Cem Dias de Napoleão: o que foi, causas e impactos

O que foram os Cem Dias de Napoleão?

Os Cem Dias, um período extraordinário na história europeia, representam o breve interlúdio entre a primeira abdicação de Napoleão Bonaparte e sua derrota final em Waterloo. Este lapso de tempo, que durou aproximadamente de 20 de março a 8 de julho de 1815, testemunhou o retorno audacioso do imperador exilado, sua reconquista quase instantânea do poder na França, e a subsequente formação de uma nova coalizão europeia determinada a derrubá-lo de uma vez por todas. Foi um teste decisivo da resiliência napoleônica e da profunda aversão das monarquias tradicionais ao seu regime inovador.

A velocidade estonteante com que Napoleão reassumiu o trono surpreendeu as potências aliadas que deliberavam em Viena sobre a nova ordem europeia. Ele desembarcou na França com um punhado de soldados, mas sua marcha triunfal até Paris foi marcada pela adesão progressiva de tropas e civis, que desertavam do lado monarquista para se juntar à sua causa. Essa onda de apoio demonstrava a persistência de um certo sentimento bonapartista no coração da França, apesar dos anos de guerra e da devastação econômica.

Durante esses Cem Dias, Napoleão tentou apresentar-se como um monarca constitucional, mais moderado e focado na paz, em contraste com a imagem de conquistador incansável que o precedia. Ele promulgou o Ato Adicional às Constituições do Império, uma tentativa de conciliar os ideais revolucionários com a estabilidade imperial, oferecendo maiores liberdades civis e um sistema bicameral. Essas reformas, contudo, eram vistas com profunda desconfiança pelas nações europeias, que já haviam sofrido por mais de uma década sob o expansionismo francês.

As potências europeias, lideradas por Grã-Bretanha, Áustria, Prússia e Rússia, não demoraram a reagir ao retorno de Napoleão. Declarando-o um fora da lei e um perturbador da paz mundial, elas rapidamente mobilizaram seus exércitos para formar a Sétima Coalizão. A determinação em extinguir de vez o perigo napoleônico era palpável, e a preparação para o confronto final começou com uma urgência sem precedentes, mobilizando recursos e tropas em uma escala massiva.

A atmosfera na França durante os Cem Dias era de uma tensão palpável. Embora houvesse apoio entusiástico a Napoleão em muitas regiões, especialmente entre os veteranos e parte da burguesia, setores da nobreza e do clero, bem como os realistas, permaneciam hostis. A economia francesa, já fragilizada por anos de conflito, enfrentava a incerteza de uma nova guerra iminente, gerando uma sensação de ansiedade generalizada sobre o futuro do país e a duração da paz recém-estabelecida.

Os Cem Dias culminaram na campanha da Bélgica, onde Napoleão buscou atacar e derrotar as forças aliadas antes que pudessem se unir e esmagá-lo. Esta campanha, breve e intensa, incluiu as batalhas de Ligny e Quatre Bras, prelúdios para o confronto decisivo. A estratégia napoleônica de dividir para conquistar seria testada ao limite contra exércitos experientes e comandantes determinados a não repetir os erros do passado, preparando o terreno para o que seria o último ato do drama napoleônico.

A velocidade dos acontecimentos durante os Cem Dias, desde a fuga de Elba até a mobilização das tropas, sublinha a dinâmica volátil da política europeia pós-Revolução Francesa. O retorno de Napoleão demonstrou a fragilidade da ordem restaurada e a persistência de ideais que as monarquias tentavam suprimir. Este período, embora curto, teve um impacto desproporcional na reconfiguração do mapa da Europa e na psicologia das nações, consolidando a ideia de que a paz duradoura exigiria o completo desmantelamento do legado imperial francês.

Como Napoleão Bonaparte foi exilado na Ilha de Elba?

O exílio de Napoleão Bonaparte na ilha de Elba, em 1814, foi o desfecho imediato de uma década de guerras quase ininterruptas que haviam redesenhado o mapa da Europa. Após a desastrosa campanha russa de 1812 e as subsequentes derrotas na Guerra da Sexta Coalizão, culminando na Batalha de Leipzig em 1813, o Império Francês encontrava-se em colapso. As forças aliadas avançavam sobre a França, e Paris, pela primeira vez em séculos, estava sob ameaça direta.

A situação militar de Napoleão tornara-se insustentável. Com os exércitos aliados – prussianos, russos, austríacos e britânicos – convergindo sobre a capital, a resistência napoleônica desmoronou. Os próprios marechais de Napoleão, exaustos e desmoralizados após anos de campanha, recusaram-se a continuar a luta. A pressão interna, vinda de figuras políticas como Talleyrand, também crescia, defendendo um acordo de paz que salvasse o país de uma destruição ainda maior.

Em 30 de março de 1814, Paris foi ocupada pelas forças da Coalizão. O Senado francês, sob a influência de Talleyrand, votou pela deposição de Napoleão. Confrontado com a traição de seus generais e a inevitabilidade da derrota, Napoleão, então em Fontainebleau, aceitou os termos de abdicação. A desolação do imperador ao assinar o documento que o despojava de seu poder foi um momento de profunda dramaticidade histórica, marcando o fim de uma era de dominação francesa.

O Tratado de Fontainebleau, assinado em 11 de abril de 1814, estipulou os termos de sua abdicação. Nele, Napoleão renunciou ao trono francês e italiano, mas reteve o título de Imperador e recebeu a soberania sobre a ilha de Elba, uma pequena ilha no Mediterrâneo, perto da costa da Toscana. Ele também seria concedido um rendimento anual considerável, financiado pela coroa francesa, e teria uma guarda pessoal de 600 homens.

A escolha de Elba foi controversa entre os Aliados. Alguns, especialmente o czar Alexandre I da Rússia, defendiam um exílio mais distante, como Santa Helena, prevendo que uma proximidade com a Europa poderia levar a um retorno perigoso. Entretanto, outros líderes, como o Lord Castlereagh britânico, preferiam uma solução que não humilhasse completamente Napoleão, temendo que uma humilhação excessiva pudesse gerar instabilidade futura ou ódio. A decisão final, um compromisso, subestimou a resiliência e a ambição de Bonaparte.

Em 4 de maio de 1814, Napoleão desembarcou em Portoferraio, a principal cidade de Elba. Ele não permaneceu inativo durante seu exílio. Imediatamente, dedicou-se a melhorar a infraestrutura da ilha, organizando as minas de ferro, construindo estradas, e reformando a administração local. Ele também manteve uma corte em miniatura e recebia visitantes, monitorando de perto os acontecimentos na Europa e a situação política na França.

A presença de Napoleão em Elba, embora aparentemente contida, continuava a ser um ponto de preocupação para as potências europeias. Seus guardas pessoais, veteranos leais, e a fascinação pública que ainda exercia, criavam um ambiente de incerteza. A distância geográfica reduzida, em vez de isolamento, oferecia um ponto de observação privilegiado para os desdobramentos políticos na França e nos congressos europeus, mantendo viva a esperança de um retorno para aqueles que ainda acreditavam no seu gênio militar e político.

Quais foram as razões para o descontentamento popular na França sob os Bourbons?

O retorno dos Bourbons ao poder, na figura de Luís XVIII, após a abdicação de Napoleão em 1814, não foi a transição suave que muitos esperavam. O reinado da Monarquia Restaurada foi marcado por um crescente descontentamento em várias camadas da sociedade francesa, alimentado por políticas que pareciam desconsiderar as conquistas da Revolução Francesa e os anos de Império. A tentativa de apagar o passado revolucionário e napoleônico gerou profunda frustração.

Uma das principais fontes de ressentimento foi a questão agrária e a propriedade da terra. Muitos camponeses e burgueses haviam adquirido terras da Igreja e da nobreza emigrada durante a Revolução, e o retorno dos Bourbons levantou o medo de expropriação. Embora Luís XVIII tenha prometido não alterar as vendas de bens nacionais, a presença de nobres ultrarrealistas, que clamavam pela restituição de suas propriedades, gerava uma grande insegurança entre os novos proprietários.

A reorganização do exército também provocou enorme insatisfação. Milhares de veteranos napoleônicos, que haviam lutado por anos sob o comando de um líder que idolizavam, foram dispensados ou rebaixados. Esses soldados, com profundos laços de lealdade ao imperador, viam-se agora marginalizados e substituídos por oficiais da antiga aristocracia, muitos dos quais não tinham experiência em combate. O desprestígio da Guarda Imperial, em particular, feriu o orgulho de muitos militares.

Economicamente, a França enfrentava um período de estagnação após anos de guerra. As indústrias estavam em recuperação lenta, e o comércio ressentia-se das políticas tarifárias protecionistas. A população urbana, em particular, sofria com o desemprego e a pobreza, e as expectativas de uma paz que trouxesse prosperidade não se concretizaram rapidamente. A incapacidade do governo em implementar medidas eficazes para revitalizar a economia aumentava a desilusão popular.

A Carta Constitucional de 1814, embora mais liberal do que o absolutismo pré-revolucionário, foi vista por muitos como uma concessão real, e não como um direito conquistado. Os ultrarrealistas no parlamento tentavam minar as poucas liberdades concedidas, enquanto a memória das vitórias e da glória do Império contrastava fortemente com a percepção de um governo fraco e subserviente às potências estrangeiras. A censura e a repressão política também contribuíram para a insatisfação.

O retorno de emigrados e nobres, muitos dos quais haviam combatido contra a França revolucionária, e sua tentativa de reassumir antigas posições de poder e influência, foi especialmente irritante para o povo. Eles exigiam compensações e privilégios, parecendo ignorar as mudanças sociais e políticas profundas que a França havia experimentado. A arrogância e o anacronismo de parte dessa elite restaurada criaram um fosso insuperável com as aspirações da nação.

A religião também se tornou um ponto de atrito. A Igreja Católica, que havia sido severamente atingida durante a Revolução, via na Restauração uma chance de recuperar sua influência e propriedades. A tentativa de reinstaurar o domínio eclesiástico na vida pública, muitas vezes em detrimento da tolerância religiosa e da liberdade de consciência, gerou ressentimento entre os liberais e aqueles que valorizavam a separação entre Igreja e Estado. A soma de todos esses fardos e frustrações preparou o terreno para o que viria a seguir.

Que fatores impulsionaram a decisão de Napoleão de escapar de Elba?

A decisão de Napoleão Bonaparte de escapar de seu exílio na ilha de Elba em 1815 foi motivada por uma confluência de fatores, tanto internos quanto externos, que minaram sua condição de imperador em miniatura e avivaram sua ambição inabalável. Ele não era um homem de inatividade prolongada, e o ambiente de Elba, embora ele tentasse melhorá-lo, não conseguia satisfazer seu intelecto estratégico e sua natureza inquieta. A observação dos eventos europeus era crucial para sua determinação.

Um dos fatores mais prementes foi a deterioração de sua situação financeira. O Tratado de Fontainebleau garantia a Napoleão um rendimento anual de dois milhões de francos, pagos pela coroa francesa. Contudo, Luís XVIII, enfrentando dificuldades financeiras e pressão dos ultrarrealistas, relutava em cumprir essa obrigação. A suspensão dos pagamentos ameaçava a capacidade de Napoleão de manter sua pequena corte e sua guarda pessoal, minando sua dignidade e segurança.

O Congresso de Viena, reunido para reorganizar a Europa pós-napoleônica, também desempenhou um papel decisivo. Notícias chegavam a Elba sobre as discussões dos Aliados, e uma das propostas que circulavam era a de transferir Napoleão para um exílio muito mais distante e seguro, como Santa Helena ou as Ilhas Bermudas. Essa perspectiva de um isolamento ainda maior, longe do cenário europeu, era intolerável para um homem que vivia de poder e influência, impulsionando a necessidade de agir.

A instabilidade política na França sob os Bourbons era outro incentivo poderoso. Napoleão estava ciente do descontentamento generalizado com Luís XVIII, especialmente entre os camponeses, a burguesia e os veteranos de guerra. As notícias de insatisfação militar e de um retorno da velha aristocracia alimentavam sua crença de que ele ainda tinha um lugar no coração do povo francês, e que seu retorno seria aclamado como uma libertação do jugo monárquico.

Além disso, Napoleão continuava a receber mensagens e visitas secretas de apoiadores na França, que o informavam sobre a situação e o encorajavam a retornar. Esses emissários, muitos deles bonapartistas leais, pintavam um quadro de anarquia latente e um desejo profundo pelo seu retorno. A crença de que o povo francês ansiava por ele e que seu destino ainda não estava cumprido reforçava sua convicção de que o momento para uma retomada do poder estava próximo.

A arrogância e a falta de vigilância das potências aliadas também criaram uma janela de oportunidade. Embora houvesse uma fragata britânica, a HMS Undaunted, designada para monitorar Elba, sua presença não era constante nem infalível. Os Aliados, absorvidos pelas complexidades do Congresso de Viena, subestimaram a capacidade e a audácia de Napoleão, deixando brechas de segurança que um estrategista como ele não deixaria de explorar, especialmente em um momento de grande tensão diplomática.

O próprio temperamento de Napoleão, sua ambição insaciável e sua crença no próprio destino, foram fatores internos cruciais. Ele se via como o salvador da França, o único capaz de restaurar sua glória e estabilidade. A perspectiva de uma vida de ociosidade em Elba era incompatível com sua energia inesgotável e sua mente estratégica. O conjunto desses elementos criou uma pressão irresistível que o levou a planejar e executar a fuga mais espetacular da história moderna.

Como se deu a dramática fuga de Napoleão de Elba e seu retorno à França?

A fuga de Napoleão da ilha de Elba, em 26 de fevereiro de 1815, foi um ato de audácia calculada que lançou a Europa em um novo turbilhão. A noite era escura, e a fragata britânica que supostamente o vigiava estava ausente no momento crucial. Napoleão, com uma força de cerca de 1.100 homens, incluindo sua leal Guarda Imperial e voluntários corsos, embarcou em uma pequena frota de sete navios, liderada pela brigantine Inconstant, sob o silêncio da noite.

A travessia marítima foi marcada por momentos de tensão. O pequeno comboio teve a sorte de não encontrar nenhuma embarcação britânica ou francesa que pudesse alertar as autoridades. Em um momento, a Inconstant cruzou-se com um navio de patrulha francês, mas a visibilidade ruim e a habilidade dos marinheiros de Napoleão em evitar o reconhecimento impediram um confronto. A sorte e a ousadia acompanharam o ex-imperador em sua jornada de volta à França.

O desembarque ocorreu em 1º de março de 1815, na pequena baía de Golfe-Juan, perto de Antibes, na costa sul da França. A escolha do local foi estratégica: longe das grandes cidades onde as guarnições reais poderiam oferecer resistência imediata, permitindo que Napoleão iniciasse sua marcha para o interior, acumulando apoio. A notícia de seu desembarque espalhou-se rapidamente, gerando primeiro descrença, depois um crescente pânico nas capitais europeias.

A marcha de Napoleão para Paris, que ficou conhecida como a “marcha da águia”, foi um fenômeno psicológico e político notável. Inicialmente, ele enfrentou a indiferença ou até a hostilidade de algumas vilas, mas à medida que avançava, o apoio começou a crescer. Ele evitou Marselha, um centro realista, e seguiu por estradas montanhosas, o que hoje é a Rota Napoleão, demonstrando uma determinação inabalável em sua rota para o poder.

O ponto de virada dramático ocorreu perto de Grenoble, em 7 de março, no que ficou conhecido como “o voo da águia”. Um regimento do exército real, comandado pelo General Marchand, foi enviado para interceptá-lo. Napoleão, sozinho e desarmado, caminhou à frente de seus homens, abriu seu casaco e proferiu a famosa frase: “Soldados do Quinto Regimento, eu sou seu imperador! Se há entre vocês um soldado que queira atirar em seu general, aqui estou!”. A resposta foi um grito uníssono de apoio: “Viva o Imperador!”.

A partir desse momento, a marcha tornou-se um desfile triunfal. Regimentos inteiros, comandantes experientes como o Marechal Ney (que havia prometido a Luís XVIII trazer Napoleão em uma jaula de ferro), e uma massa crescente de civis juntaram-se à sua causa. As forças reais enviadas para detê-lo desertavam em massa, rendendo-se à aura carismática de Napoleão e à lealdade dos veteranos. A fraqueza dos Bourbons foi exposta de forma inequívoca.

Na noite de 20 de março de 1815, Napoleão entrou em Paris sem disparar um único tiro, poucas horas depois que Luís XVIII havia fugido da capital. A população parisiense, eufórica e curiosa, o recebeu com aclamações, e ele reassumiu o poder no Palácio das Tulherias, no mesmo gabinete que havia deixado um ano antes. Este retorno extraordinário, sem precedentes na história, demonstrou a profunda ligação que ainda existia entre o imperador e uma parcela significativa da nação.

Qual foi a reação inicial da Europa ao retorno de Napoleão?

A reação inicial da Europa ao retorno de Napoleão de Elba foi de uma combinação de choque, descrença e, acima de tudo, alarme imediato. Os diplomatas e monarcas reunidos no Congresso de Viena, que estavam a ponto de finalizar a reconfiguração do continente, foram pegos completamente de surpresa pela audácia de Bonaparte. A notícia de sua fuga e a subsequente marcha para Paris trouxeram um pavor renovado da instabilidade e da guerra.

O primeiro impulso foi o de condenar o ato de Napoleão com a maior veemência. Em 13 de março de 1815, o Congresso de Viena emitiu uma declaração formal, redigida em grande parte por Talleyrand, que havia se tornado ministro das Relações Exteriores de Luís XVIII. Esta declaração classificava Napoleão como um “perturbador da paz do mundo” e um “inimigo e perturbador da tranquilidade pública”, colocando-o como um fora da lei perante as nações civilizadas.

A declaração de Viena não foi meramente simbólica; ela serviu como um chamado às armas. Os signatários — Grã-Bretanha, Áustria, Prússia, Rússia e outras potências menores — comprometeram-se a unir seus recursos militares para restaurar a ordem e garantir que Napoleão jamais voltasse a ameaçar a segurança da Europa. A unidade da Coalizão, embora testada por discordâncias territoriais, foi rapidamente restaurada diante do inimigo comum.

A mobilização de tropas começou imediatamente em todas as direções. A Grã-Bretanha, sob a liderança do Duque de Wellington, começou a reunir um exército multinacional na Bélgica. A Prússia, com Marechal Blücher à frente, também concentrava suas forças naquela região. A Áustria e a Rússia preparavam seus exércitos para avançar sobre a França a partir do leste, demonstrando uma coordenação e determinação sem precedentes para esmagar a ameaça napoleônica.

O sentimento de urgência era exacerbado pela memória das décadas de guerra e da devastação causada pelas campanhas napoleônicas. Nenhuma potência desejava reviver os custos humanos e materiais de conflitos prolongados. A restauração dos Bourbons era vista como a melhor garantia de paz, e o retorno de Napoleão representava uma regressão perigosa a um passado que todos desejavam esquecer. A estabilidade europeia estava novamente em jogo.

A declaração dos Aliados de que eles não estavam em guerra com a França, mas sim com Napoleão Bonaparte, foi uma tentativa de minar seu apoio interno e evitar que os franceses se unissem à sua causa. Essa distinção visava isolá-lo, pintando-o como um tirano pessoal em vez de um líder nacional. Contudo, a mensagem nem sempre ressoava plenamente, pois muitos franceses viam o conflito como uma nova invasão estrangeira.

Apesar da condenação uníssona e da mobilização militar, havia uma certa apreensão entre os líderes aliados. Eles sabiam do gênio militar de Napoleão e da lealdade de muitos de seus veteranos. A velocidade de seu retorno ao poder era um testemunho de sua capacidade de mobilizar apoio. Esta percepção de perigo e a necessidade de uma ação rápida moldaram a estratégia e a urgência da Sétima Coalizão em seus preparativos para o confronto final.

Como Napoleão conseguiu reunir apoio tão rapidamente após seu retorno?

A capacidade de Napoleão de reunir apoio tão rapidamente após seu retorno de Elba é um testemunho de seu carisma inegável, sua compreensão da psicologia popular e as circunstâncias políticas favoráveis na França. O fenômeno do “voo da águia” não foi apenas uma proeza militar, mas também uma demonstração de sua habilidade de galvanizar tanto militares quanto civis em torno de sua figura e sua causa. Sua imagem, para muitos, representava a glória e o orgulho nacional.

Um fator crucial foi o descontentamento generalizado com a Monarquia Restaurada de Luís XVIII. A volta dos Bourbons trouxe consigo o temor de um retorno ao Antigo Regime, com a possível restauração de privilégios da nobreza e do clero, e a perda das terras adquiridas durante a Revolução. A política de esquecimento dos anos de glória napoleônica e a tentativa de apagar símbolos imperiais irritaram muitos franceses que haviam se beneficiado das mudanças revolucionárias.

A lealdade dos veteranos militares foi fundamental. Milhares de soldados e oficiais napoleônicos, muitos dos quais haviam sido marginalizados ou rebaixados pelo regime Bourbon, sentiam uma profunda ligação pessoal com Napoleão. Eles o viam como o “Pequeno Cabo” que os liderara à vitória e que compreendia suas necessidades e aspirações. A simples aparição de Napoleão nos campos de batalha provocava uma onda de entusiasmo e deserções em massa das tropas reais para seu lado.

A propaganda napoleônica, habilmente utilizada por seus partidários, desempenhou um papel significativo. Mensagens espalhavam-se rapidamente, pintando Napoleão como o libertador da França de um rei fraco e subserviente às potências estrangeiras. Ele prometia paz e prosperidade, e um governo que respeitasse os princípios revolucionários, em contraste com a percepção de uma monarquia retrógrada e isolada do povo.

A memória das vitórias napoleônicas também impulsionava o apoio. Para muitos franceses, o Império representava um período de grandeza nacional e de hegemonia europeia, que contrastava com a humilhação da ocupação estrangeira e as condições do Tratado de Paris de 1814. A imagem de Napoleão como um líder forte e decisivo apelava a um desejo de restauração da dignidade francesa e de um renascimento do orgulho pátrio.

O próprio carisma de Napoleão e sua capacidade de se conectar com as tropas e o povo eram inigualáveis. Sua presença era magnética; ele falava diretamente aos soldados, relembrando suas campanhas gloriosas e prometendo um futuro de respeito e reconhecimento. A simplicidade de sua abordagem e sua fama de gênio militar inspiravam confiança e uma lealdade quase religiosa em seus seguidores.

A fraqueza e impopularidade da monarquia Bourbon de Luís XVIII facilitaram enormemente o caminho de Napoleão. O rei, idoso e sem carisma, não conseguiu inspirar a mesma lealdade que Napoleão. A administração Bourbon, vista como ineficaz e favorável aos interesses da velha aristocracia, carecia de uma base de apoio sólida. Assim, o caminho estava pavimentado para o retorno de um líder que, apesar de suas derrotas anteriores, ainda representava para muitos a verdadeira alma da França.

Quais foram as principais medidas políticas e militares tomadas por Napoleão nos Cem Dias?

Ao reassumir o poder, Napoleão Bonaparte nos Cem Dias não podia simplesmente replicar o regime autoritário que o precedera. Ele compreendia a necessidade de acalmar as apreensões internas e de apresentar uma imagem mais conciliatória à Europa, embora essa última fosse uma tarefa quase impossível. Suas medidas foram, portanto, uma combinação de pragmatismo político e uma urgente preparação militar para o confronto inevitável.

No campo político, Napoleão procurou consolidar o apoio dos liberais e constitucionalistas, que haviam sido marginalizados sob a Restauração e que representavam uma força significativa na sociedade francesa. Ele convocou Benjamin Constant, um proeminente liberal, para redigir o Ato Adicional às Constituições do Império. Este ato, promulgado em 22 de abril de 1815, era uma tentativa de liberalizar o regime, estabelecendo um sistema parlamentar bicameral, garantindo maiores liberdades de imprensa e de religião, e assegurando os direitos individuais.

Essa virada constitucional, embora vista com ceticismo por muitos contemporâneos, representava um esforço genuíno de Napoleão para se alinhar com as aspirações liberais e para demonstrar que seu governo seria diferente do Império anterior. Ele também buscou reconciliar-se com a nobreza e a Igreja, oferecendo anistias e buscando garantir que as propriedades não seriam confiscadas. Essas medidas visavam construir uma base mais ampla de apoio e minar a oposição interna, que ainda era considerável em certas regiões.

Militarmente, a prioridade máxima de Napoleão era reconstruir e reequipar o exército francês, severamente enfraquecido e desorganizado após a abdicação de 1814. Ele emitiu decretos para a mobilização de conscritos e o chamado de veteranos, incluindo aqueles que haviam sido dispensados pelos Bourbons. Em questão de semanas, ele conseguiu reunir um exército impressionante, conhecido como Exército do Norte, composto por cerca de 125.000 homens, muitos deles experientes e leais.

A organização logística para rearmar, uniformizar e treinar essas novas levas de soldados foi um desafio monumental. Indústrias de armamentos e munições foram colocadas em produção acelerada, e os arsenais de guerra foram esvaziados para equipar as tropas. A capacidade administrativa de Napoleão e de seus generais em mobilizar recursos em tão pouco tempo demonstrava a eficiência da máquina de guerra imperial.

Além da mobilização do Exército do Norte, outras forças foram organizadas para defender as fronteiras da França contra as potências aliadas que se preparavam para invadir o país por múltiplas direções. Exércitos de observação foram posicionados nas regiões leste e sul, enquanto a Guarda Nacional foi reativada para manter a ordem interna e auxiliar na defesa local. A estratégia defensiva era vital enquanto o exército principal se preparava para a ofensiva.

A estratégia geral de Napoleão era atacar preventivamente os exércitos aliados na Bélgica – o britânico-neerlandês de Wellington e o prussiano de Blücher – antes que pudessem se unir às forças austríacas e russas. Esta abordagem ofensiva visava explorar a separação inicial das forças inimigas, derrotando-as em detalhe e, assim, talvez forçando uma negociação de paz mais favorável, ou pelo menos ganhando tempo para fortalecer ainda mais sua posição na França.

As decisões de Napoleão durante os Cem Dias refletiram sua urgência em agir e sua adaptabilidade às novas realidades políticas. Ele tentou equilibrar a necessidade de apoio interno com a inevitabilidade do confronto externo, procurando legitimar seu governo através de reformas constitucionais ao mesmo tempo em que preparava o país para uma guerra em larga escala. A pressão do tempo e a magnitude da ameaça externa moldaram cada uma de suas escolhas, transformando o período em uma corrida contra o relógio e os exércitos da Europa.

Como a Sétima Coalizão se formou e quais eram seus objetivos?

A formação da Sétima Coalizão foi uma resposta imediata e contundente ao retorno de Napoleão Bonaparte de Elba, demonstrando a determinação unânime das potências europeias em impedir seu retorno ao poder. Os líderes reunidos no Congresso de Viena, que já estavam em negociações complexas sobre a reconfiguração do continente, rapidamente deixaram de lado suas divergências para enfrentar o inimigo comum que novamente ameaçava a paz e a estabilidade.

A declaração de 13 de março de 1815, emitida pelo Congresso de Viena, serviu como o ato fundacional da Coalizão. Nela, as potências signatárias — Áustria, Grã-Bretanha, Prússia e Rússia, juntamente com várias outras nações menores — declararam Napoleão Bonaparte como um “inimigo e perturbador da tranquilidade do mundo” e se comprometeram a restaurar a ordem legítima na França, ou seja, a monarquia Bourbon de Luís XVIII. Essa declaração era, em essência, uma declaração de guerra contra o imperador.

Os objetivos da Sétima Coalizão eram claros e inegociáveis: a derrubada final de Napoleão Bonaparte e a garantia de uma paz duradoura na Europa. Eles não estavam dispostos a aceitar qualquer forma de governo napoleônico, mesmo que constitucional, pois o viam como uma fonte intrínseca de instabilidade e expansionismo. A prioridade máxima era esmagar militarmente o Império redivivo e eliminar de vez a possibilidade de seu retorno ao cenário político.

Para alcançar esses objetivos, os Aliados concordaram em mobilizar forças militares de uma escala sem precedentes. O Tratado de Viena, assinado em 25 de março de 1815, formalizou os compromissos militares, com cada uma das quatro grandes potências prometendo contribuir com 150.000 homens para a causa comum. A Grã-Bretanha também se comprometeu a fornecer subsídios financeiros substanciais para as demais nações, dada sua capacidade econômica e a ausência de um grande exército de terra.

As principais forças de ataque foram rapidamente concentradas nas fronteiras da França. O exército britânico-neerlandês, sob o comando do Duque de Wellington, e o exército prussiano, liderado pelo Marechal Blücher, foram posicionados na Bélgica, prontos para avançar sobre Paris. Enquanto isso, os exércitos austríacos e russos, embora mais lentos para mobilizar, estavam se preparando para invadir a França a partir do leste, criando uma ameaça multidirecional.

A estratégia da Coalizão era coordenada e abrangente. Eles planejavam uma invasão maciça da França, com quatro exércitos principais convergindo simultaneamente para esmagar qualquer resistência. A intenção era não dar a Napoleão a chance de derrotá-los em detalhe, como ele frequentemente fazia. A pressão diplomática também era exercida para isolar a França e impedir que qualquer outra nação se aliasse ao imperador, assegurando uma frente unida contra ele.

O medo de Napoleão e a memória de suas conquistas anteriores superavam quaisquer divergências territoriais ou políticas que os Aliados pudessem ter. A Sétima Coalizão representava o consenso europeu de que a paz só seria possível com a total aniquilação do poder napoleônico. Este objetivo comum e inabalável impulsionou a rápida mobilização e a determinação que caracterizaram as ações da Coalizão nos meses seguintes.

Quais foram os movimentos militares estratégicos antes de Waterloo?

Antes da decisiva Batalha de Waterloo, os movimentos militares estratégicos de Napoleão e dos Aliados foram um complexo jogo de xadrez em larga escala, focado na Bélgica. A estratégia de Napoleão era ousada e arriscada: ele pretendia atacar os exércitos aliados – o de Wellington (britânico, neerlandês, hannoveriano, etc.) e o de Blücher (prussiano) – antes que pudessem se unir e apresentar uma força avassaladora. Seu objetivo era derrotá-los em detalhe e, assim, talvez evitar uma invasão maciça da França.

Napoleão concentrou seu Exército do Norte, com cerca de 125.000 homens, na fronteira franco-belga. Ele planejava um ataque surpresa através da fronteira, no ponto de junção dos dois exércitos aliados, que estavam dispersos em uma ampla linha de acantonamento. A ideia era penetrar entre eles, empurrando os prussianos para o leste e os britânicos para o oeste, impedindo qualquer coordenação ou apoio mútuo.

O movimento inicial de Napoleão começou na madrugada de 15 de junho de 1815. Ele avançou rapidamente em direção a Charleroi, pegando os Aliados desprevenidos. Essa manobra ousada visava assegurar as pontes sobre o rio Sambre e estabelecer uma cabeça de ponte. A velocidade da marcha francesa foi crucial para o sucesso da surpresa, pois os exércitos aliados ainda estavam em fase de concentração, o que lhes conferiu uma vantagem inicial vital.

Uma vez em Charleroi, Napoleão dividiu seu exército. Ele enviou o Marechal Ney com a ala esquerda (cerca de 45.000 homens) para o cruzamento estratégico de Quatre Bras, com a ordem de segurar as forças de Wellington. A ala direita e o corpo de reserva, sob seu próprio comando e do Marechal Grouchy (cerca de 80.000 homens), avançariam para o leste, em direção a Ligny, para atacar e destruir o exército prussiano de Blücher.

Wellington, inicialmente, foi cauteloso e lento em sua reação à invasão francesa. Ele tinha informações dispersas e não estava certo sobre a verdadeira intenção de Napoleão. Sua principal preocupação era proteger Bruxelas. Contudo, ao receber notícias mais precisas, ele enviou ordens para a concentração de suas tropas em Quatre Bras, um ponto vital que controlava as estradas para Bruxelas e a junção com os prussianos.

Blücher, por outro lado, reagiu com maior rapidez e decisão. Ele concentrou seu exército prussiano em Ligny, esperando enfrentar Napoleão ali e impedir que suas forças fossem separadas das de Wellington. A determinação de Blücher em oferecer combate em Ligny, apesar de algumas de suas tropas ainda estarem a caminho, demonstrou a vontade prussiana de engajar o inimigo e proteger a retaguarda de seus aliados britânicos.

Estes movimentos culminaram nas Batalhas de Ligny e Quatre Bras em 16 de junho. Em Ligny, Napoleão obteve uma vitória tática sobre os prussianos, embora não tenha conseguido aniquilá-los completamente. Em Quatre Bras, Ney falhou em expulsar Wellington, que conseguiu manter a posição. As decisões e os resultados dessas duas batalhas prepararam o palco para o confronto final e decisivo em Waterloo, que viria apenas dois dias depois, com a perseguição implacável de Grouchy aos prussianos em retirada, um movimento que se mostraria decisivo.

Como a Batalha de Ligny se desenrolou e qual foi sua importância?

A Batalha de Ligny, travada em 16 de junho de 1815, foi o primeiro grande confronto da Campanha dos Cem Dias na Bélgica e representou uma vitória tática importante para Napoleão. Seu objetivo era aniquilar o exército prussiano de Marechal Blücher, impedindo que este se unisse às forças de Wellington. A batalha ocorreu em uma área de vilas e terrenos ondulados, proporcionando um campo de batalha complexo para ambas as partes.

O exército prussiano, sob o comando do idoso e enérgico Blücher, contava com cerca de 84.000 homens e 224 canhões. Eles estavam posicionados em torno das vilas de Ligny e St. Amand, com um dispositivo defensivo que visava resistir ao avanço francês. A determinação prussiana em manter a posição era forte, pois Blücher ansiava por um confronto direto com Napoleão, a quem ele desprezava abertamente como um inimigo.

Napoleão, com aproximadamente 68.000 homens e 210 canhões, lançou seu ataque principal no início da tarde. Ele planejava um assalto frontal às posições prussianas, com o objetivo de fixá-las, enquanto um grande flanqueamento seria realizado pelo I Corpo de D’Erlon, que deveria atacar a retaguarda prussiana. A intensa pressão francesa concentrou-se nas vilas, que se tornaram o centro de combates ferozes e sangrentos corpo a corpo.

A batalha foi marcada pela brutalidade do combate e pela resistência obstinada dos prussianos. As vilas de Ligny, St. Amand e Sombreffe mudavam de mãos várias vezes ao longo do dia, com lutas desesperadas em cada rua e casa. A artilharia de ambos os lados causou enormes baixas, transformando o campo em um cenário de carnificina. A coragem dos soldados prussianos em defender cada palmo de terreno foi admirável.

Um momento crucial da batalha foi a controversa marcha e contramarcha do I Corpo de D’Erlon. Originalmente destinado a Ligny, ele foi desviado por ordens conflitantes para Quatre Bras, depois novamente para Ligny, sem participar significativamente em nenhuma das batalhas. Essa indecisão e confusão privaram Napoleão de uma força vital que poderia ter garantido uma vitória mais decisiva e talvez a aniquilação total do exército prussiano, um erro estratégico significativo.

Ao anoitecer, com a chegada de mais tropas e uma carga final da Guarda Imperial, as linhas prussianas começaram a ceder. Blücher, que havia liderado pessoalmente cargas de cavalaria e quase foi capturado, ordenou uma retirada geral, evitando o cerco completo. Embora Napoleão tenha conseguido empurrar os prussianos para fora do campo, ele não os destruiu, permitindo que se retirassem de forma relativamente organizada.

A importância de Ligny reside no fato de que, embora tenha sido uma vitória francesa, não foi a vitória decisiva que Napoleão esperava. Os prussianos, embora derrotados e com pesadas baixas, conseguiram retirar-se em uma direção que lhes permitiria, mais tarde, apoiar Wellington em Waterloo. A persistência de Blücher em manter a coesão de seu exército, apesar de sua idade e das dificuldades, provou ser um elemento vital para o curso futuro da campanha.

A Batalha de Ligny demonstrou a capacidade ofensiva de Napoleão e a ferocidade de seus soldados. Embora não tenha sido a aniquilação que ele buscava, a vitória francesa serviu para reforçar a moral de suas tropas e para manter a iniciativa estratégica. A resiliência prussiana em se reagrupar, no entanto, foi uma surpresa para Napoleão, cujos cálculos sobre a desmoralização do inimigo não se concretizaram como esperado, permitindo que uma ameaça persistente se mantivesse.

Qual foi o papel da Batalha de Quatre Bras na campanha?

A Batalha de Quatre Bras, travada simultaneamente com Ligny em 16 de junho de 1815, desempenhou um papel crucial na Campanha dos Cem Dias, embora seu resultado não tenha sido uma vitória clara para nenhum dos lados. Seu principal objetivo estratégico, para os franceses, era impedir a junção das forças de Wellington e Blücher, enquanto para os Aliados, era manter o controle de um vital cruzamento de estradas que conectava as posições prussianas e britânicas.

O Marechal Ney, comandante da ala esquerda francesa, tinha a missão de tomar Quatre Bras e manter Wellington ocupado, impedindo-o de enviar reforços a Blücher em Ligny. No entanto, a indecisão e a cautela de Ney, combinadas com uma série de ordens e contra-ordens confusas de Napoleão, impediram que ele lançasse um ataque decisivo nas primeiras horas da batalha, perdendo uma oportunidade de ouro contra um Wellington ainda em fase de concentração.

Quatre Bras era um cruzamento estratégico de grande importância, pois controlava as estradas principais que ligavam a Bruxelas e, crucialmente, Ligny. O exército de Wellington, composto por britânicos, neerlandeses, hannoverianos, e outros, estava disperso e só começou a se concentrar no local à medida que a batalha se desenrolava. A capacidade de Wellington de mover suas tropas e fortalecer sua posição foi vital para o resultado da escaramuça.

A batalha começou com os primeiros ataques franceses, liderados pela cavalaria e infantaria de Ney, que enfrentaram as posições avançadas das tropas neerlandesas-belgas. Os combates foram intensos, com disputas acirradas por bosques e campos de trigo. A chegada gradual dos experientes soldados britânicos, incluindo a lendária Divisão da Guarda, reforçou as linhas aliadas e estabilizou a defesa.

Um dos momentos mais dramáticos da batalha foi a carga da cavalaria francesa contra as praças de infantaria britânicas. Apesar de algumas incursões perigosas, a disciplina e a formação em quadrado da infantaria britânica, juntamente com a artilharia, conseguiram repelir as investidas francesas, causando pesadas baixas entre os cavaleiros de Ney. A resiliência britânica na defesa foi um fator decisivo para a manutenção da posição.

A controvérsia do I Corpo de D’Erlon também se manifestou em Quatre Bras. Enquanto Ney esperava sua chegada para desferir um golpe decisivo, o corpo foi redirecionado para Ligny, e depois de volta, sem participar significativamente de nenhuma das batalhas. Essa ausência de reforços impediu Ney de obter uma vitória clara, embora ele tenha pressionado fortemente as forças de Wellington durante todo o dia.

O resultado da Batalha de Quatre Bras foi um empate tático. Embora os franceses não tenham conseguido tomar o cruzamento, eles impediram Wellington de enviar ajuda significativa a Blücher em Ligny. No entanto, o fato de Wellington ter conseguido manter sua posição e impedir a junção das forças francesas foi um sucesso estratégico para os Aliados. Isso permitiu que o Duque de Wellington se retirasse em ordem para uma posição defensiva mais forte em Waterloo no dia seguinte, mantendo sua capacidade de manobra e preparação para o confronto final.

Como as forças se posicionaram para a decisiva Batalha de Waterloo?

Após as batalhas de Ligny e Quatre Bras, as forças se reposicionaram para o confronto final e decisivo em Waterloo, um movimento que foi meticulosamente planejado por Wellington e ditado pelas circunstâncias para Napoleão. A escolha do campo de batalha foi um ato estratégico chave, influenciando diretamente o desenrolar dos eventos no dia seguinte. Ambas as partes buscaram as melhores posições para seus exércitos.

Wellington, após manter sua posição em Quatre Bras, recuou suas forças em uma retirada ordenada para uma posição defensiva pré-selecionada ao sul da vila de Waterloo. Ele já havia inspecionado esta área em 1814 e reconheceu seu potencial defensivo. A posição de Wellington estendia-se por uma crista natural, oferecendo uma linha defensiva forte, com a retaguarda protegida por florestas e vales, proporcionando uma vantagem tática crucial.

A linha defensiva de Wellington era formada por uma série de elevações e depressões, que permitiam que suas tropas ficassem parcialmente ocultas do fogo de artilharia francês. Três pontos fortificados desempenhariam um papel vital na defesa: a fazenda de Hougoumont à direita, La Haye Sainte no centro e La Papelotte à esquerda. Essas construções rurais, transformadas em fortalezas improvisadas, seriam centros de combates ferozes ao longo do dia.

O exército de Wellington era uma força multinacional de aproximadamente 68.000 homens e 156 canhões, composta por britânicos, neerlandeses, belgas, hannoverianos, brunswickers e tropas do Reino de Nassau. Embora não fossem todos veteranos, a disciplina britânica e a liderança de Wellington seriam postas à prova contra o exército de Napoleão, em uma defesa caracterizada pela paciência e resistência.

Napoleão, por sua vez, moveu seu Exército do Norte, com cerca de 72.000 homens e 252 canhões, para o norte de Quatre Bras, em perseguição a Wellington. A chuva torrencial na noite de 17 de junho e na manhã de 18 de junho atrasou o avanço francês, transformando o campo de batalha em um terreno lamacento. Esta condição afetaria a mobilidade da artilharia e da cavalaria, e atrasaria o início da batalha, um erro tático forçado pela natureza.

A estratégia de Napoleão era desdobrar seu exército em frente às posições de Wellington, com o objetivo de lançar um ataque frontal massivo, quebrar as linhas aliadas e empurrá-las para fora da crista. Ele posicionou sua infantaria em colunas, apoiadas por uma poderosa artilharia e sua temida cavalaria, incluindo a Guarda Imperial. O imperador acreditava que a qualidade superior de suas tropas e seu gênio tático seriam suficientes para garantir a vitória.

Enquanto isso, o Marechal Grouchy, com cerca de 33.000 homens, foi destacado por Napoleão para perseguir os prussianos em retirada após Ligny. A ordem era impedir que Blücher se reagrupasse e se unisse a Wellington. A precisão e a eficácia da perseguição de Grouchy seriam um fator determinante para o destino de Waterloo, pois a ausência de suas tropas no campo de batalha principal se mostraria catastrófica para os planos franceses.

Os posicionamentos em Waterloo refletiram as intenções estratégicas de ambos os comandantes. Wellington buscou a vantagem defensiva, contando com a solidez de suas posições e a chegada de reforços prussianos. Napoleão, confiante em seu poder ofensivo, preparou-se para um ataque decisivo que selaria seu retorno ao poder. O palco estava montado para um dos mais emblemáticos confrontos da história militar, onde cada movimento tático e a capacidade de resistência seriam testados ao limite.

Quais foram os momentos cruciais e as reviravoltas em Waterloo?

A Batalha de Waterloo, travada em 18 de junho de 1815, foi um dia de combates brutais e reviravoltas dramáticas, onde o destino da Europa pendeu na balança. Desde os primeiros disparos até o colapso final, a batalha foi uma sucessão de ataques maciços, defesas obstinadas e a chegada inesperada de reforços, tudo sob condições climáticas adversas que transformaram o campo em um lamaçal.

O início da batalha foi atrasado por Napoleão, aguardando que o terreno lamacento secasse um pouco para permitir o movimento mais eficaz da artilharia e da cavalaria. Por volta das 11h30, o primeiro ataque francês foi lançado contra Hougoumont, a fazenda fortificada à direita de Wellington. Este ataque, embora secundário, consumiu enormes recursos e tropas francesas ao longo do dia, desviando-os do centro principal, um erro estratégico para Napoleão.

O grande ataque de infantaria francês ao centro de Wellington começou por volta da 1h30 da tarde, com o I Corpo de D’Erlon. As colunas densas avançaram contra as linhas aliadas, mas foram recebidas com salvas devastadoras da infantaria britânica e uma carga esmagadora da Cavalaria Pesada Britânica (Scots Greys, Life Guards, etc.), que causou grande confusão e pesadas baixas entre os franceses, um momento de virada inicial.

Uma das reviravoltas mais notáveis foi a chegada dos prussianos. Apesar da derrota em Ligny, o Marechal Blücher, com sua energia indomável, conseguiu reagrupar suas forças e marchar em direção a Waterloo, cumprindo sua promessa a Wellington. Suas vanguardas começaram a aparecer no flanco direito francês (em Plancenoit) por volta das 16h30, forçando Napoleão a desviar tropas importantes para conter essa nova e inesperada ameaça.

No meio da tarde, o Marechal Ney, agindo de forma independente, lançou uma série de cargas massivas de cavalaria contra o centro-direita de Wellington. Milhares de cavaleiros franceses atacaram repetidamente as praças de infantaria aliadas. Embora a cavalaria tenha causado pânico e obrigou as tropas a se formarem em quadrados defensivos, eles falharam em romper as linhas, exaurindo-se e sendo massacrados pela artilharia e pelos fuzis britânicos. A disciplina dos quadrados foi exemplar.

A luta por La Haye Sainte, a fazenda fortificada no centro da linha de Wellington, foi outro ponto crítico. Defendida por tropas do Rei da Legião Alemã, resistiu heroicamente até as 18h30, quando, sem munição, foi finalmente tomada pelos franceses. Essa captura abriu uma perigosa brecha no centro aliado, permitindo que a artilharia francesa se posicionasse mais perto e causasse maiores estragos nas linhas de Wellington.

O golpe final de Napoleão veio por volta das 19h30, com o ataque da Guarda Imperial, sua elite de veteranos invencíveis. Eles avançaram sob fogo intenso, mas foram repelidos pelas salvas concentradas das tropas britânicas e neerlandesas. A retirada da Guarda Imperial, o símbolo da invencibilidade napoleônica, causou um pânico generalizado nas linhas francesas, culminando no colapso total do exército e na vitória decisiva dos Aliados.

Waterloo foi uma batalha de constantes viravoltas, onde a resistência tenaz de Wellington e a chegada oportuna dos prussianos superaram o gênio ofensivo de Napoleão. Cada momento crucial, desde os ataques iniciais até a investida final da Guarda, sublinhou a fragilidade da sorte e a importância da coordenação e persistência no campo de batalha. O resultado, incerto por horas, foi finalmente selado pela determinação aliada e pelos erros napoleônicos.

Como a derrota em Waterloo selou o destino de Napoleão?

A derrota em Waterloo, em 18 de junho de 1815, selou de forma irreversível o destino de Napoleão Bonaparte e pôs um fim definitivo à sua era de dominação europeia. Foi uma derrota militar abrangente, não apenas um revés tático, que desmantelou seu exército e sua capacidade de resistência. A magnitude da perda e a presença esmagadora dos Aliados tornaram qualquer recuperação impossível.

Após a desintegração de seu exército no campo de Waterloo, Napoleão fugiu para Paris na esperança de reunir apoio político e militar para continuar a luta. Contudo, o entusiasmo de Cem Dias havia desaparecido. A Câmara dos Representantes e a Câmara dos Pares, antes hesitantes em se opor a ele, agora exigiam sua segunda abdicação, cansadas da guerra e temerosas de uma nova invasão e ocupação estrangeira.

As potências aliadas, por sua vez, não demonstraram qualquer tolerância ou vontade de negociar. Wellington e Blücher avançavam inexoravelmente em direção a Paris, determinados a eliminar de vez a ameaça napoleônica. A recusa categórica dos Aliados em reconhecer Napoleão ou em considerar qualquer acordo com ele significava que a única opção restante para a França era sua remoção completa do poder e o restabelecimento da ordem monárquica.

Confrontado com a perda de apoio político interno e a inevitabilidade da invasão estrangeira, Napoleão abdicou pela segunda vez em 22 de junho de 1815, apenas quatro dias após Waterloo. Desta vez, ele o fez em favor de seu filho, o “Rei de Roma”, Napoleão II, mas essa tentativa de estabelecer uma dinastia foi prontamente ignorada pelas potências vitoriosas, que tinham outros planos para o futuro da França.

Napoleão tentou fugir para os Estados Unidos, na esperança de um novo começo. Ele viajou para Rochefort, na costa atlântica francesa, na intenção de embarcar em um navio americano. No entanto, a presença da frota britânica, que bloqueava os portos, tornou essa fuga impossível. A marinha britânica, com sua vigilância implacável, garantiu que ele não tivesse para onde ir, um cerco eficaz por mar.

Sem opções, Napoleão tomou a decisão de se entregar aos britânicos, acreditando que eles seriam mais honrosos e talvez lhe concedessem um exílio mais confortável. Em 15 de julho de 1815, ele embarcou no HMS Bellerophon, entregando sua espada e sua pessoa ao Capitão Maitland. Esta entrega marcou o fim definitivo de sua liberdade e o início de seu cativeiro final.

As potências aliadas, temerosas de outro retorno espetacular como o de Elba, decidiram que Napoleão deveria ser exilado em um local remoto e inexpugnável. A escolha recaiu sobre a ilha de Santa Helena, no meio do Atlântico Sul, a milhares de quilômetros da Europa. Lá, ele passaria os últimos anos de sua vida sob vigilância constante, sem qualquer chance de influenciar os assuntos europeus. A distância e o isolamento selaram seu destino para sempre.

Quais foram as consequências imediatas da derrota napoleônica?

A derrota de Napoleão em Waterloo e sua subsequente abdicação e exílio tiveram consequências imediatas e profundas para a França e para o restante da Europa. O fim dos Cem Dias não foi apenas o encerramento de um breve mas intenso período de conflito, mas o ponto final para mais de duas décadas de guerras revolucionárias e napoleônicas que haviam transformado o continente. A urgência era reestabelecer a ordem.

Na França, a segunda Restauração Bourbon foi imposta pelas potências aliadas. Luís XVIII, que havia fugido de Paris antes da chegada de Napoleão, retornou ao trono, desta vez com um apoio militar estrangeiro muito mais explícito. Esta restauração foi acompanhada por uma retaliação política, conhecida como Terror Branco, onde monarquistas ultrarrealistas perseguiram e puniram bonapartistas e liberais, gerando um clima de vingança.

A ocupação da França pelos exércitos aliados foi outra consequência imediata. Paris foi ocupada e grande parte do território francês permaneceu sob controle estrangeiro por vários anos. Esta ocupação foi uma humilhação profunda para a nação e impôs um pesado fardo financeiro, com a França sendo obrigada a pagar grandes indenizações e a sustentar as tropas ocupantes. A soberania francesa foi seriamente comprometida.

O Segundo Tratado de Paris, assinado em 20 de novembro de 1815, foi significativamente mais punitivo para a França do que o primeiro, de 1814. A França perdeu territórios estratégicos que havia mantido, como Sarre e Savóia, e foi reduzida a suas fronteiras de 1790. Além das indenizações e da ocupação militar, a França foi obrigada a devolver obras de arte e tesouros culturais que haviam sido saqueados durante as guerras, um símbolo da humilhação nacional.

Para as potências aliadas, a derrota de Napoleão significou a eliminação da principal ameaça à sua segurança e à ordem monárquica. O Congresso de Viena, que havia sido interrompido pelo retorno de Napoleão, pôde agora concluir seus trabalhos com a certeza de que as decisões tomadas seriam implementadas sem o risco de um novo levante napoleônico. A estabilidade europeia parecia finalmente ao alcance.

A reconfiguração do mapa da Europa, que estava sendo finalizada em Viena, foi consolidada. A Alemanha foi reorganizada em uma Confederação Germânica liderada pela Áustria, e os Países Baixos foram unificados com a Bélgica. A Prússia e a Rússia expandiram seus territórios, e a Grã-Bretanha consolidou seu domínio marítimo e colonial. Essas mudanças visavam criar um equilíbrio de poder que impedisse futuras hegemonias.

A Santa Aliança, proposta pelo czar Alexandre I, foi formalizada logo após Waterloo, reunindo as monarquias da Áustria, Prússia e Rússia. Embora em grande parte simbólica, seu objetivo era manter a ordem cristã e monárquica, intervindo para suprimir movimentos liberais e nacionalistas. A Quádrupla Aliança (Grã-Bretanha, Áustria, Prússia, Rússia) também foi renovada, formando um sistema de segurança coletiva para deter futuras agressões francesas e preservar o status quo.

As consequências imediatas de Waterloo foram uma tentativa vigorosa de restauração da ordem pré-revolucionária e napoleônica. A França foi punida e contida, e as monarquias europeias buscaram estabelecer mecanismos para garantir a paz e suprimir qualquer ressurgimento de ideais revolucionários. O fim do pesadelo napoleônico, no entanto, não significava o fim das tensões subjacentes que haviam agitado o continente por décadas.

Como o Congresso de Viena foi influenciado pelos Cem Dias?

O Congresso de Viena, que já estava em andamento quando Napoleão escapou de Elba, foi profundamente influenciado e acelerado pelos Cem Dias. O retorno do imperador exilado injetou um sentimento de urgência e uma unidade renovada entre as potências aliadas, que antes estavam divididas por disputas territoriais e interesses particulares. A ameaça napoleônica serviu como um catalisador para a finalização de um acordo de paz duradouro.

Antes da fuga de Napoleão, as negociações em Viena estavam progredindo lentamente, marcadas por tensões significativas entre as grandes potências. A questão da Polônia e da Saxônia, em particular, havia quase levado a uma nova guerra entre a Prússia/Rússia de um lado e a Áustria/Grã-Bretanha/França (Bourbon) do outro. O retorno de Napoleão fez com que essas disputas fossem temporariamente postas de lado, unindo os Aliados contra um inimigo comum e maior.

A notícia da fuga e da rápida reconquista de Paris por Napoleão levou os delegados em Viena a emitir a já mencionada declaração de 13 de março de 1815, que o declarava um “fora da lei”. Essa declaração foi um ato de solidariedade e determinação, cimentando a formação da Sétima Coalizão e o compromisso de derrubar Napoleão mais uma vez. A ameaça iminente exigia uma ação unificada e decisiva.

A necessidade de conter Napoleão e evitar futuros retornos forçou os Aliados a serem mais severos e explícitos em seus termos para a França. Enquanto o Primeiro Tratado de Paris (1814) havia sido relativamente brando, o Segundo Tratado de Paris (1815), assinado após Waterloo, foi significativamente mais punitivo. A França foi reduzida às suas fronteiras de 1790, teve que pagar uma pesada indenização e aceitar uma ocupação militar por vários anos.

Os Cem Dias também reforçaram a filosofia conservadora que permeava o Congresso. O princípio da legitimidade monárquica, defendido por Metternich da Áustria e Talleyrand da França, ganhou ainda mais força. A experiência do retorno de Napoleão validou a ideia de que a restauração das dinastias tradicionais era a melhor garantia de estabilidade e que qualquer desvio dessa ordem levaria ao caos e à guerra.

A criação de “estados-tampão” ao redor da França, uma das estratégias-chave do Congresso para conter futuras agressões francesas, foi ainda mais consolidada e justificada pelos Cem Dias. A unificação dos Países Baixos e da Bélgica para formar o Reino Unido dos Países Baixos, o fortalecimento dos estados da Prússia e da Renânia, e a anexação de Gênova ao Piemonte-Sardenha visavam criar uma barreira mais robusta contra a França.

O período dos Cem Dias, embora breve, serviu como um último e poderoso lembrete do perigo que Napoleão representava e da necessidade de um sistema de segurança coletiva. Isso levou à renovação da Quádrupla Aliança e à formação da Santa Aliança, estabelecendo uma estrutura para a cooperação futura entre as potências para manter a paz e suprimir movimentos revolucionários. A experiência traumática do retorno de Napoleão cimentou o consenso pela ordem e pela estabilidade a qualquer custo.

• Unidade Renovada da Coalizão: As disputas territoriais foram temporariamente suspensas, e as potências se uniram contra a ameaça comum de Napoleão.
• Declaração de “Fora da Lei”: O Congresso declarou Napoleão inimigo da paz mundial, legitimando a guerra contra ele.
• Tratado de Paris (1815) Mais Punitivo: A França sofreu perdas territoriais e financeiras mais severas em comparação com o tratado de 1814.
• Reforço da Legitimidade Monárquica: A fuga de Napoleão validou a visão conservadora de que a restauração das dinastias era essencial para a estabilidade.
• Criação de Estados-Tampão Fortalecida: A necessidade de conter futuras agressões francesas foi reiterada, consolidando a criação de barreiras territoriais.
• Estabelecimento de um Sistema de Segurança Coletiva: A Quádrupla Aliança e a Santa Aliança foram renovadas e formadas para manter a paz e a ordem.

Quais foram os impactos a longo prazo dos Cem Dias na Europa e na França?

Os Cem Dias, apesar de sua curta duração, deixaram impactos a longo prazo significativos tanto na Europa quanto na França, moldando o cenário político e social nas décadas seguintes. O breve retorno de Napoleão e sua derrota final consolidaram a nova ordem estabelecida pelo Congresso de Viena, mas também deixaram um legado de instabilidade e aspirações não resolvidas que viriam à tona em movimentos futuros.

Na Europa, os Cem Dias reforçaram o princípio do equilíbrio de poder e a importância da cooperação entre as grandes potências para manter a paz. A experiência de mobilização rápida contra uma ameaça comum levou à consolidação do “Concerto da Europa”, um sistema de congressos e alianças (como a Quádrupla Aliança) que buscava resolver disputas através da diplomacia e, se necessário, da intervenção militar coletiva para suprimir revoluções e manter o status quo monárquico.

O evento também aprofundou a desconfiança das monarquias europeias em relação a qualquer ressurgimento de ideias liberais ou nacionalistas. O fato de Napoleão ter sido inicialmente recebido com entusiasmo na França e ter tentado um governo constitucional-liberal foi interpretado como prova de que a Revolução ainda era uma ameaça. Isso justificou as políticas reacionárias e a repressão de movimentos por reformas constitucionais e autodeterminação nacional em vários países.

Na França, os Cem Dias consolidaram o restabelecimento da monarquia Bourbon, mas também dividiram ainda mais a sociedade. A restauração foi vista por muitos como uma imposição estrangeira, e a memória de Napoleão, apesar de sua derrota, permaneceu viva como um símbolo de glória nacional e resistência ao absolutismo. Essa divisão entre bonapartistas, realistas e liberais continuaria a influenciar a política francesa por décadas, levando a novas revoluções em 1830 e 1848.

A questão do “Terror Branco” pós-Cem Dias deixou cicatrizes profundas na França, com a perseguição e execução de milhares de bonapartistas e liberais. Isso gerou um ressentimento duradouro em muitas famílias e comunidades, contribuindo para a polarização política e a instabilidade que caracterizariam o país durante o século XIX. A memória das represálias alimentaria futuros conflitos sociais e políticos.

O legado militar napoleônico, embora derrotado em Waterloo, continuou a influenciar a teoria e a prática da guerra. As táticas, a organização do exército e a liderança de Napoleão continuaram a ser estudadas e imitadas por gerações de militares em toda a Europa. A escala das guerras napoleônicas e a ideia de mobilização total de uma nação para a guerra transformaram permanentemente a natureza do conflito armado.

A figura de Napoleão, mesmo em derrota, adquiriu uma aura mítica. Os Cem Dias serviram para reforçar sua imagem como um líder indomável que, mesmo contra todas as probabilidades, ousou desafiar o poder estabelecido. Isso contribuiu para o culto à personalidade e o desenvolvimento de um “napoleonismo” que persistiria na França e em outras partes do mundo, inspirando futuros líderes e movimentos, e mantendo sua influência simbólica.

Os Cem Dias, com sua conclusão dramática em Waterloo, marcaram o fim de uma era, mas também o início de novas dinâmicas políticas. A Europa experimentaria um período de paz relativa, mas as sementes do nacionalismo e do liberalismo, que Napoleão havia involuntariamente espalhado, germinariam, levando a novos desafios à ordem estabelecida de Viena nas décadas vindouras, e a redefinição contínua das fronteiras e identidades nacionais.

Como os Cem Dias moldaram a lenda e o legado de Napoleão?

Os Cem Dias, embora um breve epílogo na extraordinária carreira de Napoleão, desempenharam um papel fundamental na moldagem de sua lenda e legado. Longe de diminuir sua estatura, a audácia de seu retorno de Elba e a dramaticidade de Waterloo, paradoxalmente, solidificaram sua imagem como um herói trágico, um gênio militar e um símbolo de resistência indomável contra o destino.

A fuga de Elba, por si só, foi um feito digno de epopeia. A capacidade de Napoleão de desembarcar na França com um punhado de homens e, em poucas semanas, sem disparar um tiro, retomar o trono, transformou-o em um ícone de resiliência e carisma. Essa narrativa de um “voo da águia”, onde o povo e o exército o aclamavam, alimentou a lenda de sua conexão mística com a nação e de sua invencibilidade política.

Waterloo, apesar de ser sua derrota final, não destruiu sua lenda; ao contrário, a elevou a um patamar mítico. A batalha foi retratada como um confronto titânico entre o gênio solitário e as forças combinadas da Europa. A narrativa de que Napoleão foi derrotado não por falta de habilidade, mas pela superioridade numérica esmagadora e pela traição do destino (como a chuva e a chegada dos prussianos), serviu para proteger sua reputação militar.

A perseguição e o exílio em Santa Helena, um local remoto e inóspito, contribuíram para a imagem de mártir. Napoleão soube explorar seu cativeiro para cultivar sua própria imagem, ditando suas memórias e lamentando as injustiças que sofreu. Isso transformou-o de tirano em vítima, um sofredor pela França, injustiçado pelas potências europeias. O Memorial de Santa Helena, compilado por Las Cases, tornou-se um texto fundamental para a construção de sua lenda póstuma.

A lenda napoleônica, impulsionada pelos Cem Dias, ressoou profundamente na França do século XIX. Para muitos, ele representava a glória da nação, o espírito da Revolução (embora em sua versão autoritária) e a promessa de um governo forte e estável. Em um período de instabilidade política e social, a nostalgia pelo Império e por sua figura forte cresceu, levando até mesmo à ascensão de seu sobrinho, Luís Napoleão Bonaparte, que se tornou Napoleão III.

O legado de Napoleão, que os Cem Dias cimentaram, transcendeu as fronteiras da França. Sua reforma legal (Código Napoleônico), sua reorganização administrativa e seu impacto na arte da guerra continuaram a influenciar a Europa e o mundo. A figura de Napoleão tornou-se um objeto de fascinação para historiadores, escritores, artistas e estrategistas militares, que debateram seu gênio e suas falhas, assegurando sua permanência na memória coletiva.

Assim, os Cem Dias, longe de serem um simples epílogo, foram a última e mais espetacular exibição do carisma e da ambição napoleônica. Eles não apenas puseram fim à sua carreira política, mas também solidificaram sua imagem como uma das figuras mais controversas e cativantes da história, um titã que desafiou o mundo e, mesmo na derrota, conseguiu construir um legado imortal. A dramaticidade de seu final foi parte integrante de sua lenda.

• A Audácia da Fuga de Elba: Criou a imagem de um líder destemido e com uma conexão quase mística com seu povo.
• A Batalha de Waterloo: Embora uma derrota, foi glorificada como um confronto épico, onde ele foi superado pela força esmagadora, não pela falha tática.
• O Exílio em Santa Helena: Transformou-o em um mártir, vítima das potências europeias, e permitiu a construção de sua própria narrativa.
• O Memorial de Santa Helena: Através das memórias ditadas, Napoleão moldou sua imagem para a posteridade, justificando suas ações e conquistas.
• Nostalgia e “Napoleonismo”: A lenda alimentou um desejo de retorno à glória imperial na França, influenciando a política do século XIX.
• Influência Militar e Legal: Suas reformas e táticas continuaram a ser estudadas e aplicadas, garantindo seu impacto duradouro além da política.

Que lições históricas podemos extrair dos Cem Dias?

Os Cem Dias de Napoleão oferecem uma rica tapeçaria de lições históricas, que transcendem o período em si e continuam a ressoar em estudos de estratégia, política e psicologia de liderança. Este breve e intenso episódio serve como um microcosmo das forças complexas que moldavam a Europa pós-Revolução Francesa e a persistência de ideais e ambições.

Uma das lições mais evidentes é a periculosidade de subestimar um adversário determinado. As potências aliadas, embora tivessem deposto Napoleão e o exilado em Elba, falharam em garantir que ele estivesse completamente neutralizado. A confiança excessiva na sua incapacidade de retornar, aliada à distância geográfica insuficiente do exílio, criou a oportunidade para o seu retorno espetacular, uma falha de inteligência e previsão.

Os Cem Dias demonstram também a volatilidade da lealdade popular e militar em tempos de incerteza política. O rápido colapso do regime Bourbon e a pronta adesão de soldados e civis a Napoleão revelam que a insatisfação interna pode ser um terreno fértil para o ressurgimento de líderes carismáticos, mesmo aqueles que haviam sido previamente derrotados. A legitimidade de um governo depende não apenas da força, mas também da sua capacidade de atender às aspirações do povo.

A importância da coordenação e da unidade em uma coalizão também é destacada. As potências aliadas, apesar de suas disputas internas no Congresso de Viena, conseguiram rapidamente superar suas diferenças e apresentar uma frente unida contra Napoleão. Essa capacidade de cooperação, mesmo diante de interesses divergentes, foi crucial para a derrota final de um inimigo formidável, um modelo para futuras alianças internacionais.

A campanha de Waterloo sublinha a importância da logística e da tomada de decisão em tempo real no campo de batalha. Os atrasos causados pela chuva, a confusão nas ordens para Ney e D’Erlon, e a incapacidade de Grouchy de conter os prussianos, foram fatores que, combinados com a resistência tenaz de Wellington e a chegada de Blücher, transformaram uma possível vitória francesa em uma derrota catastrófica. Pequenos erros podem ter consequências desastrosas.

Ainda, os Cem Dias revelam a natureza persistente da memória histórica e do culto à personalidade. Mesmo após suas derrotas, Napoleão manteve um forte apelo emocional para muitos franceses, simbolizando glória, estabilidade e a defesa dos princípios revolucionários. O episódio mostrou como uma figura histórica pode ser idealizada e mitificada, influenciando o imaginário popular e a política por gerações, um legado duradouro de influência carismática.

A resistência às mudanças e a tentativa de restaurar um passado que já não existia, como a Restauração Bourbon, são outra lição crucial. A incapacidade de Luís XVIII de adaptar-se totalmente às novas realidades sociais e políticas da França criou um terreno fértil para o descontentamento. Isso sugere que a estabilidade é alcançada não apenas pela força, mas também pela capacidade de um governo de reconhecer e integrar as aspirações de sua população.

Em última instância, os Cem Dias ensinam sobre os limites da ambição e a força do consenso internacional. Napoleão, em sua incessante busca por poder, subestimou a determinação das nações europeias em manter a paz, mesmo que isso significasse uma mobilização massiva e custosa. O evento selou a compreensão de que nenhuma nação, por mais poderosa que fosse, poderia dominar o continente sem provocar uma oposição unificada e esmagadora, uma demonstração da força da coesão.

Bibliografia

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