Caso Braskem: o que foi, detalhes e consequências

O que desencadeou o Caso Braskem em Maceió?

A raiz do extenso e complexo Caso Braskem em Maceió reside em décadas de exploração de sal-gema, um mineral essencial para a indústria química. Esta atividade, conduzida pela Braskem e suas antecessoras por quase meio século, envolvia a dissolução do sal em camadas profundas do subsolo e a subsequente extração da salmoura resultante. O método, conhecido como mineração por dissolução, é amplamente utilizado globalmente, mas sua aplicação em um contexto geológico particular de Maceió revelou-se catastrófica.

A geologia de Maceió, caracterizada por uma camada superior de solo sedimentar instável sobre depósitos de sal-gema, tornou-se um fator crítico na equação do desastre. A mineração de sal-gema, ao longo do tempo, criou cavidades subterrâneas que, em um ambiente de rochas carbonáticas fraturadas e falhas geológicas, começaram a ceder. A pressão sobre essas cavidades aumentou, levando à sua progressiva deformação e ao colapso de algumas delas.

Os primeiros sinais de anomalia começaram a ser percebidos pela população em 2018, com tremores de terra atípicos. Esses abalos sísmicos, inicialmente confundidos com sismos naturais, eram, na verdade, manifestações superficiais da instabilidade subterrânea causada pelo colapso das cavernas. A frequência e a intensidade desses tremores alarmaram os moradores, que relataram rachaduras em suas casas e uma sensação crescente de insegurança.

A exploração do sal-gema pela Braskem era central para a economia local e nacional, fornecendo matéria-prima para diversos produtos industriais, como PVC e soda cáustica. A empresa operava sob licenças ambientais e de mineração, contudo, a fiscalização e a compreensão dos riscos geológicos em longo prazo mostraram-se insuficientes. A acumulação de décadas de extração sem o devido monitoramento das repercussões no subsolo levou à situação de emergência.

A cidade de Maceió, em particular os bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro e Bom Parto, foi a mais severamente atingida. A proximidade das minas com áreas densamente povoadas amplificou a magnitude do desastre, transformando um problema geológico em uma crise humanitária e urbana de proporções inéditas no Brasil. Milhares de residências, escolas e estabelecimentos comerciais foram comprometidos, forçando a evacuação em massa.

O desastre não foi um evento isolado, mas sim o ápice de um processo gradual de deterioração geológica que se acumulou ao longo de anos. A Braskem enfrentou acusações de não ter monitorado adequadamente as cavidades e de não ter notificado as autoridades sobre o risco iminente, mesmo diante de evidências crescentes de instabilidade. A falta de transparência e proatividade na gestão do risco minerário contribuiu decisivamente para a tragédia que se seguiu.

Como a mineração de sal-gema causou a instabilidade do solo?

A técnica de mineração por dissolução de sal-gema, empregada pela Braskem, envolve a injeção de água doce em profundidade para dissolver a camada de sal. A salmoura resultante é então bombeada para a superfície, deixando para trás grandes cavidades subterrâneas. O processo, apesar de comum na indústria, exige um controle rigoroso sobre a geometria e a estabilidade dessas cavernas, bem como a avaliação contínua do ambiente geológico circundante.

Em Maceió, a natureza específica do subsolo – que consiste em formações de sal e gipsita com rochas carbonáticas e sedimentos mais jovens sobrejacentes – exacerbou os riscos. As cavernas de sal-gema foram formadas a centenas de metros de profundidade, e o peso das camadas superiores do solo, somado à pressão da água e à atividade tectônica natural da região, exercia uma pressão considerável sobre essas estruturas vazias.

Com o tempo, a integridade estrutural das cavernas começou a ser comprometida. A dissolução contínua do sal e a reutilização das mesmas cavidades por décadas levaram a um enfraquecimento progressivo de suas paredes e tetos. Rachaduras e falhas pré-existentes na rocha circundante agiram como pontos de fragilidade, permitindo que a água percolasse e acelerasse o processo de dissolução em áreas não controladas.

Quando o teto ou as paredes de uma cavidade cedem, ocorre um colapso subterrâneo. Esse colapso provoca a propagação de ondas de choque através da massa rochosa, que são sentidas na superfície como tremores de terra. Esses eventos sísmicos, embora de baixa magnitude, eram um indicativo claro de que o subsolo estava passando por um processo de acomodação e que as estruturas geológicas estavam se reajustando.

A subsidência do solo – o afundamento gradual ou repentino da superfície – é uma consequência direta do colapso das cavidades. À medida que as estruturas subterrâneas desmoronam, o solo acima delas perde sustentação e afunda. Em Maceió, esse afundamento não foi uniforme, criando crateras, trincas extensas nas ruas e edifícios, e deslocamentos verticais e horizontais que tornaram as áreas inabitáveis.

O problema foi agravado pela falta de preenchimento das cavidades após a extração do sal. Embora a prática de preencher as cavernas com material inerte para estabilizar o subsolo seja conhecida e recomendada em alguns contextos, a Braskem não adotou essa medida em suas operações de Maceió, o que deixou as estruturas vazias e vulneráveis ao colapso. A ausência de monitoramento adequado da estabilidade dessas estruturas também foi um fator crítico.

Quais foram as primeiras evidências da subsidência do solo?

As primeiras e mais alarmantes evidências da subsidência do solo em Maceió vieram na forma de tremores de terra incomuns. A população dos bairros do Pinheiro, Mutange e Bebedouro começou a relatar, a partir de 2018, uma série de pequenos abalos sísmicos que diferiam dos tremores tectônicos típicos. Estes eventos eram caracterizados por um som de estouro ou estrondo e uma vibração seca que as pessoas sentiam diretamente sob seus pés.

Além dos tremores, as residências e estruturas comerciais começaram a apresentar rachaduras e fissuras generalizadas. Paredes, pisos e tetos exibiam marcas crescentes de estresse, indicando movimentos no terreno. Muitas dessas rachaduras eram profundas e contínuas, atravessando estruturas e comprometendo a segurança dos imóveis, transformando casas em verdadeiras armadilhas para seus moradores.

Outra evidência visual marcante foi o afundamento de calçadas e ruas. Asfalto e concreto começaram a ceder, formando buracos e desníveis significativos. Em algumas áreas, era possível observar o deslocamento de postes de energia e árvores, que inclinavam ou ficavam em posições anômalas, sinalizando a movimentação do terreno em profundidade. Essas observações eram frequentemente acompanhadas por relatos de dificuldades no funcionamento de portas e janelas, que empenavam.

O sistema de drenagem e esgoto da cidade também começou a ser afetado, com rupturas em tubulações subterrâneas. Vazamentos de água e esgoto emergiam no solo, contribuindo para a saturação do terreno e, paradoxalmente, acelerando alguns processos de movimentação. O mau cheiro e a presença de água em locais indevidos eram indicativos de que a infraestrutura subterrânea estava sendo severamente comprometida pela movimentação do solo.

À medida que a crise se aprofundava, a intensidade dos afundamentos aumentou, tornando-se visível a olho nu em algumas áreas. Grandes crateras e valas se abriram, e edifícios inteiros, antes estáveis, passaram a inclinar de forma perceptível. A topografia dos bairros começou a mudar, com ruas que antes eram planas agora apresentando declives acentuados e elevações irregulares.

O reconhecimento oficial da gravidade da situação veio quando o Serviço Geológico do Brasil (CPRM), em 2019, confirmou a relação entre os tremores, a subsidência e a mineração de sal-gema. O relatório do CPRM foi um divisor de águas, validando as preocupações da população e fornecendo a base científica para as ações de emergência e evacuação. A partir daí, a escala do desastre tornou-se inegável e a necessidade de intervenção urgente, premente.

Que áreas de Maceió foram mais afetadas pelos tremores e afundamentos?

Os tremores e afundamentos associados ao Caso Braskem concentraram-se em bairros específicos de Maceió, transformando-os em zonas de alto risco e, subsequentemente, em áreas desocupadas. Os bairros mais severamente impactados foram o Pinheiro, Mutange, Bebedouro e, em menor grau mas ainda significativamente, o Bom Parto. A proximidade desses bairros com as cavidades subterrâneas da mineração de sal-gema foi o principal determinante de sua vulnerabilidade.

O bairro do Pinheiro foi o primeiro a sentir os efeitos de forma mais ostensiva, com relatos de rachaduras e tremores desde 2018. Suas ruas e residências exibiam sinais visíveis de movimentação do solo, com desníveis e inclinações que comprometiam a estabilidade das construções. A área, que antes era vibrante, tornou-se o epicentro das preocupações e o símbolo inicial do desastre.

O Mutange, vizinho ao Pinheiro, também sofreu intensamente, com muitas de suas casas e infraestruturas apresentando danos estruturais irreparáveis. A extensão do afundamento do solo no Mutange foi particularmente grave, com a formação de grandes crateras e a submersão parcial de ruas. A paisagem do bairro mudou drasticamente, refletindo a violência dos movimentos subterrâneos.

O Bebedouro, outro bairro tradicional de Maceió, foi igualmente afetado, com a desocupação de milhares de imóveis. A comunidade do Bebedouro, assim como a do Pinheiro e Mutange, foi forçada a abandonar suas casas e negócios devido ao risco iminente de colapso. A mobilização para evacuar essas áreas foi complexa e exigiu um esforço logístico imenso das autoridades e da Braskem.

O bairro do Bom Parto também foi incluído na área de monitoramento e evacuação, embora com um impacto ligeiramente menor em comparação com os três primeiros. Contudo, muitas famílias foram igualmente afetadas, perdendo suas residências e sendo incluídas nos programas de compensação. A interconexão dos bairros e a extensão da área de risco sublinhavam a escala do problema.

Além dos quatro bairros principais, algumas áreas adjacentes ou próximas às zonas de evacuação também sentiram os efeitos, embora com menor intensidade. Estes locais foram submetidos a monitoramento constante para garantir a segurança da população remanescente. A delimitação exata das zonas de risco foi um desafio contínuo, adaptando-se à evolução dos dados geológicos e à progressão do afundamento.

A tragédia desses bairros se manifesta hoje em uma paisagem desoladora, com milhares de imóveis abandonados, ruas desertas e uma infraestrutura urbana em colapso. O que antes eram comunidades vibrantes e cheias de vida, tornaram-se áreas fantasmas, um lembrete sombrio das consequências da exploração mineral sem a devida precaução e fiscalização rigorosa.

Qual o papel da Braskem na exploração do sal-gema?

A Braskem, gigante petroquímica brasileira, teve um papel central e exclusivo na exploração do sal-gema em Maceió por várias décadas. A empresa herdou as operações de mineração de suas antecessoras, como a Salgema Indústrias Químicas S.A., e continuou a extração do mineral de forma contínua até 2019, quando as atividades foram suspensas devido à crise geológica. A produção de sal-gema era fundamental para a sua cadeia produtiva.

A mineração de sal-gema em Maceió era estratégica para a Braskem, pois fornecia a matéria-prima essencial para a produção de cloro-álcalis e PVC em seu complexo industrial na cidade. A empresa dependia diretamente da extração local para alimentar suas fábricas, o que a posicionava como a principal beneficiária econômica da atividade, mas também como a responsável primária pelos riscos e impactos ambientais e sociais.

A Braskem era a única operadora dos poços de sal-gema que foram identificados como a causa da instabilidade geológica. A empresa detinha as licenças e concessões minerárias para a exploração na região. Isso significa que toda a responsabilidade técnica e operacional pela segurança da mineração, incluindo o monitoramento das cavidades e do subsolo, recaía sobre a companhia.

Ao longo dos anos, a empresa esteve ciente dos desafios geológicos da região e da importância do monitoramento constante das cavidades. Relatórios técnicos internos e externos, inclusive de órgãos de fiscalização, já apontavam para a complexidade do terreno e a necessidade de cautela. A forma como a Braskem geriu essas informações e as medidas preventivas adotadas ou negligenciadas tornaram-se pontos cruciais na investigação do caso.

A suspensão das operações de mineração em 2019 foi uma decisão tardia, tomada apenas após a escalada da crise e a confirmação científica da ligação entre a atividade minerária e os afundamentos. A Braskem paralisou a extração e iniciou um processo de tamponamento dos poços para tentar estabilizar as cavidades e reduzir a progressão da subsidência, uma medida paliativa diante da extensão dos danos.

A empresa assumiu formalmente a responsabilidade pelos danos causados e firmou acordos para a compensação das famílias afetadas e a remediação ambiental. Contudo, a extensão de sua culpabilidade, as falhas na gestão de risco e a adequação das compensações são questões que continuam sendo debatidas e investigadas por órgãos de controle, justiça e pela própria sociedade. A Braskem permanece no centro do epicentro do desastre, respondendo por suas ações e omissões.

Como as autoridades reagiram aos primeiros sinais de perigo?

A reação das autoridades aos primeiros sinais de perigo em Maceió foi um processo gradual e, inicialmente, marcado por incertezas e uma falta de clareza sobre a real dimensão do problema. Quando os moradores do Pinheiro começaram a relatar tremores e rachaduras em 2018, as primeiras respostas vieram da Defesa Civil Municipal e de órgãos de pesquisa, que tentaram identificar a origem dos fenômenos.

No início, houve uma tendência de atribuir os tremores a sismos naturais ou a causas superficiais, o que gerou um atraso na compreensão da gravidade da situação. A falta de um histórico claro de abalos sísmicos naquela intensidade em Maceió, aliada à ausência de informações robustas sobre a mineração subterrânea, contribuiu para essa avaliação inicial subestimada.

Com a persistência e o agravamento dos tremores e o surgimento de danos estruturais mais evidentes, a preocupação pública e política aumentou. O Serviço Geológico do Brasil (CPRM) foi acionado para realizar estudos aprofundados sobre a geologia do subsolo e a causa dos fenômenos. Este foi um passo crucial para a compreensão científica do desastre iminente.

O relatório técnico do CPRM, divulgado em maio de 2019, foi o ponto de virada. Ele estabeleceu categoricamente a relação entre a atividade minerária da Braskem e os movimentos do solo, classificando a situação como um risco geológico de alta complexidade. Esta análise científica deu base para que as autoridades, como a Defesa Civil, começassem a agir de forma mais incisiva.

A partir da confirmação do CPRM, a Defesa Civil municipal e estadual, com o apoio do Ministério Público Federal e Estadual, iniciou o mapeamento das áreas de risco e o planejamento da evacuação. Foi decretado estado de emergência e, posteriormente, de calamidade pública em partes dos bairros afetados. A prioridade tornou-se a segurança das vidas, levando ao início de um complexo processo de desocupação das áreas mais críticas.

Apesar da ação subsequente, a demora na identificação da causa e na tomada de medidas preventivas gerou críticas por parte da população e de especialistas. A ausência de um plano de contingência robusto para um risco dessa natureza, e a dependência excessiva de eventos para disparar a reação, foram apontadas como deficiências na gestão de crises por parte das autoridades em diferentes níveis.

Qual foi o processo de evacuação das áreas de risco?

O processo de evacuação das áreas de risco em Maceió foi uma operação de grande escala e complexidade, que exigiu a coordenação entre diversas esferas do governo, a Braskem e a sociedade civil. Com a confirmação da instabilidade geológica pelo CPRM em 2019, a Defesa Civil delimitou as zonas de alto e médio risco, e a saída dos moradores tornou-se imperativa para a preservação de vidas.

Inicialmente, a evacuação ocorreu de forma voluntária e assistida, com as famílias sendo orientadas a deixar suas casas. A Braskem, após assumir a responsabilidade, começou a oferecer auxílio-moradia e realocação para as famílias. No entanto, a incerteza sobre o futuro, a desinformação e a resistência de alguns moradores que tinham toda uma vida construída nos bairros, tornaram o processo desafiador e emocionalmente desgastante.

A medida que o afundamento do solo progredia, a evacuação tornou-se compulsória em algumas áreas, com o apoio da polícia e outros órgãos de segurança para garantir que ninguém permanecesse em locais de alto risco. Faixas e barreiras foram instaladas para isolar as zonas de perigo, e o monitoramento constante dos movimentos do solo ditava a urgência e a extensão das novas áreas a serem evacuadas.

O programa de realocação envolveu a identificação de novas moradias, sejam elas alugadas ou compradas, para as famílias afetadas. A Braskem se comprometeu a arcar com os custos de aluguel provisório e a compensação financeira para a aquisição de novas propriedades ou a indenização por perdas materiais. A logística de mudança, o transporte de bens e o apoio psicossocial foram componentes importantes da assistência.

Para auxiliar na evacuação, foram criados pontos de apoio e centros de triagem para os desabrigados. Equipes multidisciplinares, incluindo assistentes sociais, psicólogos e defensores públicos, ofereceram suporte às famílias, que enfrentavam a perda de seus lares e a desestruturação de suas comunidades. A complexidade do processo residiu na gestão de milhares de casos individuais, cada um com suas particularidades.

Ainda que a grande maioria das famílias tenha sido evacuada, o processo não foi isento de tensões. Houve relatos de dificuldades na negociação com a Braskem, questionamentos sobre os valores de indenização e a morosidade em alguns trâmites burocráticos. A evacuação, embora necessária, desfez laços comunitários e alterou permanentemente a vida de dezenas de milhares de pessoas, deixando um legado de deslocamento e resiliência.

Quantas famílias foram diretamente atingidas e deslocadas?

O número de famílias diretamente atingidas e deslocadas pelo Caso Braskem em Maceió é um dos aspectos mais devastadores e quantificáveis do desastre humanitário. Estima-se que mais de 14.000 imóveis tenham sido afetados em quatro bairros da capital alagoana: Pinheiro, Mutange, Bebedouro e Bom Parto. Isso se traduz em um número impressionante de famílias que perderam seus lares e foram forçadas a recomeçar suas vidas em outros lugares.

O impacto social foi massivo, atingindo aproximadamente 60.000 pessoas que viviam nessas áreas. Crianças, idosos, famílias inteiras tiveram que abandonar suas casas, muitas vezes com pouco tempo para organizar seus pertences e sem saber para onde ir. A desestruturação de comunidades inteiras, com seus laços sociais, econômicos e afetivos, foi uma das consequências mais dolorosas e difíceis de mensurar.

Cada um desses imóveis representava um lar, um negócio, uma história. O número de famílias deslocadas não se resume a estatísticas, mas sim a um drama humano profundo. Muitas das pessoas afetadas eram de classes sociais diversas, desde trabalhadores a profissionais liberais, mas todas partilhavam a experiência da perda abrupta e traumática de seu patrimônio e de sua base de vida.

Para se ter uma ideia da escala, a cidade de Maceió possui uma população de mais de 1 milhão de habitantes. O deslocamento de dezenas de milhares de pessoas representou um choque significativo para a estrutura urbana e social da capital. A demanda por novas moradias, escolas e serviços em outras regiões da cidade se tornou um desafio logístico e social imediato para as autoridades.

A Braskem, por meio do Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF), assumiu a responsabilidade de indenizar e realocar essas famílias. O processo de negociação e pagamento das indenizações e auxílios de moradia provisória envolveu a análise individual de cada caso, o que demandou um esforço gigantesco por parte da empresa e dos órgãos de mediação.

Ainda que a realocação física tenha sido concluída para a maioria, as sequelas emocionais e sociais persistirão por gerações. A perda da vizinhança, das escolas dos filhos, dos pequenos negócios locais e do senso de pertencimento deixam um legado duradouro de trauma e adaptação. O número de famílias atingidas reflete a magnitude da catástrofe e a profundidade da ferida aberta na alma da cidade de Maceió.

Que tipo de danos materiais e ambientais foram observados?

Os danos materiais e ambientais decorrentes do Caso Braskem em Maceió são extensos e multifacetados, refletindo a complexidade do desastre geológico. Materialmente, o impacto mais evidente foi a inabitabilidade de milhares de imóveis. Residências, edifícios comerciais, escolas, igrejas e outros estabelecimentos públicos sofreram danos estruturais severos, como rachaduras, fissuras, inclinações e, em alguns casos, colapso parcial.

A infraestrutura urbana dos bairros afetados foi totalmente comprometida. Ruas e avenidas apresentaram afundamentos, ondulações e fendas, tornando-as intransitáveis. Redes de água, esgoto, energia elétrica e gás foram rompidas, gerando vazamentos, interrupções no fornecimento e riscos adicionais. Postes de iluminação e sinalização de trânsito inclinaram ou caíram, contribuindo para a desfiguração da paisagem urbana.

O valor patrimonial perdido é imenso. Além do custo de reposição dos imóveis, há a perda do investimento de uma vida para muitas famílias, que viram seu patrimônio desvalorizado ou completamente destruído. O valor histórico e afetivo de muitas construções, especialmente em bairros mais antigos, também foi irrecuperavelmente perdido, representando um dano cultural e social invisível.

Do ponto de vista ambiental, os danos são igualmente preocupantes. A movimentação do solo afetou o lençol freático, alterando o fluxo de águas subterrâneas e a qualidade da água em algumas áreas. A formação de grandes crateras e desníveis modificou a topografia natural do terreno, impactando ecossistemas locais, mesmo que a área diretamente afetada não fosse de grande biodiversidade.

Embora o foco principal do desastre seja geológico e urbano, a instabilidade também gerou preocupações com a contaminação do solo e da água por efluentes domésticos e industriais devido ao rompimento de tubulações. A mistura de águas pluviais com esgoto e a exposição de sedimentos podem representar riscos à saúde pública e ao meio ambiente se não forem adequadamente mitigados.

A Braskem foi obrigada a desenvolver um Plano de Remediação Ambiental para monitorar e mitigar os impactos no meio ambiente. Isso inclui o acompanhamento da qualidade da água, a estabilização do solo e a recuperação de áreas degradadas. Contudo, a magnitude da intervenção necessária e o caráter irreversível de parte dos danos geológicos e paisagísticos destacam a profundidade da cicatriz ambiental deixada pelo desastre.

Como o Plano de Compensação Financeira da Braskem foi estruturado?

O Plano de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF) da Braskem foi estruturado como a principal resposta da empresa para mitigar os impactos sociais e econômicos do desastre geológico. Este plano, resultado de um acordo judicial com o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público Estadual (MPAL) e a Defensoria Pública, visava indenizar e realocar todas as famílias e comerciantes afetados pela subsidência do solo.

A estrutura do PCF dividiu os imóveis em categorias, dependendo do grau de risco e do tipo de propriedade (residencial ou comercial). Para os imóveis residenciais, a Braskem ofereceu uma indenização que cobria o valor de mercado do imóvel antes do desastre, acrescido de valores adicionais por danos emergentes, lucros cessantes (para negócios) e uma compensação por danos morais. Esta abordagem buscava uma reparação integral dos prejuízos.

Um dos pilares do plano foi o auxílio-moradia e realocação. As famílias elegíveis recebiam um auxílio mensal para aluguel ou, em alguns casos, a Braskem adquiria uma nova residência para a família. A empresa também cobriu custos de mudança, transporte e, em certas situações, despesas adicionais para adaptação à nova localidade. O objetivo era garantir que ninguém ficasse desabrigado.

O processo de adesão ao PCF era feito por meio de um escritório de atendimento especializado mantido pela Braskem, sob a supervisão dos órgãos de justiça. As famílias apresentavam a documentação do imóvel, comprovantes de residência e outros dados necessários. A negociação e a avaliação do valor da indenização eram realizadas individualmente, buscando contemplar as peculiaridades de cada caso.

O plano também previa a indenização para comerciantes e proprietários de imóveis comerciais que perderam seus estabelecimentos e fontes de renda. Nestes casos, a compensação incluía o valor do imóvel, estoque, instalações e a perda de faturamento, com o objetivo de permitir a reconstrução de suas atividades econômicas em outros locais. A Braskem também ofereceu auxílio para o recomeço de pequenos negócios.

Para garantir a transparência e a fiscalização, o PCF foi submetido a um comitê de monitoramento composto por representantes dos órgãos envolvidos no acordo. Este comitê acompanhava a execução do plano, resolvia disputas e garantia que os direitos das vítimas fossem respeitados. A estrutura do plano, embora complexa, buscou ser abrangente para lidar com a magnitude do desastre social.

Quais foram as críticas e desafios na execução do plano de compensação?

A execução do Plano de Compensação Financeira (PCF) da Braskem, apesar de sua abrangência, enfrentou diversas críticas e desafios significativos. Uma das principais queixas foi a morosidade e burocracia do processo inicial. As famílias, já fragilizadas pela perda de seus lares e pela incerteza, muitas vezes se deparavam com exigências documentais complexas e prazos de análise prolongados, gerando angústia e frustração.

Outra crítica recorrente era a avaliação dos imóveis. Muitos moradores e comerciantes alegavam que os valores oferecidos pela Braskem eram inferiores ao real valor de mercado de seus bens, desconsiderando investimentos feitos ao longo dos anos, benfeitorias e o valor afetivo. A insatisfação com os valores propostos levava a longas negociações e, em alguns casos, a ações judiciais paralelas.

A disparidade de tratamento entre os casos também gerou atritos. Embora o plano buscasse individualizar as compensações, a percepção de que alguns foram beneficiados de forma mais justa que outros criava um ambiente de desconfiança. As vítimas questionavam a transparência dos critérios de avaliação e a homogeneidade na aplicação das diretrizes, exigindo mais equidade.

O plano não conseguiu abranger todas as perdas indiretas e intangíveis. Famílias relataram a dificuldade de compensar a perda de um senso de comunidade, o trauma psicológico do deslocamento, a interrupção da rotina escolar dos filhos ou o impacto na saúde mental. Esses danos não materiais, embora imensos, eram difíceis de quantificar e, portanto, de serem plenamente compensados financeiramente.

A comunicação entre a Braskem e os atingidos foi outro ponto sensível. Muitas famílias se sentiram desassistidas e com poucas informações claras sobre o andamento de seus processos. A linguagem técnica e a complexidade do plano dificultavam a compreensão para a população em geral, resultando em desinformação e estresse adicionais para os afetados.

Ainda que a maioria das negociações tenha sido finalizada, a execução do PCF não eliminou a profunda cicatriz social. O desafio de reconstruir vidas em novos bairros, adaptar-se a novas realidades e superar o trauma do deslocamento é algo que o dinheiro, por si só, não pode resolver. As críticas apontam para a necessidade de abordagens mais holísticas em desastres que afetam grandes contingentes populacionais.

Que ações judiciais foram movidas contra a Braskem?

O Caso Braskem desencadeou uma miríade de ações judiciais contra a empresa, abrangendo diversas esferas do direito – civil, ambiental e criminal. As ações foram movidas por uma variedade de atores, incluindo o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do Estado de Alagoas (MPAL), a Defensoria Pública da União, a Defensoria Pública de Alagoas, o Município de Maceió e milhares de moradores individualmente.

O Ministério Público Federal (MPF) foi um dos principais articuladores das ações coletivas. Atuou na linha de frente para forçar a Braskem a assumir a responsabilidade e negociar os acordos de compensação. O MPF firmou Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) que resultaram no Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF), buscando uma solução abrangente para as vítimas. Essas ações tinham como foco a reparação integral dos danos causados.

A Defensoria Pública, tanto federal quanto estadual, atuou na defesa dos direitos das vítimas, garantindo que os termos dos acordos fossem justos e que as famílias tivessem acesso à informação e representação legal. A defensoria auxiliou milhares de pessoas na negociação individual com a Braskem e interveio em casos de discordância, visando proteger os direitos dos vulneráveis.

O Município de Maceió também ingressou com ações judiciais contra a Braskem para buscar a reparação dos danos causados à infraestrutura pública da cidade, como ruas, escolas, postos de saúde e redes de saneamento. A cidade alegava a necessidade de compensação pelos prejuízos patrimoniais e pela desvalorização do território, bem como para financiar a reconstrução da infraestrutura urbana em novas áreas.

Além das ações coletivas, milhares de moradores e comerciantes individualmente também moveram processos contra a Braskem. Estes processos buscavam indenizações específicas por danos materiais e morais, especialmente em casos onde os valores propostos pelo PCF não eram considerados suficientes ou onde as peculiaridades de cada situação demandavam uma análise judicial. A litigiosidade individual adicionou complexidade ao cenário jurídico.

No campo criminal, investigações foram abertas para apurar a responsabilidade penal de executivos da Braskem por possíveis crimes ambientais ou contra a segurança pública. Essas investigações buscam determinar se houve negligência, omissão ou dolo na condução das operações de mineração, e se a empresa agiu de forma a colocar em risco a vida e o patrimônio da população. A busca por justiça criminal é um aspecto sensível do caso.

As ações judiciais impuseram à Braskem a necessidade de provisionar bilhões de reais para cobrir os custos das indenizações e das obrigações de remediação. A constante pressão judicial e a necessidade de acordos têm sido um fator determinante na forma como a empresa tem gerido a crise, impactando significativamente suas finanças e sua reputação globalmente.

Qual o impacto do caso na economia local de Maceió?

O Caso Braskem impôs um impacto econômico devastador e multifacetado sobre Maceió, afetando diretamente a estrutura social e produtiva da cidade. A desocupação de bairros inteiros, que antes eram vibrantes com comércio e serviços, resultou na perda de milhares de pequenos e médios negócios. Padarias, mercados, salões de beleza, oficinas e outras atividades comerciais desapareceram, deixando um vácuo econômico e social.

A perda de valor imobiliário foi gigantesca. Milhares de imóveis foram considerados inabitáveis e, consequentemente, tiveram seu valor de mercado reduzido a zero na prática. Essa desvalorização não afetou apenas os imóveis nas áreas de risco, mas também gerou incerteza e impactou o mercado imobiliário em toda a cidade, com uma percepção de risco geológico que se estendeu para além das zonas críticas.

O setor de serviços e comércio que dependia da clientela local dos bairros afetados sofreu um colapso abrupto. Além dos negócios fechados, a realocação de dezenas de milhares de moradores redistribuiu o poder de compra e alterou os padrões de consumo na cidade. Muitos trabalhadores perderam seus empregos ou viram suas fontes de renda desaparecerem, elevando o índice de desemprego e a informalidade em certas áreas.

A receita municipal também foi diretamente atingida. A desocupação e a desvalorização dos imóveis resultaram em uma queda significativa na arrecadação de impostos como o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e o ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis). A perda desses recursos impacta diretamente a capacidade da prefeitura de investir em serviços públicos e infraestrutura em outras partes da cidade.

O turismo, uma das principais bases da economia de Maceió, também sentiu os reflexos, embora de forma mais indireta. A imagem da cidade como destino seguro e paradisíaco foi arranhada pela divulgação em massa do desastre. Embora os pontos turísticos tradicionais não tenham sido afetados fisicamente, a associação com uma “cidade que afunda” gerou alguma incerteza e preocupação entre potenciais visitantes.

Apesar dos bilhões de reais em compensações e investimentos por parte da Braskem, que de certa forma injetaram capital na economia, a realocação do comércio e a reconstrução do tecido social e econômico desses bairros demandarão anos. O impacto na economia local transcende o aspecto financeiro, manifestando-se na desorganização social e na descontinuidade de um modo de vida que havia sido estabelecido por décadas.

Como o caso Braskem se tornou um precedente para a fiscalização ambiental?

O Caso Braskem em Maceió estabeleceu um precedente sombrio, mas crucial, para a fiscalização ambiental e minerária no Brasil. A magnitude do desastre, com seus impactos geológicos, sociais e econômicos, evidenciou a necessidade urgente de revisão e fortalecimento das políticas de licenciamento e monitoramento de atividades potencialmente perigosas, especialmente aquelas que envolvem o subsolo.

A crise forçou as autoridades, como a Agência Nacional de Mineração (ANM) e os órgãos ambientais estaduais e federais, a reavaliar seus procedimentos de fiscalização. Ficou claro que o modelo anterior, que talvez se baseasse excessivamente na autodeclaração das empresas ou em auditorias pontuais, era insuficiente para prevenir catástrofes de tamanha proporção. Houve um chamado por monitoramento mais rigoroso e contínuo.

A necessidade de maior transparência e acesso à informação sobre as operações de mineração também se tornou um imperativo. A falta de conhecimento público sobre as cavidades subterrâneas e os riscos geológicos em Maceió, antes do desastre, gerou um clamor por dados mais acessíveis e compreensíveis para a sociedade civil e as comunidades potencialmente afetadas por atividades similares.

O caso Braskem ressaltou a importância da análise geológica aprofundada e da inclusão de estudos de risco em longo prazo nos processos de licenciamento ambiental. A ideia de que as licenças devem ser emitidas não apenas com base em impactos imediatos, mas também considerando a acumulação de efeitos ao longo do tempo, ganhou força. A complexidade do subsolo de Maceió serviu como um alerta.

O envolvimento e a atuação firme do Ministério Público e da Defensoria Pública no caso Braskem também redefiniram o papel desses órgãos na fiscalização de grandes empreendimentos. Eles demonstraram a capacidade de atuar proativamente na defesa dos direitos coletivos e de responsabilizar grandes corporações, mesmo diante de estruturas complexas e argumentos técnicos.

A Braskem se tornou um exemplo de responsabilidade corporativa (ou da falta dela) em caso de desastre ambiental. O volume das indenizações, a desocupação de áreas e a necessidade de remediação representam um custo altíssimo que serve de alerta para outras empresas do setor. O caso se tornou uma referência em seminários e debates sobre sustentabilidade e governança ambiental, enfatizando que os riscos negligenciados têm consequências severas e bilionárias.

Quais foram as lições aprendidas sobre segurança e responsabilidade corporativa?

O Caso Braskem em Maceió ofereceu duras e inegáveis lições sobre segurança operacional e responsabilidade corporativa, reverberando para além das fronteiras brasileiras. A principal lição é que a busca por lucro não pode jamais se sobrepor à segurança das comunidades e à integridade ambiental. A negligência com riscos conhecidos ou previsíveis pode levar a catástrofes de proporções inimagináveis.

A necessidade de uma gestão de riscos robusta e proativa é um imperativo. As empresas que operam em setores de alto risco, como a mineração e a petroquímica, devem investir continuamente em estudos geológicos, monitoramento tecnológico e avaliações de segurança que considerem o longo prazo. A confiança excessiva em dados antigos ou a subestimação de cenários de pior caso podem ter consequências devastadoras.

A transparência e a comunicação clara com as partes interessadas, especialmente as comunidades locais, são cruciais. A Braskem enfrentou críticas por não ter alertado a população sobre os riscos iminentes, mesmo quando já havia sinais de instabilidade. Uma abordagem ética exige que as empresas compartilhem informações relevantes e envolvam as comunidades na discussão sobre os potenciais impactos de suas operações.

A responsabilidade corporativa não termina na obtenção de licenças e na conformidade com a legislação. Ela se estende à antecipação de problemas, à mitigação de riscos e à reparação integral dos danos quando estes ocorrem. O caso Braskem demonstrou que a reparação não é apenas financeira, mas também social, psicológica e ambiental, exigindo um compromisso holístico com a restauração do bem-estar das comunidades.

O papel da fiscalização e dos órgãos reguladores é vital. O desastre de Maceió expôs lacunas no sistema de licenciamento e monitoramento que permitiram que uma situação de risco se agravasse por décadas. As lições apontam para a necessidade de órgãos reguladores independentes, com capacidade técnica e autonomia para impor rigorosas medidas de segurança e responsabilizar as empresas por falhas.

Por último, a lição sobre a interconexão de sistemas. Um desastre aparentemente localizado, como o colapso de cavidades subterrâneas, pode desencadear uma cascata de impactos – de danos estruturais a crises humanitárias, econômicas e sociais. Isso reforça a importância de uma visão sistêmica e integrada na avaliação de projetos industriais e na governança corporativa, onde a segurança é um valor intrínseco e inegociável.

Qual o futuro das áreas desocupadas em Maceió?

O futuro das áreas desocupadas em Maceió, como Pinheiro, Mutange e Bebedouro, é uma questão complexa e de longo prazo, sem respostas fáceis. Com a desocupação de milhares de imóveis e a consolidação das áreas de risco, esses bairros se transformaram em zonas fantasmas, com uma paisagem de abandono e desolação. O que acontecerá com esses vastos espaços urbanos é objeto de intenso debate.

Uma das propostas em discussão é a requalificação e revegetação de algumas das áreas. A ideia é transformar os locais em parques, áreas de lazer ou espaços verdes, aproveitando a topografia alterada e a vegetação espontânea que começa a surgir. Esta abordagem visa não apenas a recuperação ambiental, mas também a criação de novas áreas de convivência para a cidade, mitigando o trauma visual do abandono.

A Braskem é responsável por realizar o monitoramento contínuo das áreas e pelo tamponamento dos poços para tentar estabilizar o solo. Este trabalho de engenharia geotécnica é fundamental e ditará a segurança de qualquer uso futuro. A estabilidade do subsolo é a principal condição para qualquer tipo de intervenção ou projeto nas áreas desocupadas, e essa estabilidade pode levar décadas para ser totalmente alcançada.

Outra discussão importante é sobre a função social da propriedade. Com a indenização e a desapropriação de imóveis, a Braskem se tornou proprietária de vastas extensões de terreno. O destino dessas propriedades, se serão repassadas ao poder público ou mantidas sob gestão da empresa, ainda é um tema de negociação e definição jurídica. A sociedade civil acompanha de perto a destinação desse patrimônio.

Há também a possibilidade de usos restritos ou especializados em algumas das áreas, que não envolvam edificações permanentes ou grandes concentrações de pessoas. Isso poderia incluir instalações de pesquisa geológica, espaços para monitoramento ambiental ou usos temporários que não comprometam a segurança. A criatividade no planejamento urbano será fundamental para encontrar soluções viáveis.

Ainda que a curto e médio prazo as áreas permaneçam sob estrito monitoramento e sem uso intensivo, o desafio é pensar na recuperação da autoestima e da identidade dos moradores que ali viviam. Mais do que planejar o futuro físico dos bairros, é preciso investir na memória, na história e na reconstrução social das comunidades que foram desfeitas, garantindo que o legado do Pinheiro, Mutange e Bebedouro não seja apenas o de um desastre.

Como a comunidade de Maceió se reergueu após a tragédia?

A comunidade de Maceió, apesar da profunda ferida causada pela tragédia da Braskem, tem demonstrado uma impressionante capacidade de resiliência e reerguimento. A perda de lares e a desestruturação de bairros inteiros geraram um sentimento de luto coletivo, mas também uma força coletiva para buscar justiça, apoio e reconstrução.

Um dos aspectos mais marcantes do reerguimento foi a formação de associações e grupos de apoio entre os atingidos. Essas organizações desempenharam um papel crucial na união das vozes, na defesa dos direitos das vítimas e na mediação com as autoridades e a Braskem. Elas se tornaram centros de informação, apoio mútuo e mobilização social, garantindo que nenhuma família fosse deixada para trás.

A solidariedade interna na cidade foi evidente. Muitas famílias, amigos e vizinhos se apoiaram mutuamente durante o processo de realocação, oferecendo abrigo temporário, ajuda com mudanças e apoio emocional. A rede de solidariedade ajudou a amenizar o trauma e a facilitar a adaptação a novas realidades, embora a distância geográfica tenha sido um desafio.

Apesar do trauma, a cidade tem buscado redirecionar seu foco e investimentos para outras áreas, fortalecendo setores como o turismo em regiões não afetadas. Houve um esforço para mostrar que Maceió é mais do que a área do desastre, e que suas belezas naturais e sua capacidade de superação permanecem intactas. Iniciativas de marketing e eventos locais têm contribuído para reanimar a economia e a autoestima.

A experiência do desastre também gerou um engajamento cívico maior em relação a questões de desenvolvimento urbano e sustentabilidade. A população se tornou mais vigilante e vocal sobre a necessidade de fiscalização de grandes empreendimentos e a importância de um planejamento urbano que priorize a segurança e o bem-estar dos cidadãos. O caso Braskem virou um catalisador para a consciência ambiental e social.

O processo de reconstrução social e psicológica é contínuo e demanda apoio prolongado. Programas de atendimento psicológico, apoio social e inclusão em novas comunidades são essenciais para ajudar as famílias a superar o trauma e a reconstruir suas vidas. O reerguimento da comunidade de Maceió é um testemunho da força do espírito humano diante da adversidade, ainda que as cicatrizes permaneçam.

Quais os desafios de monitoramento geológico persistentes?

Apesar da suspensão das atividades de mineração e do tamponamento dos poços, os desafios de monitoramento geológico persistentes em Maceió são imensos e de longo prazo. A área afetada continua a ser um local de complexa instabilidade no subsolo, exigindo uma vigilância contínua e tecnologicamente avançada para garantir a segurança da população e das estruturas remanescentes.

Um dos principais desafios é a progressão da subsidência. Embora o ritmo de afundamento tenha diminuído após o tamponamento dos poços, o solo ainda pode sofrer acomodações e novos movimentos. É fundamental monitorar constantemente a velocidade e a direção dos deslocamentos para prever quaisquer novas ameaças e ajustar as áreas de segurança. Isso requer uma rede densa de sensores e instrumentação geotécnica.

A estabilidade das cavidades subterrâneas, mesmo as preenchidas, continua sendo uma preocupação. A interação entre as cavidades e o ambiente geológico circundante pode gerar reajustes e colapsos em diferentes pontos. O monitoramento por sismógrafos, radares de penetração de solo (GPR) e sistemas de posicionamento global (GPS) é essencial para detectar qualquer anomalia em profundidade e na superfície.

A influência da água no subsolo é outro fator crítico. As variações no nível do lençol freático, causadas por chuvas intensas ou mudanças no regime hídrico, podem afetar a estabilidade das rochas e acelerar os processos de dissolução ou acomodação. O monitoramento hidrológico e a gestão da drenagem são componentes vitais para controlar os riscos geotécnicos.

A extensão da área impactada e a possibilidade de novos focos de instabilidade fora das zonas originalmente delimitadas representam um desafio adicional. O monitoramento precisa ser abrangente o suficiente para cobrir não apenas os bairros evacuados, mas também as áreas vizinhas que podem ser indiretamente afetadas. A rede de sensores deve ser ampliada e aprimorada ao longo do tempo.

Por fim, a manutenção e a calibração dos sistemas de monitoramento em longo prazo são um desafio técnico e financeiro. As infraestruturas e os equipamentos necessitam de constante atualização e manutenção para garantir a precisão dos dados. A colaboração entre a Braskem, as universidades e os órgãos governamentais será fundamental para assegurar que o legado de monitoramento seja robusto e duradouro, garantindo que o subsolo de Maceió não volte a ser uma ameaça.

Qual o custo total estimado do desastre para a Braskem e para o estado?

O custo total estimado do desastre para a Braskem e para o estado de Alagoas e o município de Maceió é bilionário e continua a se expandir, refletindo a magnitude sem precedentes da catástrofe. Para a Braskem, os valores provisionados e desembolsados são enormes, abrangendo indenizações, obras de mitigação, monitoramento e multas.

A maior parte do custo para a Braskem está relacionada ao Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (PCF). A empresa se comprometeu a indenizar mais de 14 mil imóveis e pagar auxílios para realocação e danos morais para dezenas de milhares de pessoas. O valor total destinado a este programa e acordos adicionais com órgãos de justiça e o município de Maceió já ultrapassou os R$ 10 bilhões.

Além das indenizações diretas, a Braskem arca com os custos das obras de remediação e estabilização do solo. Isso inclui o tamponamento dos poços de sal-gema, o monitoramento geológico contínuo das áreas afetadas e a manutenção das barreiras de segurança. Estas obras são complexas e de longo prazo, demandando investimentos significativos em engenharia geotécnica e tecnologia.

A empresa também enfrenta custos operacionais indiretos, como a desativação de sua planta em Maceió, a perda de produção de sal-gema e os impactos em sua cadeia de suprimentos. A reputação da Braskem foi severamente arranhada, gerando custos de imagem e licenciamento em outros projetos, além de impactar o valor de suas ações no mercado.

Para o estado de Alagoas e o município de Maceió, o custo é igualmente vultoso, embora de natureza diferente. O impacto inicial foi na gestão de emergência e na realocação das famílias, que exigiu recursos públicos significativos. A perda de arrecadação de impostos (IPTU, ITBI) nas áreas desocupadas gerou um rombo nas finanças municipais, dificultando o investimento em serviços e infraestrutura.

A reconstrução da infraestrutura pública danificada, como ruas, redes de saneamento, escolas e postos de saúde, também representa um custo que o poder público busca reaver da Braskem. Além dos valores financeiros, há o custo social e humano incalculável, que inclui o trauma psicológico da população, a desestruturação de comunidades e a perda do patrimônio histórico e afetivo dos bairros.

A lista abaixo detalha os principais elementos do custo:

• Indenizações a moradores e comerciantes.
• Custos de realocação e auxílio-moradia.
• Obras de mitigação e tamponamento de poços.
• Monitoramento geológico e ambiental contínuo.
• Perda de arrecadação de impostos para o município.
• Danos à infraestrutura pública (ruas, redes, prédios).
• Custos com gestão de crise e apoio humanitário.
• Impacto na reputação e no valor de mercado da Braskem.
• Perda de empregos e impacto na economia local.

O valor total exato ainda é difícil de mensurar com precisão, pois muitos custos são de longo prazo e alguns impactos são irreversíveis. No entanto, o Caso Braskem já se consolida como um dos desastres ambientais e sociais mais caros da história do Brasil, com um legado financeiro que se estenderá por décadas.

A tabela abaixo resume os principais impactos financeiros:

O que significa o Caso Braskem para a indústria de mineração no Brasil?

O Caso Braskem em Maceió representa um marco sombrio e um alerta para a indústria de mineração no Brasil, impulsionando a necessidade de uma revisão profunda nas práticas, regulamentações e fiscalização do setor. O desastre revelou falhas sistêmicas que, se não corrigidas, podem levar a tragédias semelhantes em outras regiões do país com atividades minerárias intensivas.

Uma das maiores implicações é a necessidade de maior rigor no licenciamento e monitoramento de projetos de mineração, especialmente aqueles que envolvem o subsolo e áreas urbanas. A experiência de Maceió demonstra que a análise de risco deve ser contínua, dinâmica e considerar os efeitos cumulativos e de longo prazo da exploração, para além do ciclo de vida da mina.

O caso reforça a urgência de uma modernização e fortalecimento da Agência Nacional de Mineração (ANM) e de outros órgãos reguladores. É fundamental que essas instituições tenham autonomia, recursos humanos e tecnológicos suficientes para realizar uma fiscalização proativa e eficaz, não apenas de barragens e pilhas de rejeitos, mas também de atividades de mineração subterrânea, que muitas vezes são menos visíveis.

A exigência de planos de contingência e fechamento de mina mais robustos e detalhados tornou-se um ponto crucial. O caso Braskem evidenciou que o abandono ou a interrupção inadequada das operações de mineração pode gerar passivos ambientais e sociais imensos, que recaem sobre a sociedade e o poder público. As empresas precisam ser legalmente e financeiramente responsáveis pela reabilitação integral das áreas após a exaustão da mina.

A questão da responsabilidade corporativa é elevada a um novo patamar. A Braskem, como operadora, foi responsabilizada pelo desastre, e o volume das compensações e das obrigações demonstra que a negligência tem um custo altíssimo. Isso serve de alerta para outras empresas do setor sobre a necessidade de práticas de governança mais éticas e o investimento em segurança como prioridade máxima, não apenas como custo.

O Caso Braskem também impulsiona o debate sobre a interação entre mineração e uso do solo urbano. A proximidade entre áreas de exploração e comunidades densamente povoadas precisa ser cuidadosamente avaliada e, em muitos casos, repensada. O planejamento territorial e as restrições urbanísticas devem ser mais rigorosos para evitar a sobreposição de riscos e o comprometimento da segurança das cidades.

A participação social e o acesso à informação para as comunidades afetadas ou potencialmente afetadas por projetos de mineração também ganham destaque. O caso de Maceió sublinhou a importância de ouvir as comunidades, de fornecer dados claros sobre os riscos e de construir mecanismos para que a população possa denunciar e ser ouvida antes que uma crise se instale. A indústria de mineração brasileira agora enfrenta um escrutínio sem precedentes, com o Caso Braskem como um paradigma de alerta sobre as consequências da irresponsabilidade.

Bibliografia

• Serviço Geológico do Brasil (CPRM). Relatório de Avaliação da Estabilidade de Massa do Bairro do Pinheiro, Mutange e Bebedouro em Maceió – Alagoas. Brasília, 2019.
• Ministério Público Federal (MPF). Acordo firmado com a Braskem sobre o Plano de Compensação Financeira e Apoio à Realocação. Brasília, 2020.
• Folha de S.Paulo. Cobertura jornalística sobre o caso Braskem em Maceió, artigos publicados entre 2018 e 2023.
• G1 (Globo). Série de reportagens e análises sobre o afundamento do solo em Maceió e o papel da Braskem, publicados a partir de 2018.
• Agência Nacional de Mineração (ANM). Relatórios e comunicados sobre a fiscalização da atividade minerária da Braskem em Maceió.
• O Estado de S. Paulo. Artigos e análises sobre os impactos econômicos e sociais do desastre da Braskem em Alagoas, publicados a partir de 2019.
• Instituto do Meio Ambiente do Estado de Alagoas (IMA/AL). Documentos relacionados às licenças ambientais e fiscalização da Braskem em Maceió.
• Defensoria Pública da União (DPU). Atuação no caso Braskem e defesa dos direitos dos atingidos.
• Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Estudos e notas técnicas de pesquisadores sobre a geologia e os impactos do afundamento do solo em Maceió.
• Braskem S.A. Comunicados oficiais e relatórios de sustentabilidade sobre o caso Maceió e o programa de compensação.