. Magalhães argumentava que as Molucas, ricas em especiarias, estariam no lado espanhol da divisão. Essa disputa de delimitação era uma questão de soberania e de acesso a recursos, tornando a expedição um teste prático dos limites do tratado e uma forma de a Espanha reivindicar sua parte no Oriente.

A Coroa Espanhola, sob o recém-empossado Carlos I, demonstrava uma ambição crescente em expandir seu império. O jovem rei, que viria a ser o poderoso imperador Carlos V, estava determinado a não ficar atrás de Portugal. O financiamento da expedição de Magalhães não era apenas um investimento comercial, mas um ato de afirmação política e militar. A perspectiva de uma nova rota comercial, controlada exclusivamente pela Espanha, não só traria riquezas, mas também prestígio e reconhecimento internacional, consolidando a Espanha como uma potência marítima dominante.

A competição por prestígio e glória entre as potências ibéricas era intensa. A descoberta de novas terras e a abertura de novas rotas eram vistas como grandes feitos que elevavam o status de uma nação e de seus monarcas. Magalhães, um português que buscava fortuna e reconhecimento na corte espanhola, oferecia uma solução que prometia ambos. Para a Espanha, a expedição era uma forma de mostrar ao mundo sua capacidade de empreender projetos ambiciosos e de romper com a dependência das rotas tradicionais, controladas por seus rivais.

A busca por metais preciosos também era uma motivação secundária, mas significativa. Embora as especiarias fossem o foco principal, a promessa de ouro e prata em quaisquer terras recém-descobertas sempre foi um incentivo poderoso para os exploradores europeus. A expedição poderia não apenas encontrar especiarias, mas também novas fontes de riqueza mineral, que eram cruciais para a economia mercantilista da época. A perspectiva de explorar recursos inexplorados em qualquer território encontrado tornava a aventura ainda mais atraente.

Por fim, a expedição refletia uma mudança de paradigma na compreensão do mundo. A curiosidade geográfica e a validação da esfericidade da Terra, embora não fossem as motivações primárias, eram componentes importantes. A capacidade de circunavegar o globo não só abriria novas possibilidades comerciais e políticas, mas também expandiria o conhecimento humano de uma forma sem precedentes. A expedição era uma combinação de ambição mercantilista, rivalidade política e um espírito indomável de descoberta que moldaria o futuro global.

Como a rivalidade ibérica e o Tratado de Tordesilhas influenciaram a busca por novas rotas?

A rivalidade entre Portugal e Espanha era o pano de fundo constante para as Grandes Navegações, uma competição acirrada por terras, riquezas e prestígio que moldou profundamente a busca por novas rotas marítimas. Após o pioneirismo português na costa africana e a chegada de Colombo às Américas sob bandeira espanhola, ambos os reinos se viram em uma corrida global para estabelecer seus domínios. A ambição de cada coroa em superar a outra impulsionava a exploração incessante e o investimento em expedições de alto risco e custos significativos, transformando o Atlântico em um verdadeiro palco de disputas.

O Tratado de Tordesilhas, assinado em 1494, foi a tentativa de gerenciar essa rivalidade crescente, dividindo o mundo em duas esferas de influência por uma linha imaginária. O Papa Alexandre VI mediou o acordo, estabelecendo que terras a leste da linha pertenceriam a Portugal e a oeste, à Espanha. No entanto, a interpretação ambígua e a falta de conhecimento geográfico exato criavam um “vácuo” na parte oriental, especialmente em relação à localização precisa das Ilhas das Especiarias. Essa incerteza gerou uma competição velada sobre qual reino deteria o controle sobre as riquezas das Molucas.

Para a Espanha, o tratado significava que, embora tivessem o Novo Mundo, a rota marítima para as cobiçadas especiarias do Oriente através do Cabo da Boa Esperança estava sob estrito controle português. A busca por uma rota ocidental era, portanto, uma necessidade estratégica para evitar conflitos diretos e respeitar os termos do acordo. A proposta de Fernão de Magalhães de que as Molucas estariam na esfera espanhola, navegando pelo oeste, oferecia uma solução engenhosa para essa delimitação, prometendo acesso a um mercado valioso sem desafiar abertamente a hegemonia portuguesa no Índico.

A pressão diplomática de Portugal sobre a corte espanhola em relação à expedição de Magalhães demonstrava a seriedade da rivalidade. Portugal considerava Magalhães um traidor e sua expedição uma violação potencial de seus direitos, temendo que a Espanha pudesse reivindicar territórios já considerados portugueses. Essa tensão constante entre as coroas ibéricas era um lembrete de que qualquer nova descoberta ou rota poderia desencadear um conflito internacional, exigindo que a Espanha agisse com cautela, mas também com audácia para proteger seus interesses e expandir seu poder.

A busca por uma rota ocidental também era impulsionada pela percepção da geografia mundial. Na época, a extensão do Oceano Pacífico e a posição exata das Molucas em relação à linha de Tordesilhas eram objetos de especulação. Acreditava-se que a Terra era esférica, mas a vasta extensão do “Mar do Sul” (Pacífico) era uma incógnita. Encontrar um estreito que ligasse o Atlântico ao Pacífico e provasse que as Molucas estavam na parte espanhola seria um triunfo não só econômico, mas também cartográfico e legal, validando a reivindicação da Espanha.

A expedição de Magalhães-Elcano, portanto, não era apenas uma aventura de descoberta, mas um complexo empreendimento geopolítico. Ela visava não só adquirir riqueza através do comércio de especiarias, mas também reafirmar o poder espanhol no cenário global, desafiando indiretamente o domínio português sem um confronto direto. A concretização da circunavegação da Terra e a chegada às Molucas pelo oeste seria a prova definitiva de que a Espanha poderia competir com Portugal em todas as frentes de exploração e comércio, redefinindo o mapa-múndi e as esferas de influência.

A longo prazo, a rivalidade ibérica e o Tratado de Tordesilhas continuariam a moldar a expansão colonial, mas a circunavegação de Magalhães-Elcano forneceria dados cruciais para futuras negociações e ajustes territoriais, como o Tratado de Saragoça em 1529, que tentaria resolver as disputas sobre as Molucas no outro lado do mundo. A busca por novas rotas era um reflexo direto dessa competição incessante, onde cada reino tentava explorar as lacunas do conhecimento e do direito internacional para garantir sua supremacia global e acesso a recursos valiosos.

Como a Coroa Espanhola se preparou para a expedição e quais recursos foram alocados?

A Coroa Espanhola, sob a liderança do jovem e ambicioso Carlos I, investiu significativamente na preparação da expedição de Magalhães, ciente do imenso potencial econômico e estratégico da empreitada. A Casa de Contratación de Sevilha, responsável pela administração do comércio ultramarino, foi o centro nervoso dessa organização. Funcionários experientes foram encarregados de adquirir os navios, suprimentos e contratar a tripulação, uma tarefa logística monumental para a época. O objetivo era montar uma frota capaz de enfrentar os desafios imprevistos de uma viagem de longa duração.

A aquisição dos navios foi uma das primeiras e mais importantes etapas. Foram compradas cinco naus, escolhidas por sua robustez e capacidade de carga: a Trinidad, a San Antonio, a Concepción, a Victoria e a Santiago. Esses navios foram meticulosamente equipados e reparados para suportar as condições adversas dos oceanos desconhecidos. Carpinteiros, calafates e marinheiros trabalharam arduamente para garantir que as embarcações estivessem em condições ideais para a longa e perigosa jornada.

Uma quantidade colossal de provisões foi estocada a bordo para sustentar uma tripulação de aproximadamente 270 homens por um período estimado de dois anos. A lista de suprimentos era vasta e incluía alimentos básicos como biscoito, vinho, azeite, carne salgada, peixe seco, feijão e lentilha. Além da comida, foram carregados materiais de construção naval, como madeira e cordas, ferramentas, armas, pólvora e um sortimento de artigos de troca para o comércio com as populações nativas. A diversidade de itens demonstrava a previsão de longos períodos em mar aberto sem reabastecimento.

A seleção da tripulação foi igualmente crucial. Homens de diversas nacionalidades, incluindo portugueses (leais a Magalhães), espanhóis, italianos, gregos e franceses, foram recrutados. A composição da tripulação era heterogênea, com marinheiros experientes, oficiais, artilheiros, cirurgiões e até mesmo um cronista, Antonio Pigafetta, cujo diário se tornaria a principal fonte de informações sobre a viagem. A diversidade de habilidades e conhecimentos era vista como uma força, embora a lealdade e a disciplina fossem constantes preocupações.

A estrutura de comando foi cuidadosamente definida, com Magalhães nomeado capitão-mor da armada, mas com capitães espanhóis nomeados para os outros navios, uma medida para equilibrar o poder e apaziguar as tensões com a nobreza castelhana. Apesar disso, a desconfiança mútua entre a facção portuguesa de Magalhães e os oficiais espanhóis seria um problema recorrente. O rei Carlos I pessoalmente assinou as provisões para a expedição, demonstrando o comprometimento da Coroa com o projeto ambicioso.

O custo financeiro total da expedição foi vultoso, refletindo a escala do empreendimento. Estimativas variam, mas o investimento foi considerável para a época, cobrindo a compra e aparelhamento dos navios, os salários da tripulação e a vasta quantidade de suprimentos. Esse montante demonstrava a confiança da Coroa no retorno do investimento, na forma de especiarias e na afirmação geopolítica. A Espanha estava disposta a arriscar uma soma significativa de dinheiro na esperança de um ganho ainda maior e de uma vitória estratégica sobre Portugal.

A preparação da expedição foi um esforço multifacetado que combinou planejamento militar, logística comercial e diplomacia. Desde a meticulosa seleção dos navios até o recrutamento da tripulação e o carregamento de suprimentos, cada detalhe foi considerado para garantir as melhores chances de sucesso. Apesar de toda a preparação, as realidades do mar aberto e os perigos desconhecidos provariam ser desafios muito maiores do que qualquer planejamento poderia prever.

Qual era a composição da frota de Magalhães e quem eram seus principais comandantes?

A frota de Fernão de Magalhães, que partiu de Sanlúcar de Barrameda em 20 de setembro de 1519, era composta por cinco naus robustas, cada uma com sua própria história e característica, escolhidas para a longa e incerta viagem. A nau capitânia, a Trinidad, comandada pelo próprio Magalhães, era o coração da expedição, onde se concentravam as decisões e o principal equipamento de navegação. A seleção cuidadosa desses navios refletia a necessidade de embarcações que pudessem suportar os rigores de uma travessia oceânica de proporções inéditas, capazes de carregar uma grande quantidade de suprimentos e uma tripulação numerosa.

Os principais comandantes e oficiais da frota eram uma mistura de portugueses leais a Magalhães e nobres espanhóis, muitos dos quais viam Magalhães com desconfiança por sua origem e suas ousadas decisões. Além de Magalhães na Trinidad, o capitão da San Antonio era Juan de Cartagena, o veedor (inspetor) real, um homem de confiança da Coroa com quem Magalhães rapidamente desenvolveu uma relação tensa. Sua posição como representante da Coroa lhe dava uma autoridade considerável, gerando atritos frequentes.

A Concepción estava sob o comando de Gaspar de Quesada, outro nobre castelhano, enquanto a Victoria era comandada por Luis de Mendoza, o tesoureiro da frota. A menor das naus, a Santiago, tinha como capitão João Serrão (Juan Serrano), um português experiente e primo de Magalhães, um dos poucos comandantes que mantinha uma lealdade inquestionável ao capitão-mor. Essa composição refletia a política da Coroa de assegurar a presença de seus próprios homens, mas também gerou fricções inevitáveis e desconfianças que culminariam em motins.

A tripulação total da expedição somava aproximadamente 270 homens de diversas nacionalidades europeias, incluindo marinheiros, soldados, mestres-de-obras, capelães e escrivães. A diversidade da equipe era notável, com um número considerável de portugueses que acompanharam Magalhães de seu país natal, misturados a espanhóis, italianos (como o cronista Antonio Pigafetta), gregos, franceses e flamengos. Essa heterogeneidade linguística e cultural, embora trouxesse uma gama variada de habilidades, também representava um desafio para a comunicação e a disciplina, fomentando divisões internas.

A presença de Antonio Pigafetta, um cavalheiro italiano que pagou sua própria passagem para se juntar à expedição como voluntário e cronista, foi crucial para a posteridade. Seu diário detalhado se tornou a principal e mais completa fonte primária sobre a viagem, registrando os eventos, os desafios, as descobertas geográficas e os encontros com povos nativos. Pigafetta documentou não apenas os fatos, mas também suas próprias impressões e as curiosidades observadas, oferecendo uma perspectiva única da jornada.

Apesar da minuciosa preparação e da imponência da frota ao zarpar, a coesão interna da expedição era um ponto fraco. As tensões entre Magalhães e seus capitães espanhóis, alimentadas por disputas de autoridade e desconfiança mútua, eram palpáveis desde o início. Essa desarmonia seria um fator crítico nos motins e dificuldades que a frota enfrentaria, testando a liderança de Magalhães em momentos cruciais. A composição da frota, com sua mistura de personalidades e lealdades divididas, era um reflexo das complexas relações de poder da época.

Os suprimentos e equipamentos a bordo eram igualmente impressionantes para a época. Além das provisões já mencionadas, cada navio carregava armamentos, incluindo canhões, arcabuzes e bestas, para defesa contra piratas e para estabelecer autoridade em terras desconhecidas. Instrumentos de navegação, como bússolas, astrolábios e quadrantes, eram vitais para o percurso, embora ainda primitivos pelos padrões modernos. A completa equipagem da frota e o número de homens a bordo sublinhavam a magnitude da aposta da Coroa espanhola em um projeto de alcance global e impacto sem precedentes.

Como foi a travessia inicial do Atlântico e os primeiros desafios enfrentados pela armada?

A travessia inicial do Atlântico, após a partida de Sanlúcar de Barrameda em 20 de setembro de 1519, foi uma fase crucial da expedição, marcada por uma série de desafios que testariam a resiliência da tripulação e a liderança de Magalhães. A frota navegou para as Ilhas Canárias, uma parada estratégica para reabastecer suprimentos frescos e água, um procedimento padrão para viagens de longa distância. Essa primeira etapa permitiu aos navios se organizarem para a longa travessia oceânica, ajustando as velas e verificando o equipamento após o período no porto.

A partir das Canárias, a frota rumou para o sul, buscando os ventos alísios favoráveis que levariam os navios em direção à América do Sul. Contudo, essa fase não foi isenta de dificuldades inesperadas. As condições climáticas no Atlântico equatorial podiam ser imprevisíveis, com períodos de calmaria que desaceleravam o progresso, ou tempestades súbitas que ameaçavam a integridade dos navios. A navegação era lenta e tediosa, com a monotonia do mar aberto contribuindo para o cansaço e a impaciência da tripulação, que ansiava por avistar terra firme.

Um dos primeiros e mais sérios desafios surgiu na forma de tensão e insubordinação entre Magalhães e alguns de seus capitães espanhóis. Juan de Cartagena, capitão da San Antonio e veedor real, questionou abertamente a autoridade de Magalhães e seu estilo de comando. Cartagena, que se considerava igual a Magalhães em posto, recusou-se a saudar a nau capitânia em determinados momentos, um ato de desrespeito grave na hierarquia naval da época. Essa disputa de poder era um mau presságio para o resto da viagem, revelando fissuras na cadeia de comando que se aprofundariam.

Magalhães, confrontado com a insolência de Cartagena, agiu com rapidez e firmeza para reafirmar sua autoridade. Após uma série de provocações, Magalhães ordenou a prisão de Cartagena e o substituiu no comando da San Antonio por Álvaro de Mesquita, seu primo. Essa ação, embora necessária para manter a disciplina, alienou ainda mais os outros capitães espanhóis, que viam a remoção de Cartagena como um ultraje à sua dignidade e um sinal do autoritarismo de Magalhães. A decisão de Magalhães, embora decisiva, plantou as sementes para futuros motins.

A travessia do Atlântico, que durou pouco mais de dois meses, foi marcada pela escassez de água fresca, um problema recorrente em todas as grandes viagens da época. A água armazenada em barris rapidamente se tornava suja e rançosa, contribuindo para a deterioração da saúde da tripulação. A dieta monótona de biscoito e carne salgada, sem frutas ou vegetais frescos, também começava a cobrar seu preço, e os primeiros sinais de doenças relacionadas à desnutrição, como o escorbuto, começavam a aparecer, embora de forma mais branda nesta fase inicial.

A chegada à costa do Brasil em dezembro de 1519, próximo ao que hoje é o Rio de Janeiro, trouxe um alívio temporário para a tripulação. A frota passou cerca de duas semanas na Baía de Guanabara, reabastecendo-se de água doce, frutas frescas, peixe e carne, obtidos por meio de troca com os povos indígenas locais. Esse período de descanso e recuperação foi vital para o moral e a saúde dos marinheiros, permitindo-lhes recuperar as forças antes de prosseguir para o sul, rumo ao objetivo principal: a busca pelo estreito.

Essa primeira fase da viagem, embora aparentemente bem-sucedida em termos de navegação, revelou as fragilidades internas da expedição e os desafios logísticos inerentes às viagens de longa distância. As tensões de comando, a escassez de recursos e as condições do mar já haviam começado a cobrar seu preço. A capacidade de Magalhães de manter o controle sobre a frota diante das ameaças internas e externas seria constantemente testada, e cada parada se tornava um momento de reavaliação da estratégia e da coesão da armada.

Que obstáculos geográficos e climáticos a expedição encontrou na costa sul-americana?

A expedição de Magalhães, ao navegar pela costa sul-americana após deixar o Brasil, enfrentou uma série de obstáculos geográficos e climáticos que testaram ao limite a paciência, a engenhosidade e a resiliência da tripulação. A principal missão era encontrar o tão procurado estreito que conectasse o Atlântico ao desconhecido “Mar do Sul”. A costa patagônica, com suas enseadas enganosas e clima hostil, transformou-se em um labirinto de baías e rios que prometiam uma passagem, mas que invariavelmente terminavam em águas rasas ou fundos de saco.

A busca pelo estreito era uma tarefa árdua e desanimadora. A frota explorava cada reentrância da costa, navegando por rios de grande volume como o Rio da Prata, que, por sua vastidão, inicialmente foi confundido com a esperada passagem. Cada tentativa frustrada consumia tempo e suprimentos valiosos, diminuindo o moral da tripulação, que via o verão se esvaindo e o frio do hemisfério sul se aproximando. A incerteza geográfica e a falta de mapas precisos aumentavam a complexidade da navegação, exigindo uma vigilância constante e um conhecimento apurado dos ventos e correntes.

O clima na Patagônia, à medida que a frota avançava para o sul, tornou-se cada vez mais rigoroso. Ventos fortes e gelados, tempestades repentinas e temperaturas em declínio eram uma ameaça constante. A tripulação, acostumada ao clima mais ameno da Europa e dos trópicos, sofria com o frio intenso, a umidade e a falta de roupas adequadas. A exposição prolongada a essas condições climáticas adversas contribuía para a exaustão física e mental dos marinheiros, tornando a vida a bordo ainda mais difícil e propensa a doenças.

A escassez de alimentos frescos e água potável, embora houvesse paradas ocasionais, agravava o sofrimento. A dieta era predominantemente de biscoitos secos e carne salgada, levando ao surgimento de doenças como o escorbuto, que começava a dizimar a tripulação. A busca por locais de abrigo e reabastecimento tornava-se uma prioridade, mas a costa patagônica oferecia poucos recursos e pouca hospitalidade, com paisagens desoladas e populações indígenas ariscas, dificultando a interação para obter suprimentos vitais.

A exaustão e a desilusão com a busca interminável do estreito, combinadas com as condições adversas, culminaram em um motim de grandes proporções na Baía de San Julián, onde a frota ancorou para o inverno. Três dos cinco capitães – Juan de Cartagena, Gaspar de Quesada e Luis de Mendoza – se rebelaram contra Magalhães, cansados de suas ordens e da aparente falta de progresso. Este foi um momento de crise profunda para a expedição, um teste definitivo da liderança de Magalhães e da lealdade de sua tripulação.

Magalhães agiu com brutalidade e determinação para sufocar o motim. Mendoza foi morto em seu próprio navio, Quesada foi decapitado e Cartagena, após ser poupado da morte, foi abandonado em terra com um padre amotinado quando a frota partiu. Essa demonstração implacável de força restabeleceu a ordem, mas também eliminou três dos cinco navios da frota original, com a Concepción e a Victoria perdendo seus capitães. A punição serviu como um severo aviso, mas o custo humano e moral foi alto.

A perda da nau Santiago, que naufragou em uma missão de reconhecimento na foz do Rio Santa Cruz, na Patagônia, adicionou outra fatalidade significativa à expedição. Embora a tripulação tenha sido resgatada, a perda de um navio significava menos capacidade de transporte de suprimentos e uma maior vulnerabilidade para o resto da frota, que agora se reduzia a apenas quatro embarcações. Os obstáculos geográficos e climáticos na costa sul-americana não apenas atrasaram a jornada, mas também reduziram drasticamente os recursos e a confiança da armada, preparando o terreno para o que viria.

Como ocorreu a descoberta e a passagem pelo Estreito de Todos os Santos (Magalhães)?

A descoberta e a passagem pelo Estreito de Todos os Santos, hoje conhecido como Estreito de Magalhães, representaram o ponto de virada decisivo da expedição e um feito náutico de proporções épicas. Após meses de busca exaustiva e desanimadora ao longo da costa patagônica, e o motim brutalmente reprimido em San Julián, a esperança de encontrar a passagem ocidental estava diminuindo. A frota, agora reduzida a quatro navios, havia continuado sua exploração rumo ao sul, enfrentando os ventos gelados e as condições marítimas traiçoeiras da primavera austral.

Em 21 de outubro de 1520, dia de Santa Úrsula e das Onze Mil Virgens, um dos navios de reconhecimento avistou uma estreita e profunda entrada de água. Magalhães ordenou uma investigação cuidadosa, enviando dois navios – a San Antonio e a Concepción – para explorar a baía, que se aprofundava e se estendia para o interior. A cautela era extrema, pois muitas entradas anteriores haviam se revelado meros golfos sem saída. No entanto, a força e a direção da corrente, juntamente com a observação da salinidade da água, sugeriam que se tratava de uma passagem verdadeira, um canal conectando dois oceanos.

A navegação pelo estreito, com seus muitos canais e ilhas, era um labirinto de extrema dificuldade. A frota demorou cerca de 38 dias para atravessar os aproximadamente 600 quilômetros do estreito, enfrentando ventos fortes, correntes imprevisíveis e névoas densas que obscureciam a visão. Os marinheiros navegavam por entre montanhas escarpadas e fiordes profundos, com a tensão constante de colidir com rochas submersas ou ficar encalhados. A necessidade de cautela e observação constante dos pontos de referência tornou a passagem um desafio de navegação sem igual.

Durante a travessia do estreito, ocorreu um incidente devastador: a deserção da nau San Antonio. Comandada agora por Esteban Gómez, que havia sido o piloto-chefe de Magalhães e tinha forte aversão ao português, a San Antonio fugiu em meio a uma tempestade, retornando à Espanha. Essa foi uma perda calamitosa para a expedição, não apenas de um navio e parte da tripulação, mas também da maior parte das provisões mais essenciais, pois a San Antonio era a nau com a maior capacidade de carga. A deserção reduziu a frota a apenas três navios e comprometeu seriamente a capacidade de sobrevivência da restante.

Apesar da deserção e das condições adversas, Magalhães persistiu com os três navios restantes: a Trinidad, a Concepción e a Victoria. A descoberta do estreito era a validação de sua teoria e a concretização de seu objetivo primário, a recompensa por anos de planejamento e meses de sofrimento. A visão do vastíssimo e tranquilo oceano a oeste, após a saída do estreito em 28 de novembro de 1520, deve ter sido um momento de triunfo indescritível para Magalhães e sua tripulação, que batizaram o novo mar de Oceano Pacífico devido à sua aparente calma em contraste com o Atlântico tempestuoso.

A passagem pelo estreito, embora bem-sucedida, deixou a frota com recursos severamente reduzidos e uma tripulação ainda mais tensa. A alegria da descoberta foi temperada pela perda da San Antonio e a percepção de que a próxima etapa da viagem seria através de um oceano de extensão desconhecida, sem pontos de referência ou possibilidade de reabastecimento. A navegação pelas águas traiçoeiras do estreito havia consumido preciosas semanas e provisões, preparando o cenário para a terrível provação que seria a travessia do Pacífico.

A relevância histórica da descoberta do Estreito de Magalhães é imensa. Ele não apenas provou a viabilidade de uma rota ocidental para as Molucas, mas também confirmou a existência de um caminho marítimo ao redor do continente sul-americano. A passagem representou um marco na exploração geográfica e na navegação, abrindo uma nova dimensão para o comércio global e a expansão europeia. A tenacidade de Magalhães e a capacidade de sua tripulação de superar os desafios do estreito foram testemunhos de sua audácia e da força de sua convicção.

Qual foi a magnitude e as dificuldades da travessia do vasto Oceano Pacífico?

A travessia do Oceano Pacífico, que se seguiu à passagem pelo estreito, foi a fase mais árdua e desoladora de toda a circunavegação, uma prova de resistência humana que superou todas as expectativas de sofrimento. Por mais de três meses e vinte dias, de 28 de novembro de 1520 a 6 de março de 1521, as três naus restantes navegaram por uma extensão de mar desconhecida, sem avistar terra firme, enfrentando a cruel realidade da vastidão oceânica. Magalhães havia subestimado a dimensão do Pacífico, o que se revelou um erro catastrófico em termos de planejamento de suprimentos.

A escassez de água fresca tornou-se uma calamidade. Os barris vazios ou com água putrefata e infestada de vermes forçaram a tripulação a beber água salgada do mar ou água de chuva, que era cuidadosamente coletada durante as raras precipitações. A falta de hidratação adequada causava debilitamento e desespero. A fome era igualmente avassaladora; as provisões apodreceram ou se esgotaram. O biscoito, base da dieta, virou pó misturado com vermes e urina de rato, forçando os marinheiros a comer o material mais abominável.

A situação sanitária nos navios deteriorou-se rapidamente, levando a uma epidemia de escorbuto, a doença mais temida pelos navegadores da época. Causada pela deficiência de vitamina C, o escorbuto provocava gengivas inchadas e sangrentas, perda de dentes, dores articulares excruciantes, feridas que não cicatrizavam e, invariavelmente, a morte. Os corpos dos marinheiros morriam de forma lenta e agonizante, e a cada amanhecer, novos mortos eram jogados ao mar. O cheiro de doença e morte permeava as embarcações, afetando profundamente o moral dos sobreviventes.

A tripulação, debilitada pela fome, sede e doença, foi forçada a recorrer a medidas extremas para sobreviver. Couro velho que cobria os mastros, amaciado na água do mar e depois cozido, tornou-se alimento. Serragem e ratos, que infestavam os navios, eram considerados delicadezas preciosas. A privação extrema levou a atos desesperados, com a linha entre a sobrevivência e a barbárie se tornando tênue. A resiliência humana foi levada ao limite, e a visão dos companheiros morrendo dia após dia corroía a esperança restante.

Além da escassez de recursos, a monotonia do mar e a ausência de marcos terrestres eram um fardo psicológico esmagador. Dias e noites se sucediam sem qualquer mudança no horizonte, apenas o imenso e azul oceano. A desesperança e a loucura espreitavam, e a tripulação se perguntava se algum dia veriam terra novamente. A fé na liderança de Magalhães e no sucesso da missão foi severamente testada, com muitos acreditando que a expedição estava condenada à deriva eterna no vasto “Mar do Sul”.

Quando finalmente avistaram algumas ilhas desabitadas, as Ilhas Desventuradas, elas não ofereciam os recursos necessários para a recuperação. Foi apenas em 6 de março de 1521 que a frota alcançou as Ilhas dos Ladrões (Guam, nas Marianas), onde puderam finalmente obter água fresca e alguns alimentos. A alegria do reabastecimento foi temperada por um confronto com os nativos, que tentaram roubar um dos barcos da frota, levando a um incidente violento e à queima de algumas cabanas locais.

A travessia do Pacífico, apesar de seu custo humano terrível, foi um feito náutico sem precedentes. Ela revelou a verdadeira dimensão do maior oceano da Terra e a complexidade da geografia global. Embora tenha custado muitas vidas e provocado um sofrimento indescritível, a sobrevivência dos poucos que a completaram demonstrou a extraordinária tenacidade e o espírito de aventura dos exploradores daquela era, abrindo caminho para o maior entendimento do planeta e a futura globalização.

Como se deram os primeiros contatos com as populações nativas nas ilhas do Pacífico?

Os primeiros contatos com as populações nativas nas ilhas do Pacífico, após a longa e devastadora travessia do oceano, foram uma mistura de alívio, curiosidade e, por vezes, conflito. O primeiro grande avistamento de terra habitada ocorreu em 6 de março de 1521, quando a frota chegou às Ilhas Marianas, que Magalhães batizou de Ilhas dos Ladrões devido ao comportamento dos nativos, que tentaram embarcar nos navios e roubar objetos. Essa interação inicial foi marcada por uma falta de compreensão mútua e uma resposta violenta por parte dos europeus.

Ao chegar em Guam, os nativos, aparentemente deslumbrados e curiosos com os navios e os estrangeiros, tentaram abordar as naus em suas canoas, levando consigo o que podiam. A expedição estava desesperada por suprimentos frescos, mas a confusão e o roubo de um barco pequeno (um batel) levaram Magalhães a ordenar uma ação punitiva imediata. Os espanhóis, com sua superioridade militar, atacaram as aldeias costeiras, matando alguns nativos e queimando cabanas para reaver o barco e demonstrar sua força. Essa foi uma introdução tensa e sangrenta aos povos do Pacífico.

Após as Marianas, a frota de Magalhães continuou para oeste e, em 16 de março de 1521, avistou as ilhas de Samar e Homonhon, no arquipélago que mais tarde seria batizado de Filipinas. Este foi um encontro muito mais pacífico e promissor. Os europeus, exaustos e doentes, foram recebidos com relativa hospitalidade pelos nativos locais. Magalhães e sua tripulação conseguiram obter alimentos frescos essenciais, como frutas, peixe e água, que foram vitais para a recuperação da saúde dos sobreviventes do Pacífico. O intercâmbio de bens ocorreu de forma muito mais amigável.

O cronista Antonio Pigafetta registrou em detalhes esses encontros, descrevendo os costumes, a aparência e as tecnologias dos povos nativos, fornecendo valiosas informações etnográficas para a Europa. Ele observou suas canoas velozes, suas vestimentas simples e seus adornos, além de seus métodos de pesca e agricultura. A curiosidade mútua permitiu um intercâmbio inicial de bens e informações, com os espanhóis oferecendo contas de vidro, espelhos e outros objetos europeus em troca de alimentos e recursos locais.

Magalhães, com seu escravo e intérprete malaio, Enrique de Malaca, conseguia comunicar-se com alguns dos chefes locais, pois a língua malaia era amplamente utilizada para o comércio em toda a região do sudeste asiático. Essa capacidade de comunicação foi fundamental para estabelecer relações e negociar, permitindo que a expedição obtivesse o que precisava sem a necessidade de recorrer à força. A presença de Enrique foi um trunfo inestimável, pois ele atuava como uma ponte cultural e linguística entre os mundos, facilitando o entendimento em grande parte desconhecido.

A expedição chegou a Limasawa, onde Magalhães conduziu a primeira missa católica nas Filipinas em 31 de março de 1521, um evento simbólico da chegada do cristianismo na região. Ele também estabeleceu uma aliança com o rei de Limasawa, Raja Kulambu, um passo significativo para consolidar a presença espanhola. Esses primeiros contatos nas Filipinas foram caracterizados por uma abordagem mais diplomática de Magalhães, que buscava alianças e o estabelecimento de uma base de apoio, em vez de apenas saquear recursos, um reflexo de sua experiência prévia no Oriente.

Esses encontros iniciais nas ilhas do Pacífico, apesar de variarem de pacíficos a violentos, foram o início da interação entre o mundo europeu e os povos insulares, abrindo caminho para futuras missões coloniais e o intercâmbio cultural. A capacidade dos nativos de se defenderem ou de se aliarem aos europeus definiria seus destinos nas décadas seguintes. Os registros da expedição forneceram à Europa as primeiras descrições detalhadas dessas culturas distantes, expandindo o horizonte do conhecimento global de maneira sem precedentes.

Onde e como Fernão de Magalhães encontrou seu fim fatídico nas Filipinas?

Fernão de Magalhães encontrou seu fim fatídico em 27 de abril de 1521, na ilha de Mactan, no arquipélago das Filipinas, durante um confronto militar com os guerreiros locais. Após sua chegada às Filipinas e o estabelecimento de alianças com alguns chefes locais, como o de Limasawa e o de Cebu, Raja Humabon, Magalhães demonstrou um zelo excessivo em converter os nativos ao cristianismo e impor a autoridade espanhola. Essa ambição religiosa e política o levou a intervir em disputas locais, com consequências desastrosas.

Raja Humabon de Cebu havia se convertido ao cristianismo e reconhecido a soberania do rei da Espanha, esperando, em troca, o apoio militar de Magalhães contra seus rivais. Um desses rivais era Lapu-Lapu, o chefe de Mactan, uma ilha vizinha que se recusava a se submeter a Humabon e a se converter. Magalhães, confiante em sua superioridade militar europeia e buscando consolidar a aliança com Cebu, decidiu liderar pessoalmente uma expedição punitiva contra Lapu-Lapu, uma decisão que se provaria terrivelmente equivocada.

Na madrugada de 27 de abril, Magalhães, acompanhado por um pequeno contingente de cerca de 49 homens armados com arcabuzes e bestas, partiu para Mactan. Ele subestimou gravemente o número e a determinação dos guerreiros de Lapu-Lapu, que eram mais de 1500, equipados com escudos de madeira e lanças endurecidas ao fogo. Além disso, a maré baixa impediu que os navios se aproximassem o suficiente da praia para fornecer apoio de artilharia efetivo, deixando os espanhóis expostos e vulneráveis.

O confronto que se seguiu foi violento e assimétrico. Os guerreiros de Mactan, liderados por Lapu-Lapu, atacaram com ferocidade impressionante, usando sua superioridade numérica e conhecimento do terreno. Eles concentraram seus ataques nas pernas dos espanhóis, que estavam protegidas apenas por armaduras incompletas ou inexistentes. Magalhães, que se destacava na linha de frente, estava diretamente envolvido na batalha, tentando cobrir a retirada de seus homens enquanto a situação se deteriorava rapidamente.

Magalhães, já ferido na perna por uma lança de bambu, continuou lutando bravamente, mas foi dominado pelos guerreiros. Ele foi atingido repetidamente por lanças e golpes de facões de bambu. O cronista Antonio Pigafetta, que testemunhou a cena, descreveu a bravura final de Magalhães, que, mesmo ferido, tentou proteger seus homens enquanto eles recuavam. O capitão-mor da expedição foi ferido fatalmente na cabeça e em outras partes do corpo, e seu corpo nunca foi recuperado, tornando-se um símbolo de sacrifício.

A morte de Magalhães foi um golpe devastador para a expedição. Ele era a força motriz e o líder indiscutível da viagem, sua visão e determinação haviam levado a frota tão longe. Sua perda mergulhou a tripulação restante em desespero e incerteza, precipitando uma crise de liderança e a necessidade de reestruturar a expedição. A arrogância e o excesso de confiança na superioridade militar europeia, combinados com uma falha em compreender as dinâmicas locais, levaram ao fim prematuro do homem que concebeu a circunavegação.

Apesar de sua morte trágica, o legado de Magalhães é inegável. Ele foi o visionário que concebeu a rota e o navegador que a liderou até as Filipinas, abrindo o caminho para a primeira circunavegação. Sua morte em Mactan, embora um revés imediato para a expedição, não impediu o sucesso final da viagem. O local de sua morte é hoje um monumento histórico nas Filipinas, reverenciado tanto por sua bravura quanto pela resistência de Lapu-Lapu, que se tornou um herói nacional por defender sua ilha contra o invasor estrangeiro.

Qual foi o papel crucial de Juan Sebastián Elcano na continuação e sucesso da viagem?

A morte de Fernão de Magalhães nas Filipinas mergulhou a expedição em um período de crise profunda e incerteza, e foi nesse cenário que Juan Sebastián Elcano emergiu como a figura central para a continuação e o sucesso da viagem. Elcano, um navegador basco que havia sido um dos capitães amotinados na Baía de San Julián e perdoado por Magalhães, assumiu a liderança da nau Victoria e, mais tarde, o comando geral da expedição restante. Sua experiência marítima e sua resiliência seriam essenciais para o triunfo final.

Após a morte de Magalhães, a expedição estava em uma situação precária. Com a perda do líder visionário e a redução do número de homens, foi necessário abandonar um dos navios, a Concepción, que foi incendiada devido à falta de tripulantes suficientes para operá-la. A frota agora se resumia a apenas duas naus, a Trinidad e a Victoria, carregando os últimos sobreviventes, que mal chegavam a 115 homens. A fragilidade da situação exigia uma liderança firme e pragmática, qualidades que Elcano demonstrou possuir em abundância.

Elcano, ao lado de outros oficiais remanescentes como João Serrão (que também morreria logo depois), e mais tarde em comando pleno, tomou a decisão estratégica de se concentrar em alcançar as Molucas, as Ilhas das Especiarias, o objetivo econômico original da expedição. Ele manteve a disciplina na frota reduzida e navegou com habilidade através do arquipélago indonésio, apesar dos perigos dos baixios, recifes e da presença de frotas portuguesas que patrulhavam a região. Sua navegação precisa foi crucial para evitar novos naufrágios em águas traiçoeiras.

Ao chegar às Molucas, a frota conseguiu carregar uma valiosa carga de especiarias, principalmente cravo, que era o objetivo financeiro da Coroa Espanhola. Essa carga, embora reduzida pela capacidade de apenas dois navios, representava um enorme valor econômico e a justificativa para todo o investimento e sofrimento da expedição. A obtenção das especiarias nas Molucas, o coração do comércio asiático, foi um sucesso retumbante, ainda que Magalhães não estivesse vivo para testemunhá-lo.

A decisão mais crucial de Elcano foi a rota de retorno. Enquanto a Trinidad, comandada por Gonzalo Gómez de Espinosa, tentou voltar pelo Pacífico, uma rota que se provaria inviável devido aos ventos desfavoráveis e à captura pelos portugueses, Elcano, a bordo da Victoria, optou pela rota portuguesa ao redor do Cabo da Boa Esperança. Essa decisão, embora arriscada e tecnicamente uma violação do Tratado de Tordesilhas e uma intrusão em águas portuguesas, era a única chance realista de completar a circunavegação e retornar à Espanha.

A viagem de retorno pelo Oceano Índico e ao redor da África foi uma provacão contínua. A Victoria enfrentou tempestades, escassez de suprimentos e o risco constante de ser interceptada pelos portugueses. Elcano demonstrou extraordinária tenacidade e habilidade de navegação, mantendo o moral da tripulação (que continuava a morrer de fome e escorbuto) e evitando os portos portugueses, onde seriam capturados. A sua capacidade de liderança e sua experiência em navegação foram determinantes para a sobrevivência do que restava da expedição.

A chegada da Victoria a Sanlúcar de Barrameda em 6 de setembro de 1522, com apenas 18 homens e uma carga preciosa de cravo, marcou o ponto culminante da jornada. Juan Sebastián Elcano tornou-se o primeiro homem a completar a circunavegação da Terra, um feito que ele celebrou com as palavras: “Fui o primeiro a circum-navegar o mundo”. Sua determinação implacável, sua habilidade náutica e sua coragem em tomar decisões difíceis foram, sem dúvida, os fatores que transformaram a desastrosa morte de Magalhães em um triunfo histórico, garantindo o sucesso da mais audaciosa viagem de todos os tempos.

Como a expedição navegou pelas Ilhas das Especiarias e garantiu sua carga valiosa?

Após a morte de Magalhães nas Filipinas e a drástica redução da frota para apenas dois navios, a Trinidad e a Victoria, a expedição tinha um objetivo premente: alcançar as Ilhas das Especiarias, as Molucas, e garantir a carga valiosa que justificaria todo o sofrimento. A navegação através do vasto e complexo arquipélago indonésio, com seus milhares de ilhas e canais traiçoeiros, era um desafio em si, exigindo habilidade e conhecimento local. Os sobreviventes, exaustos e debilitados, tinham a tarefa de concretizar o principal objetivo comercial da viagem.

Sob a nova liderança, que passou por várias mãos antes de se consolidar com Juan Sebastián Elcano na Victoria e Gonzalo Gómez de Espinosa na Trinidad, a frota navegou para sul, em direção ao coração das Molucas. A rota era conhecida, embora com perigos para quem não a dominasse, e a presença de nativos hostis ou de postos de vigilância portugueses era uma preocupação constante. A tripulação, já muito reduzida, não podia se dar ao luxo de perder mais homens ou navios, tornando a cautela e a discrição essenciais.

Em novembro de 1521, as duas naus restantes finalmente chegaram à ilha de Tidore, uma das principais das Molucas e um centro de produção de cravo. A chegada foi um momento de grande alívio e celebração para a tripulação, que havia superado inúmeros desafios para alcançar seu destino final. O rei de Tidore, Almanzor (ou Mansur), recebeu os espanhóis com considerável hospitalidade, vendo neles uma oportunidade de se aliar contra seus rivais e contra a crescente influência portuguesa na região, que se concentrava principalmente na ilha vizinha de Ternate.

As negociações para a aquisição do cravo foram bem-sucedidas e relativamente rápidas. Os espanhóis trocaram uma variedade de bens europeus, como tecidos, vidros, espelhos e sinos, pela valiosa especiaria. O cravo, com seu aroma e sabor distintos, era o produto mais cobiçado, e os navios foram carregados com uma quantidade considerável, suficiente para tornar a viagem financeiramente lucrativa, apesar de todas as perdas. A eficiência na aquisição da carga demonstrava a habilidade dos novos líderes em capitalizar a oportunidade.

A permanência nas Molucas também foi um período de recuperação e manutenção para os navios. A Trinidad, que apresentava vazamentos sérios, precisou de reparos extensivos. Essa parada estratégica permitiu que a tripulação se recuperasse da travessia do Pacífico e da vida dura no mar, além de realizar os ajustes necessários nas embarcações. Os reparos na Trinidad demoraram, o que acabou por determinar a separação dos dois navios para a viagem de retorno.

Após os reparos na Trinidad, a decisão foi tomada de que um navio tentaria a rota de retorno pelo Pacífico, enquanto o outro, a Victoria, tentaria a rota portuguesa ao redor da África. A Trinidad, com Gonzalo Gómez de Espinosa no comando, tentou retornar pelo Pacífico, mas foi forçada a virar devido a ventos desfavoráveis e, posteriormente, capturada pelos portugueses. A Victoria, sob a liderança astuta de Juan Sebastián Elcano, foi quem assumiu a ousada e arriscada tarefa de completar a circunavegação pela rota ocidental, levando consigo o cargueiro de especiarias.

A garantia da carga valiosa de cravo nas Molucas foi o sucesso comercial da expedição, o objetivo pelo qual a Coroa Espanhola havia investido tanto. Embora o número de sobreviventes fosse ínfimo e apenas um navio retornasse, a quantidade de especiarias transportadas na Victoria era suficiente para cobrir os custos da expedição e gerar um lucro substancial. A conquista das Molucas, mesmo que temporária e disputada, foi um marco comercial que reafirmava o potencial da rota ocidental e o poderio da Espanha.

Quais foram os últimos e desesperados meses da viagem de retorno à Europa?

Os últimos e desesperados meses da viagem de retorno à Europa, a bordo da nau Victoria sob o comando de Juan Sebastián Elcano, foram uma saga de privações e resiliência que beirava o milagre. Após deixar as Molucas, Elcano tomou a decisão audaciosa de retornar pela rota portuguesa, contornando o Cabo da Boa Esperança, pois a rota pelo Pacífico já havia se mostrado inviável para a Trinidad. Essa escolha implicava navegar por águas controladas por Portugal, com o risco constante de captura e de uma guerra diplomática.

A travessia do Oceano Índico foi longa e exaustiva. A tripulação, já dizimada e debilitada, continuava a sofrer com a fome, o escorbuto e outras doenças. As provisões de bordo estavam perigosamente baixas, e a água fresca era uma commodity escassa e muitas vezes contaminada. Elcano, ciente do perigo de ser interceptado pelos portugueses, evitou a todo custo fazer escalas em portos africanos, onde poderia ser reconhecido e preso. A disciplina era rigorosa, e qualquer desvio da rota ou insubordinação era tratado com severidade para manter a ordem a bordo.

A passagem pelo Cabo da Boa Esperança, em maio de 1522, foi um momento crítico. Conhecido por suas tempestades e ventos ferozes, o Cabo exigia habilidade e sorte para ser contornado. A Victoria, com sua estrutura já fragilizada pela longa viagem, enfrentou os elementos com bravura, conseguindo superar o ponto mais ao sul da África. A passagem bem-sucedida foi um alívio imenso, mas a jornada ainda estava longe de terminar, com o vasto Atlântico a ser cruzado mais uma vez.

À medida que a Victoria subia o Atlântico rumo à Europa, a situação a bordo se deteriorava ainda mais. Mais homens sucumbiram ao escorbuto e à fome. O número de tripulantes diminuía a cada dia, e os poucos sobreviventes estavam à beira da exaustão física e mental. Os corpos eram jogados ao mar, uma cena diária e desoladora que reforçava a fragilidade da vida em alto-mar. O navio, embora carregado de especiarias, era um túmulo flutuante para muitos de seus tripulantes originais.

Desesperado por suprimentos, Elcano tomou a decisão arriscada de parar em Cabo Verde, um arquipélago português, em julho de 1522. Ele tentou enganar as autoridades portuguesas, alegando que sua nau havia se separado de uma frota espanhola que vinha das Américas e que precisavam de provisões. No entanto, sua verdadeira história foi descoberta quando os portugueses notaram que a data no diário de bordo da Victoria não batia com a data local (eles haviam perdido um dia cruzando a Linha Internacional de Data, um fenômeno ainda não compreendido). Treze membros da tripulação foram capturados e presos, mas Elcano conseguiu escapar com os demais, por um triz.

A fuga de Cabo Verde deixou Elcano com apenas 18 homens a bordo, quase todos doentes e famintos. A Victoria, a única nau remanescente da grandiosa armada de cinco navios, estava em condições precárias, mal conseguindo se manter à tona. Os últimos dias da viagem foram uma luta contra o tempo e contra a própria exaustão, com os homens revezando-se na bombagem de água para evitar o naufrágio. A visão da costa espanhola, após quase três anos de sofrimento e privações, deve ter sido um momento de emoção indescritível para os sobreviventes.

Em 6 de setembro de 1522, a Victoria finalmente chegou a Sanlúcar de Barrameda, na Espanha, com seus 18 marinheiros esqueléticos e a valiosa carga de especiarias. A viagem de retorno foi um testemunho da coragem e da perícia de Elcano e da inacreditável resistência humana. Os últimos meses da viagem, com suas provas extremas e o alto custo de vidas, foram a culminação de uma odisséia que transformou a compreensão do mundo e marcou para sempre a história da exploração marítima.

Quais foram as principais confirmações geográficas e cartográficas da circunavegação?

A circunavegação da Terra pela expedição Magalhães-Elcano representou um marco geográfico e cartográfico sem precedentes, confirmando e redefinindo a compreensão europeia do mundo. A mais fundamental e irrefutável confirmação foi a da esfericidade da Terra. Embora essa teoria já fosse aceita por muitos intelectuais e navegadores, a viagem forneceu a prova empírica definitiva, demonstrando que era possível navegar continuamente para oeste e retornar ao ponto de partida, circundando o globo.

A descoberta e a navegação pelo Estreito de Magalhães foi uma conquista cartográfica crucial. Antes da expedição, a existência de uma passagem marítima ao sul do continente americano era apenas uma especulação em mapas hipotéticos. Magalhães provou que essa passagem existia e que ela conectava o Atlântico ao vastíssimo oceano a oeste. A exatidão da sua localização e os detalhes da sua travessia foram registrados meticulosamente, fornecendo dados vitais para os futuros cartógrafos e navegadores que se aventurariam por essa rota estratégica.

A travessia do Oceano Pacífico, por sua vez, revelou sua imensa e surpreendente extensão. Os navegadores europeus não tinham ideia do tamanho colossal desse oceano, que Magalhães inicialmente subestimou em seus cálculos. A longa jornada de mais de cem dias sem avistar terra firme demonstrou que o Pacífico era muito maior do que se imaginava, ocupando cerca de um terço da superfície terrestre. Essa descoberta alterou dramaticamente as percepções de distância e escala no mapa-múndi, mostrando a necessidade de revisar as dimensões dos continentes e oceanos previamente estimados.

A expedição também contribuiu para a correção de latitudes e longitudes de diversas ilhas e massas de terra. Embora a determinação precisa da longitude ainda fosse um desafio tecnológico, a viagem permitiu que os cartógrafos começassem a refinar os mapas do mundo, localizando com maior precisão as Filipinas, as Molucas e outras ilhas do Pacífico. As observações astronômicas realizadas a bordo, embora rudimentares para os padrões atuais, ajudaram a calibrar as posições geográficas, tornando as futuras viagens mais seguras e previsíveis.

Outra confirmação geográfica notável foi a inexistência de um grande continente no sul entre a Patagônia e a Ásia, como algumas teorias da época sugeriam. A navegação contínua pelo Pacífico e ao redor do Cabo da Boa Esperança demonstrou que a massa de terra do hemisfério sul era muito menor do que se acreditava, abrindo a possibilidade de que outras terras austrais pudessem existir, mas não bloqueando a passagem marítima global. Essa constatação refinou o desenho dos contornos continentais e oceânicos.

A viagem também trouxe à tona a curiosa questão do fuso horário. Ao retornar à Espanha, os marinheiros da Victoria descobriram que haviam “perdido” um dia em relação ao calendário europeu, um fenômeno que hoje compreendemos como a Linha Internacional de Data. Essa observação prática, registrada por Pigafetta, foi a primeira evidência empírica de que viajar ao redor do mundo de leste para oeste significaria ganhar um dia, ou de oeste para leste significaria perder um dia, contribuindo para o avanço da cronometria e do entendimento do tempo global.

As informações coletadas pela expedição, registradas por cronistas como Antonio Pigafetta, foram valiosas para a cartografia da época. Novos mapas foram desenhados incorporando as rotas e os pontos de terra descobertos ou confirmados. A compreensão do mundo deixou de ser uma abstração teórica para se tornar uma realidade geográfica documentada, com os oceanos se interconectando e os continentes assumindo seus contornos verdadeiros. A circunavegação não apenas confirmou a forma da Terra, mas também revelou sua vasta e complexa geografia.

Como a viagem impactou o conhecimento científico e a percepção do mundo no século XVI?

A primeira circunavegação da Terra teve um impacto revolucionário no conhecimento científico e na percepção do mundo no século XVI, muito além das simples confirmações geográficas. A viagem forneceu dados empíricos sem precedentes que desafiaram e expandiram as teorias existentes sobre a cosmografia e a geografia. A validação prática da esfericidade da Terra foi, talvez, a mais óbvia e fundamental das contribuições, solidificando um conceito que antes era mais teórico para muitos.

O conhecimento cartográfico foi profundamente transformado. Os mapas anteriores ao retorno da Victoria eram baseados em conjecturas para muitas regiões, especialmente o Oceano Pacífico. A expedição preencheu grandes lacunas, revelando a verdadeira vastidão do Pacífico e a intrincada geografia de ilhas e arquipélagos, como as Filipinas e as Molucas. Isso levou à criação de mapas muito mais precisos e detalhados, que se tornaram ferramentas indispensáveis para futuras explorações e para o planejamento de rotas comerciais, redefinindo as dimensões conhecidas do planeta.

A viagem também trouxe à tona novas informações sobre meteorologia e oceanografia. As observações sobre os padrões de vento e corrente, especialmente nos vastos oceanos Atlântico e Pacífico, ajudaram a refinar o conhecimento sobre as correntes oceânicas e os ventos alísios. A experiência de navegação por diferentes zonas climáticas e a ocorrência de tempestades e calmaria contribuíram para um entendimento mais apurado dos fenômenos naturais que governavam as viagens marítimas. Essa experiência prática foi um complemento valioso aos conhecimentos teóricos da época.

Do ponto de vista da história natural, a expedição coletou informações sobre novas espécies de plantas e animais. Embora não fosse uma missão primariamente científica, os relatos dos sobreviventes, especialmente os de Antonio Pigafetta, descreveram a flora e a fauna que encontraram nas terras desconhecidas, como as ilhas do Pacífico e a Patagônia. Essas descrições, embora não sistemáticas, ofereceram um vislumbre da biodiversidade global, expandindo o horizonte dos naturalistas europeus e estimulando futuras expedições com propósitos mais científicos.

O contato com diversas culturas e povos indígenas também teve um impacto significativo na percepção europeia. As descrições detalhadas dos modos de vida, costumes, línguas e crenças dos nativos das Américas e das ilhas do Pacífico e Sudeste Asiático, registradas por Pigafetta, forneceram um material etnográfico valioso. Isso expôs os europeus à diversidade da humanidade e desafiou, em alguma medida, as visões eurocêntricas do mundo, apesar de muitas vezes serem interpretadas através de lentes preconceituosas da época.

A observação do fenômeno da perda de um dia ao circunavegar o globo, o que hoje entendemos como a Linha Internacional de Data, foi uma contribuição inesperada para a ciência da cronometria e da geografia matemática. Esse enigma, que causou confusão inicial, levou a reflexões mais profundas sobre a relação entre tempo e espaço e a necessidade de padronização global. A viagem, assim, abriu caminho para a futura organização dos fusos horários e a coordenação internacional do tempo.

Em um nível mais filosófico, a circunavegação expandiu a imaginação humana. Ela demonstrou a capacidade de superar limites, a tenacidade do espírito explorador e a capacidade da tecnologia e da inteligência humanas de conquistar os maiores desafios geográficos. A percepção do mundo mudou de um conjunto de continentes separados por oceanos vastos e inexplorados para um planeta interconectado e navegável, preparando o cenário para a globalização e o intercâmbio cultural e comercial em uma escala sem precedentes.

Que repercussões econômicas e políticas a circunavegação teve para a Espanha e Portugal?

A circunavegação da Terra pela expedição Magalhães-Elcano teve repercussões econômicas e políticas complexas e de longo alcance para a Espanha e Portugal, redefinindo as dinâmicas de poder e as estratégias comerciais. Para a Espanha, o retorno da Victoria carregada de cravo das Molucas foi um sucesso financeiro imediato. A carga de especiarias vendida em Sevilha rendeu uma soma que, apesar das perdas materiais e humanas da expedição, foi suficiente para cobrir os custos do empreendimento e gerar um lucro considerável, validando a aposta da Coroa em uma rota ocidental para o Oriente.

Politicamente, a circunavegação fortaleceu a posição da Espanha na corrida global por impérios. A viagem provou que era possível alcançar as Molucas navegando pelo oeste, o que a Espanha interpretou como uma validação de sua reivindicação às Ilhas das Especiarias de acordo com o Tratado de Tordesilhas. Esse feito deu à Espanha uma nova base para negociações com Portugal e um argumento para estender suas pretensões territoriais ao Pacífico e ao Sudeste Asiático. O prestígio da Coroa espanhola, sob Carlos I, cresceu exponencialmente com a conclusão bem-sucedida de tal feito.

Para Portugal, a notícia da circunavegação espanhola e, mais especificamente, da chegada da Victoria às Molucas, foi uma fonte de grande preocupação. Eles viam isso como uma invasão direta de sua esfera de influência no Oriente, que havia sido cuidadosamente construída e protegida. A reação portuguesa foi imediata e multifacetada: a captura da Trinidad e de sua tripulação, a intensificação da patrulha marítima em suas rotas e a pressão diplomática incessante sobre a Espanha para que abandonasse suas reivindicações às Molucas.

A disputa pelas Molucas se tornou um ponto central de tensão entre as duas potências ibéricas. Várias conferências e negociações diplomáticas foram realizadas para resolver a questão da linha de demarcação no hemisfério oriental, com base no Tratado de Tordesilhas. A falta de conhecimento preciso da longitude e a ambiguidade dos termos originais tornaram a resolução difícil e prolongada, com cada lado apresentando seus próprios mapas e cálculos para apoiar suas reivindicações.

A solução final veio com o Tratado de Saragoça em 1529. A Espanha, precisando de dinheiro para suas guerras na Europa e cansada da disputa nas Molucas, decidiu vender seus direitos sobre as Molucas a Portugal por uma soma considerável de 350.000 ducados de ouro. Esse acordo efetivamente cedeu as ricas Ilhas das Especiarias a Portugal, em troca de um benefício financeiro imediato para a Espanha, que então voltou sua atenção para a expansão e exploração de suas possessões nas Américas, mais próximas e controláveis.

Essa transação, embora aparente uma derrota para a Espanha em sua ambição oriental, permitiu-lhe consolidar seu vasto império no Novo Mundo sem a necessidade de manter uma linha de suprimentos extremamente longa e vulnerável para as Molucas, que estariam em constante disputa com Portugal. A Espanha, ao vender as Molucas, efetivamente reorientou sua estratégia colonial, focando na prata do México e do Peru e no controle das rotas comerciais americanas, que se tornariam a espinha dorsal de sua economia.

Portanto, enquanto a circunavegação confirmou a rota ocidental, as realidades econômicas e geopolíticas subsequentes levaram a Espanha a priorizar as Américas. Portugal manteve seu monopólio das especiarias orientais por um tempo, mas a viagem de Magalhães-Elcano abriu os olhos do mundo para a real extensão do Oceano Pacífico e a possibilidade de outras rotas, que seriam exploradas por outras potências europeias em séculos futuros, impactando o equilíbrio de poder global de forma irreversível.

Qual o legado duradouro da expedição Magalhães-Elcano para a história global?

O legado da expedição Magalhães-Elcano é profundo e multifacetado, estendendo-se por diversas áreas da história global, desde a ciência e a geografia até a política e a economia. A mais evidente e marcante contribuição foi a concretização da primeira circunavegação da Terra, um feito que confirmou inequivocamente a esfericidade do planeta e demonstrou a capacidade de interligar todos os oceanos. Essa jornada épica mudou para sempre a percepção humana sobre as dimensões e a interconexão do mundo.

Do ponto de vista geográfico, a expedição desvendou a real vastidão do Oceano Pacífico, que era praticamente desconhecido pelos europeus. Antes da viagem, as especulações sobre as distâncias e a existência de terras nesse imenso “Mar do Sul” eram imprecisas. Os dados coletados, especialmente por Antonio Pigafetta, proporcionaram um conhecimento cartográfico inédito sobre as Filipinas, as Molucas e diversas outras ilhas e arquipélagos, preenchendo vastas lacunas nos mapas da época e revolucionando a cartografia global.

A viagem também teve um impacto significativo na ciência da navegação. A experiência adquirida em longas travessias oceânicas, lidando com ventos, correntes, doenças e a necessidade de precisão na determinação da posição, contribuiu para o desenvolvimento de técnicas e instrumentos mais refinados. Embora rudimentares para os padrões modernos, as observações feitas durante a viagem, como a perda de um dia ao circundar o globo, foram fundamentais para a compreensão dos fusos horários e da cronometria, avançando o conhecimento astronômico e matemático.

Economicamente, a viagem pavimentou o caminho para a primeira rota comercial global, conectando a Europa, as Américas e a Ásia por mar. Embora a Espanha tenha eventualmente cedido as Molucas a Portugal, a rota estabelecida pela expedição Magalhães-Elcano foi crucial para o desenvolvimento do Comércio de Manila (Galeões de Manila), que transportava prata americana para a Ásia em troca de seda, porcelana e especiarias. Essa rota transpacífica-transatlântica foi a espinha dorsal da primeira economia verdadeiramente global, integrando mercados distantes.

Politicamente, a circunavegação intensificou a rivalidade entre Espanha e Portugal, levando a novas negociações e ao Tratado de Saragoça, que tentou resolver a questão das Molucas. Esse precedente de delimitação global via acordos internacionais seria um modelo para futuras disputas coloniais. A viagem também consolidou o status da Espanha como uma das principais potências marítimas e coloniais do mundo, um império onde “o sol nunca se punha”, com vastas possessões no Novo Mundo e uma presença estratégica no Pacífico.

A expedição também é um testemunho da resiliência humana e da capacidade de superar adversidades extremas. A história de Magalhães e dos poucos sobreviventes, como Juan Sebastián Elcano, é uma narrativa de coragem, determinação e sacrifício. O custo humano da viagem foi imenso, mas a capacidade de persistir e completar a missão inspirou gerações de exploradores e aventurologistas, solidificando o espírito de descoberta.

Finalmente, a circunavegação marcou o início de uma era de globalização, conectando culturas e povos de maneiras sem precedentes. Os relatos dos encontros com populações nativas, embora muitas vezes mediados por uma perspectiva europeia, expandiram o horizonte cultural da Europa e contribuíram para uma visão mais complexa e interconectada do planeta. O legado da viagem Magalhães-Elcano reside em sua capacidade de revolucionar o conhecimento, a economia e a geopolítica, moldando o mundo em que vivemos hoje.

Quais foram as lições aprendidas sobre navegação, sobrevivência e limites humanos?

A expedição Magalhães-Elcano, embora um triunfo sem precedentes, foi também uma escola brutal de sobrevivência e um laboratório de aprendizado sobre os limites da navegação e da resistência humana. Uma das lições mais importantes sobre navegação foi a necessidade de precisão cartográfica e a subestimação das distâncias oceânicas. Magalhães havia imaginado o Pacífico como um mar mais estreito, o que levou a um planejamento inadequado de suprimentos e à consequente tragédia humana. A viagem demonstrou a urgência de mapas mais exatos e de métodos aprimorados para determinar a longitude.

A gestão de suprimentos emergiu como um ponto crítico. A escassez de água fresca e alimentos não perecíveis, a infestação de pragas e o apodrecimento das provisões destacaram a fragilidade da logística de longa distância. A lição foi clara: viagens tão extensas exigiam uma abordagem muito mais robusta para o armazenamento de alimentos e água, e a busca por fontes de vitamina C (como frutas cítricas) tornou-se uma prioridade para combater o escorbuto, a doença que mais dizimou a tripulação. A experiência da Victoria enfatizou a vital importância da nutrição.

A organização e disciplina a bordo foram lições duramente aprendidas. Os motins e a deserção da San Antonio revelaram as tensões inerentes a uma liderança estrangeira e a uma tripulação heterogênea. A capacidade de Magalhães em sufocar as rebeliões, e a de Elcano em manter a ordem nos momentos finais, sublinharam a necessidade de uma autoridade incontestável e de uma cadeia de comando clara em expedições de alto risco. A coerência e a lealdade da tripulação eram tão importantes quanto a habilidade náutica.

Sobre a sobrevivência, a expedição revelou a extraordinária resiliência do espírito humano, mas também seus limites. A capacidade de alguns marinheiros de suportar meses de fome, sede, doença e isolamento no mar é um testemunho da força da vontade. No entanto, a alta taxa de mortalidade (apenas 18 dos 270 originais retornaram) ilustra as condições desumanas enfrentadas e o custo altíssimo da exploração. Os relatos detalhados de Antonio Pigafetta sobre a dieta de couro e ratos são um lembrete vívido da desesperada luta pela vida.

A importância do conhecimento local e da adaptabilidade foi outra lição fundamental. Magalhães, apesar de sua experiência, subestimou a resistência das populações nativas em Mactan, levando à sua morte. Os sucessos posteriores em estabelecer trocas e alianças em outras ilhas mostraram que a diplomacia e o respeito mútuo poderiam ser mais eficazes do que a força. A capacidade de se adaptar a diferentes culturas e ambientes, e de negociar com chefes locais, era tão crucial quanto a perícia marítima.

A expedição também destacou a necessidade de redundância e flexibilidade no planejamento. A perda de navios por naufrágio ou deserção, e a incapacidade da Trinidad de completar o retorno pelo Pacífico, enfatizaram a importância de ter planos de contingência e de equipar as frotas com recursos extras. A capacidade de Elcano de mudar a rota de retorno (para a portuguesa) quando a original se mostrou inviável foi um exemplo primordial de adaptabilidade e de tomada de decisão estratégica sob pressão extrema.

Em última análise, a viagem de Magalhães-Elcano foi uma épica lição sobre a própria natureza da exploração. Ela demonstrou que, para além da coragem e da ambição, o sucesso exigia uma combinação de conhecimento científico, inovação tecnológica, resiliência psicológica e uma dose considerável de sorte. As lições aprendidas nesta primeira circunavegação se tornaram a base para todas as futuras expedições oceânicas, moldando a forma como a humanidade continuaria a desvendar os mistérios do planeta e a expandir seus horizontes.

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