Intentona Integralista: o que foi, causas e impactos

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O que foi a Intentona Integralista?

A Intentona Integralista representa um dos episódios mais dramáticos da história política brasileira do século XX, marcando uma tentativa de golpe de Estado liderada pela Ação Integralista Brasileira (AIB). O evento, ocorrido na madrugada de 11 de maio de 1938, visava depor o presidente Getúlio Vargas e instaurar um regime integralista no Brasil. Embora fracassada, a Intentona revelou a tensão política e a fermentação ideológica que caracterizavam o período do Estado Novo, consolidando ainda mais o poder de Vargas e a repressão às oposições.

Os integralistas, adeptos de uma ideologia nacionalista radical e de inspiração fascista, acreditavam que a ação direta era o caminho para a tomada do poder, especialmente após a proibição das milícias partidárias e a crescente centralização autoritária de Vargas. A Intentona não foi um movimento espontâneo, mas o clímax de uma escalada de atritos entre o governo e a AIB, que havia se tornado uma força política de massa com milhões de simpatizantes em todo o país, ostentando uniformes, bandeiras e uma organização paramilitar.

Naquela noite fatídica, grupos de integralistas, em grande parte jovens e idealistas, munidos de armamento precário, cercaram o Palácio Guanabara, residência presidencial no Rio de Janeiro. A audácia da empreitada chocou a nação, pois esperavam que a população e até mesmo setores das Forças Armadas se unissem à insurreição, o que não ocorreu. A resistência dentro do palácio, liderada pela própria família Vargas e uma pequena guarda, foi mais forte do que o previsto pelos conspiradores, demonstrando a fragilidade do planejamento integralista.

O combate foi intenso e confuso, com tiroteios que duraram horas, espalhando pânico pela capital. A mobilização das forças leais ao governo, incluindo o Exército e a Polícia Militar, foi rápida e eficiente na resposta à tentativa de golpe. A superioridade numérica e de armamento das tropas governistas logo se impôs sobre os integralistas, que se viram isolados e sem apoio externo. A repressão subsequente foi severa, com prisões em massa e a desarticulação completa da liderança do movimento integralista em todo o território nacional.

A Intentona Integralista representou a ponta de um iceberg de descontentamento político e uma manifestação extrema da radicalização ideológica que permeava o Brasil dos anos 1930. O Integralismo, com seu discurso de combate ao comunismo, ao liberalismo e ao judaísmo, havia conquistado muitos adeptos, mas sua estratégia de tomada violenta do poder se mostrou desastrosa. A falha do golpe não apenas enterrou as ambições políticas da AIB, mas também serviu como um pretexto para o governo Vargas endurecer ainda mais as medidas autoritárias do Estado Novo.

A repercussão do evento foi imediata e generalizada, tanto no cenário nacional quanto internacional, expondo a fragilidade democrática do país e a força do regime varguista. A Intentona, embora um fracasso militar, se tornou um marco na consolidação do poder de Getúlio Vargas, que utilizou o episódio para justificar a repressão política e a perseguição a todas as formas de oposição, reforçando a narrativa de um governo forte e necessário para a manutenção da ordem e da unidade nacional.

A memória da Intentona é um lembrete vívido da complexidade política do Brasil em meados do século XX, revelando como as ideologias radicais podiam florescer em períodos de instabilidade social e buscar a ascensão ao poder por meios não democráticos. A tentativa de assalto ao Palácio Guanabara, embora um fracasso retumbante, permanece como um capítulo sombrio que ilustra os perigos da polarização e do extremismo na história política brasileira.

Quais foram as raízes do Integralismo Brasileiro?

O Integralismo Brasileiro não surgiu do vazio, mas como uma resposta complexa às crises econômicas, sociais e políticas que assolaram o Brasil e o mundo no início do século XX. A Grande Depressão de 1929, a eclosão da Revolução de 1930 e a instabilidade da Primeira República criaram um terreno fértil para o surgimento de movimentos que prometiam uma ordem nova e forte. A falência do modelo liberal-democrático e a ascensão de regimes totalitários na Europa influenciaram profundamente o pensamento de intelectuais e líderes brasileiros que buscavam alternativas.

As raízes intelectuais do Integralismo podem ser rastreadas em diversas correntes de pensamento, incluindo o nacionalismo romântico do século XIX, o positivismo com sua ênfase na ordem e no progresso, e o conservadorismo católico. Pensadores como Jackson de Figueiredo e Oliveira Viana já exploravam ideias de uma identidade nacional forte, hierarquia social e a necessidade de um Estado centralizado. A crítica ao liberalismo, ao comunismo e à maçonaria era um ponto comum entre esses intelectuais que viam na desagregação social e moral uma ameaça à nação.

A influência dos movimentos fascistas europeus, especialmente o Fascismo italiano de Benito Mussolini, foi inegável e fundamental para a formulação da doutrina integralista. Plínio Salgado, o fundador da Ação Integralista Brasileira, viajou pela Europa e observou de perto a organização e a propaganda desses regimes. Ele adaptou elementos como o culto ao líder, a disciplina paramilitar, a estética simbólica e o corporativismo para a realidade brasileira, forjando uma ideologia sincrética que ressoava com setores da sociedade brasileira que ansiavam por estabilidade.

O Integralismo se apresentou como uma terceira via entre o capitalismo liberal, que consideravam gerador de injustiças e desordem, e o comunismo, visto como uma ameaça à propriedade privada e às tradições nacionais. Sua proposta era uma sociedade orgânica, fundamentada na família, na pátria e em Deus, com uma estrutura corporativista que integraria trabalhadores e empregadores sob a égide de um Estado forte e centralizador. Essa visão atraiu militares, profissionais liberais, setores da classe média e pequenos proprietários rurais, desiludidos com a política tradicional.

A crise de representatividade e a fragilidade das instituições democráticas da Primeira República também contribuíram para o florescimento do Integralismo. A ausência de partidos políticos com bases ideológicas bem definidas e a dominação oligárquica do cenário político deixaram um vácuo que a AIB buscou preencher com sua estrutura hierárquica e mobilizadora. A promessa de uma nova política, purificada dos “vícios” da velha república, encontrou eco em uma população ávida por mudanças profundas e um senso de propósito coletivo.

O integralismo explorou habilmente o medo do comunismo, que se intensificou após a Intentona Comunista de 1935, apresentando-se como a barreira intransponível contra a “ameaça vermelha”. Essa estratégia de polarização ideológica permitiu que o movimento ganhasse apoio de setores conservadores e religiosos, que viam na AIB um baluarte contra o que consideravam a desintegração moral da sociedade. O anticomunismo virou um pilar central da sua propaganda, justificado a necessidade de uma ação enérgica e de um regime autoritário.

A profunda insatisfação com a corrupção política, a ineficiência administrativa e as disparidades sociais também alimentaram a base integralista, que prometia uma revolução moral e uma reorganização completa do Estado e da sociedade. O movimento soube canalizar o desencanto popular com a elite dominante, oferecendo uma visão utópica de um Brasil unido e poderoso, onde a ordem e a disciplina prevaleceriam sobre o caos e a anarquia, prometendo uma nova era de glória para a nação.

Quem foi Plínio Salgado e qual seu papel no Integralismo?

Plínio Salgado (1895-1975) foi a figura central e ideólogo-mor da Ação Integralista Brasileira, sendo o grande responsável pela formulação doutrinária e pela propagação do Integralismo no Brasil. Nascido em São Bento do Sapucaí, São Paulo, Salgado era um escritor prolífico, jornalista e intelectual que já gozava de certa notoriedade antes de fundar a AIB. Sua formação incluiu o contato com as correntes modernistas brasileiras, mas sua trajetória o levou a abraçar ideias conservadoras e nacionalistas, culminando na criação de um movimento de massa.

Antes de 1932, Plínio Salgado já demonstrava um profundo interesse por questões sociais e políticas, publicando artigos e livros que expressavam sua visão crítica do liberalismo e do materialismo. Ele foi um dos signatários do Manifesto da Poesia Pau-Brasil e participou da Semana de Arte Moderna de 1922, inicialmente ligado a ideias inovadoras. Contudo, sua busca por uma identidade nacional autêntica e por soluções para os problemas do país o afastou das vanguardas artísticas e o aproximou de pensadores que defendiam um Brasil mais tradicional e hierárquico.

A viagem de Plínio Salgado à Europa em 1930-1931 foi um divisor de águas em sua vida e para o futuro do Integralismo. Lá, ele teve contato direto com os regimes fascistas e nacionalistas, como o Fascismo italiano e o Nazismo alemão, que o impressionaram pela sua capacidade de mobilização e pela promessa de ordem e disciplina. Salgado não copiou cegamente esses modelos, mas os reinterpretou à luz da realidade brasileira, buscando uma síntese que fosse ao mesmo tempo moderna e enraizada nas tradições nacionais, embora com uma forte ênfase no autoritarismo.

Em 7 de outubro de 1932, Plínio Salgado fundou a Ação Integralista Brasileira (AIB) e lançou seu Manifesto de Outubro, que delineava os princípios do movimento. Ele se tornou o líder supremo, o “Chefe Nacional” ou “Guia”, centralizando o poder e a direção ideológica da organização. Sua capacidade oratória e de escrita foram cruciais para a propagação das ideias integralistas, com discursos inflamados e uma vasta produção de livros e artigos que formavam a doutrina do movimento, o que atraía muitos jovens idealistas.

O papel de Salgado não se limitava à elaboração teórica; ele era o estrategista político e o principal articulador da AIB. Ele supervisionava a criação de núcleos por todo o país, a organização das milícias paramilitares (os “camisas-verdes”) e a estrutura hierárquica que garantia a disciplina do movimento. Sua liderança carismática e a aura de intelectual visionário foram fundamentais para angariar milhões de seguidores, transformando a AIB em uma das maiores forças políticas do Brasil na década de 1930.

Apesar da sua proximidade ideológica com regimes autoritários, Plínio Salgado inicialmente tentou manter a AIB dentro de uma fachada legalista, participando das eleições de 1934 e 1937. No entanto, com a implantação do Estado Novo por Getúlio Vargas em 1937 e a consequente proibição dos partidos políticos, a estratégia de Salgado foi colocada à prova. Sua decisão de apoiar o golpe de Vargas e, logo depois, de se voltar contra ele na Intentona de 1938, revela uma fluidez tática e uma desesperada busca por poder.

O envolvimento de Plínio Salgado na Intentona Integralista de 1938, embora ele não estivesse presente na linha de frente dos combates, resultou em sua prisão e posterior exílio. Esse episódio marcou o fim da sua liderança ativa no Integralismo como um movimento de massa organizado. Apesar da dissolução da AIB, Salgado continuou a defender seus ideais, retornando à política anos depois e mantendo uma influência ideológica em alguns setores conservadores do Brasil, mesmo que de forma mais discreta e menos proeminente.

• Obras Doutrinárias Principais:
  • Manifesto de Outubro (1932): O documento fundador da AIB, delineando seus princípios e objetivos.
  • A Quarta Humanidade (1934): Uma visão filosófica e histórica do Integralismo como a próxima etapa da evolução social.
  • O Cavaleiro de Itararé (1933): Romance que aborda temas nacionais e sociais.
  • A Voz do Oeste (1937): Coleção de artigos e discursos que aprofundam a doutrina integralista.
• Principais Periódicos da AIB (sob direção de Plínio Salgado ou sua influência):
  • A Voz do Brasil: Principal órgão de imprensa do Integralismo, difundia a doutrina e notícias do movimento.
  • O Integralista: Outro jornal importante na propagação das ideias integralistas em nível nacional.
  • Acção: Publicação da Juventude Integralista.

Como se estruturava a Ação Integralista Brasileira (AIB)?

A Ação Integralista Brasileira (AIB) possuía uma estrutura organizacional altamente hierárquica e centralizada, espelhando modelos militares e fascistas da época. No topo da pirâmide estava o Chefe Nacional, Plínio Salgado, que detinha autoridade máxima e a palavra final em todas as decisões. Essa centralização do poder era fundamental para a disciplina e a coesão do movimento, permitindo que a doutrina integralista fosse difundida e implementada de maneira uniforme em todo o território nacional.

A AIB era dividida em departamentos específicos, cada um com suas responsabilidades bem definidas, o que assegurava a eficiência operacional. Havia, por exemplo, o Departamento de Doutrina e Cultura, responsável pela produção intelectual e pela propagação dos ideais integralistas através de publicações e conferências. O Departamento de Organização e Propaganda cuidava da expansão do movimento e da mobilização de novos membros, utilizando uma retórica persuasiva e símbolos fortes.

A base da organização eram os núcleos locais, chamados “Grupos de Ação”, que se formavam nas cidades e vilas. Cada Grupo de Ação era liderado por um Chefe de Grupo, que reportava aos chefes regionais e estaduais, criando uma rede capilarizada de influência. Esses núcleos eram responsáveis por recrutar novos membros, realizar reuniões, organizar desfiles e mobilizar a comunidade para as atividades integralistas, funcionando como as células fundamentais de propagação da ideologia.

Uma das características mais marcantes da AIB era a sua organização paramilitar, composta pelos famosos “camisas-verdes”. Esses membros uniformizados participavam de treinamentos físicos, desfiles e guardavam a ordem nos eventos integralistas, demonstrando a disciplina e a força do movimento. A existência dessas milícias gerava tensão com as forças policiais e outros grupos políticos, refletindo a natureza confrontacional que a AIB estava disposta a adotar na defesa de seus ideais.

Além da estrutura territorial, a AIB também possuía braços específicos para diferentes segmentos da sociedade. Existiam, por exemplo, a Ação Integralista Feminina, a Ação Integralista Estudantil e a Ação Integralista Operária, cada uma com programas e atividades adaptadas aos seus respectivos públicos. Essa diversificação estratégica permitia que o Integralismo alcançasse uma base de apoio ampla e multifacetada, permeando diversos estratos sociais e profissionais em busca de adeptos para a causa.

A hierarquia era visível nos uniformes e nos rituais. Os “camisas-verdes” usavam uniformes específicos, com distintivos que indicavam a patente, e praticavam uma série de saudações e cerimônias que reforçavam o senso de pertencimento e a disciplina coletiva. A saudação “Anauê”, o uso da letra grega “Sigma” como símbolo e os hinos integralistas eram elementos que contribuíam para a construção de uma identidade forte e coesa entre os membros, criando um verdadeiro culto ao movimento.

A disciplina interna e a fidelidade à liderança eram valores fundamentais na AIB. Os membros eram incentivados a uma vida de retidão moral, devoção à pátria e subordinação aos superiores, o que era visto como essencial para a construção de um Brasil novo e forte. Essa estrutura coesa e disciplinada, embora eficaz na mobilização, também a tornou um alvo fácil para a repressão governamental após a Intentona Integralista, levando à sua completa desarticulação.

• Símbolos Visuais:
  • Sigma (Σ): Letra grega que simbolizava a soma, a integração de todos os brasileiros em uma só nação. Era o símbolo principal, presente em bandeiras, distintivos e publicações.
  • Uniforme de Camisa-Verde: A vestimenta oficial dos militantes, simbolizando a disciplina, a natureza paramilitar e a unidade do movimento. Completado por calças brancas e gorro.
  • Bandeira Integralista: Verde, com um grande sigma branco no centro.
• Saudações e Expressões:
  • Anauê!: Saudação integralista, de origem tupi-guarani, que significa “Você é meu irmão!” ou “Eu te saúdo!”. Era utilizada em encontros, desfiles e na correspondência.
  • Deus, Pátria e Família: O tripé ideológico fundamental, sintetizando os valores morais e sociais do movimento.
  • O Integralista: Termo para designar os membros e adeptos da ideologia.

Quais eram os principais ideais e propostas do Integralismo?

Os ideais e propostas do Integralismo eram multifacetados, mas giravam em torno de um forte nacionalismo, autoritarismo estatal e a busca por uma sociedade orgânica, em oposição ao liberalismo, ao comunismo e ao capitalismo. O movimento defendia a supremacia da nação sobre o indivíduo, promovendo uma unidade cultural e espiritual que seria alcançada por meio da disciplina e da hierarquia. A ideia de “Deus, Pátria e Família” era o tripé fundamental de sua doutrina, resumindo seus princípios morais e sociais.

Um dos pilares ideológicos era o corporativismo, uma alternativa tanto ao capitalismo liberal quanto ao socialismo marxista. A AIB propunha a organização da sociedade em corporações de ofício, reunindo trabalhadores e empregadores do mesmo setor produtivo. Essas corporações, sob a supervisão do Estado, regulariam a economia e as relações de trabalho, buscando a harmonia social e a eliminação da luta de classes. O objetivo era criar um sistema que garantisse a produção e a justiça social sem os “males” da concorrência capitalista ou da revolução comunista.

O Integralismo defendia um Estado forte e centralizado, capaz de intervir em todos os aspectos da vida nacional. Esse Estado, livre das “amarras” dos partidos políticos e dos interesses particulares, seria o guardião da moral, da ordem e da unidade nacional. A democracia liberal era criticada por ser considerada fraca e corrupta, gerando divisões. Em seu lugar, propunham uma democracia orgânica, onde a representação se daria pelas corporações e não por partidos, eliminando o que viam como a anarquia parlamentar.

A religião católica ocupava um lugar de destaque na doutrina integralista, sendo vista como a base moral e espiritual da nação brasileira. Embora não fosse um movimento teocrático, o Integralismo pregava a defesa dos valores cristãos e o combate ao ateísmo e ao materialismo. Essa aproximação com a Igreja Católica ajudou a AIB a conquistar o apoio de setores conservadores e religiosos da sociedade, que viam no movimento uma barreira contra o laicismo e a secularização crescente.

O nacionalismo radical da AIB se manifestava na defesa intransigente da soberania brasileira e na valorização da cultura e das tradições do país. Eles pregavam a necessidade de uma educação patriótica, que enaltecesse os heróis nacionais e a história do Brasil, e uma política econômica que priorizasse os interesses nacionais em detrimento dos estrangeiros. O Integralismo sonhava com um Brasil potente e autossuficiente, capaz de se impor no cenário internacional e garantir seu próprio destino sem interferências externas.

A AIB também era ferozmente anticomunista e anti-liberal. O comunismo era visto como uma ideologia estrangeira e subversiva, que ameaçava a propriedade, a família e a religião. O liberalismo era criticado por sua ênfase no individualismo e por gerar desigualdades sociais e desordem política. O Integralismo se posicionava como a verdadeira alternativa a essas duas forças, prometendo uma revolução espiritual e política que restauraria a ordem e a grandeza da nação brasileira.

A proposta integralista incluía a reforma agrária, a nacionalização de setores estratégicos da economia, a proteção ao trabalhador e a criação de uma legislação social abrangente. Eles defendiam a ideia de que o Estado deveria ser o promotor do bem-estar social e da justiça, mas sempre dentro de um modelo hierárquico e autoritário, onde a liberdade individual estaria subordinada aos interesses coletivos da nação, garantindo a coesão social acima de tudo.

• Nacionalismo Radical: Defesa da soberania e da identidade brasileira, priorizando os interesses da nação.
• Corporativismo: Organização da sociedade em corporações de ofício, unindo capital e trabalho sob a égide do Estado para eliminar a luta de classes.
• Estado Forte e Autorreferente: Centralização do poder nas mãos do Estado, visto como guardião da ordem e da moral, sem partidarismo político.
• Valores Cristãos: Ênfase na moral católica como base da sociedade e da família, combate ao ateísmo e ao materialismo.
• Anticomunismo e Antiliberalismo: Oposição ferrenha a ambas as ideologias, consideradas inimigas da nação e da ordem social.
• Hierarquia e Disciplina: Valorização da ordem, da obediência e da subordinação aos superiores como fundamentos da sociedade.
• Revolução Espiritual e Moral: Busca por uma transformação profunda da sociedade, resgatando valores morais e cívicos para construir um Brasil novo e forte.

Qual era o contexto político-social do Brasil antes da Intentona?

O Brasil dos anos 1930 era um caldeirão de tensões políticas e sociais, um cenário fértil para o surgimento e a radicalização de movimentos como o Integralismo. A Revolução de 1930 havia encerrado a República Oligárquica, mas não trouxe a estabilidade esperada, inaugurando um período de profundas transformações e incertezas. A chegada de Getúlio Vargas ao poder abriu uma era de centralização política e crescente autoritarismo, que colidia com as aspirações de diversos grupos sociais e ideológicos em um cenário de ebulição.

A década foi marcada por uma intensa polarização ideológica. De um lado, crescia a influência de ideologias de esquerda, como o comunismo, impulsionado pela Internacional Comunista e pela insatisfação das massas com as condições de vida. A Intentona Comunista de 1935, embora rapidamente sufocada, gerou um medo generalizado do “perigo vermelho”, que foi amplamente explorado por setores conservadores e pelo próprio governo para justificar a repressão política e o fortalecimento do Estado.

Do outro lado do espectro, ganhavam força os movimentos de extrema-direita, inspirados pelos regimes fascistas e nazistas europeus. O Integralismo de Plínio Salgado, com sua retórica nacionalista, anticomunista e sua organização paramilitar, atraiu uma base considerável de apoio. A AIB se apresentava como a única alternativa viável para combater a “ameaça comunista” e restaurar a ordem e a moral em um país que, para eles, estava em processo de desagregação.

A economia brasileira enfrentava os impactos da Grande Depressão, que desorganizou o comércio internacional e afetou drasticamente a exportação de café, principal produto do país. A crise econômica gerou desemprego, empobrecimento e um aumento da insatisfação social, criando um ambiente propício para a busca por soluções radicais e a adesão a movimentos que prometiam resolver os problemas nacionais com mão de ferro. O cenário de instabilidade econômica amplificava as tensões já existentes.

No campo político, Vargas consolidava seu poder através de uma estratégia ambígua, ora acenando para a esquerda, ora para a direita, enquanto construía um Estado centralizador. Em 1937, Vargas utilizou o pretexto de um suposto “Plano Cohen” – um documento forjado que simulava um plano comunista de tomada de poder – para legitimar um golpe de Estado e instalar o Estado Novo, uma ditadura que suprimiu a Constituição de 1934, fechou o Congresso e proibiu os partidos políticos, incluindo a AIB.

A proibição dos partidos foi um golpe duro para o Integralismo, que vinha crescendo significativamente e tinha ambições de participação eleitoral, apesar de sua natureza. Plínio Salgado, que inicialmente apoiou o golpe de Vargas e, logo depois, viu-se traído. Essa desilusão e a repressão imposta pelo novo regime empurraram a AIB para a clandestinidade e para a radicalização, levando à decisão de tentar o golpe frustrado da Intentona Integralista como último recurso.

A sociedade brasileira estava dividida entre modernidade e tradição, urbanização e ruralidade, liberalismo e autoritarismo. A intensa propaganda ideológica, a violência política e a incerteza sobre o futuro marcavam o cotidiano. A Intentona Integralista, portanto, não foi um evento isolado, mas a culminância de anos de efervescência, polarização e conflito de ideologias que disputavam o caminho a ser seguido pelo Brasil em um período de profundas transformações e definições para a nação.

Como o Integralismo se relacionava com regimes totalitários europeus?

O Integralismo Brasileiro possuía uma relação intrínseca e complexa com os regimes totalitários europeus da época, especialmente o Fascismo italiano de Mussolini e o Nazismo alemão de Hitler. Essa relação não era de mera cópia, mas de inspiração e adaptação, com Plínio Salgado buscando elementos que pudessem ser “abrasileirados” para se adequar à realidade nacional. A ascensão desses regimes na Europa forneceu um modelo de organização e uma justificativa para a busca por um Estado forte e centralizador.

A principal fonte de inspiração para a AIB foi o Fascismo italiano. Plínio Salgado admirava a capacidade de mobilização do regime de Mussolini, sua retórica nacionalista, a ênfase na ordem e na disciplina, e o modelo corporativista de organização social e econômica. O uso de uniformes paramilitares (os camisas-verdes), as saudações coreografadas, os símbolos e a exaltação do líder (“Chefe Nacional”) eram claras referências às práticas fascistas que se consolidavam na Itália.

Embora menos diretamente, o Nazismo também influenciou o Integralismo, principalmente em seu anticomunismo virulento e em sua retórica de pureza nacional. A AIB, embora não fosse intrinsecamente racista em sua doutrina oficial como o Nazismo, compartilhava um sentimento de superioridade cultural e moral brasileira, defendendo uma identidade nacional unificada e a erradicação de influências “estrangeiras” consideradas nocivas. O antissemitismo, embora não explícito no programa, era presente em alguns setores e publicações.

A relação não era apenas ideológica, mas também passava pela busca de apoio externo. A AIB, assim como outros movimentos de direita na América Latina, mantinha contatos com as embaixadas e representantes dos regimes do Eixo. Havia uma expectativa de que esses países pudessem oferecer suporte financeiro ou político, dada a convergência de interesses em combater o comunismo e o liberalismo. Essa interconexão internacional sublinha a natureza global da polarização ideológica na década de 1930.

Apesar das semelhanças, Salgado insistia na originalidade e brasilidade do Integralismo, refutando as acusações de ser uma mera “cópia” do Fascismo. Ele argumentava que o Integralismo era uma doutrina autóctone, enraizada na história e nas tradições brasileiras, e que o uso de elementos similares era resultado de uma convergência natural de ideias em tempos de crise. A defesa da religião católica e a questão racial miscigenada do Brasil eram apresentadas como distinções cruciais em relação ao nazismo racista.

A comunhão de ideias e a admiração mútua, no entanto, não implicavam uma subordinação total. O Integralismo mantinha suas próprias prioridades nacionais e sua interpretação particular dos problemas brasileiros. A Intentona Integralista, por exemplo, foi uma ação decididamente brasileira, planejada e executada por líderes locais, embora inserida em um contexto maior de conflitos ideológicos globais. A natureza autoritária e antidemocrática, contudo, os colocava no mesmo eixo político-ideológico dos regimes europeus.

A ligação com os regimes totalitários europeus foi um fator determinante para a maneira como o Integralismo foi percebido e combatido no Brasil. Para seus oponentes, a AIB representava uma ameaça à democracia e à soberania nacional, alinhando-se a forças consideradas inimigas da liberdade. A derrota da Intentona e a posterior entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado dos Aliados contribuíram para o declínio definitivo da influência integralista no cenário político nacional, associando-os aos regimes derrotados e deslegitimando suas propostas.

Qual foi o papel do Estado Novo na ascensão e queda do Integralismo?

O Estado Novo, regime ditatorial instituído por Getúlio Vargas em 1937, desempenhou um papel ambivalente e decisivo tanto na ascensão quanto na queda do Integralismo. Inicialmente, o governo Vargas, em sua busca por uma base de apoio e na luta contra o comunismo, flertou com as ideias e com a própria força da AIB, utilizando-a como um contraponto à esquerda. Essa postura inicial permitiu que o Integralismo se desenvolvesse e ganhasse visibilidade e adesão em todo o país, consolidando-se como uma força política relevante.

A polarização ideológica do Brasil nos anos 1930, entre comunistas e fascistas, foi instrumentalizada por Vargas. Ele se apresentou como o garantidor da ordem e o mediador entre as extremidades, enquanto gradualmente concentrava o poder. O Integralismo, com sua disciplina e organização, era visto por Vargas como um aliado potencial na repressão à esquerda, e havia até mesmo rumores de um acordo entre Salgado e Vargas para a construção de um regime de “ordem”.

O golpe de 10 de novembro de 1937, que instaurou o Estado Novo, foi recebido com certa esperança por Plínio Salgado e pelos integralistas. Eles acreditavam que, com o fim da “democracia liberal” e a proibição dos partidos políticos, o novo regime adotaria um modelo de Estado forte e corporativista, semelhante ao que eles propunham. A AIB, paradoxalmente, havia apoiado o golpe, esperando ser a força política que seria cooptada pelo novo governo, um cálculo estratégico que se mostraria fatalmente equivocado.

A Constituição de 1937, imposta por Vargas, embora inspirada em modelos autoritários, não abraçou a ideologia integralista em sua plenitude. Pelo contrário, Vargas consolidou um regime autônomo, personalista e centralizador, que não tolerava a existência de milícias ou movimentos de massa que pudessem rivalizar com o poder do Estado. A proibição de todos os partidos políticos, incluindo a AIB, foi um duro golpe que desmantelou a estrutura legal e pública do Integralismo, levando-o à clandestinidade.

A virada na relação foi dramática. O Estado Novo, após se utilizar do Integralismo para combater outras oposições, agora via na AIB uma ameaça ao seu próprio monopólio de poder. Plínio Salgado, sentindo-se traído e marginalizado, decidiu que a única saída seria a confrontação direta. A Intentona Integralista de 1938 foi, portanto, uma reação desesperada à repressão e ao desmonte do movimento pela ditadura de Vargas, uma tentativa de retomar o protagonismo político à força.

A falha da Intentona Integralista foi o pretexto perfeito para o Estado Novo. Vargas utilizou o episódio para legitimar a repressão ainda maior, prendendo milhares de integralistas, desmantelando suas células e perseguindo suas lideranças. Plínio Salgado foi exilado, e o movimento, já fragilizado pela clandestinidade e pela surpresa do golpe de 1937, foi definitivamente esmagado. O Estado Novo emergiu da Intentona ainda mais forte e autoritário, eliminando seu último grande rival de direita e consolidando sua hegemonia.

A Intentona Integralista marcou o ponto final na trajetória do Integralismo como uma força política de massa no Brasil. O Estado Novo de Vargas, que havia inadvertidamente permitido seu crescimento, foi também o instrumento de sua aniquilação, demonstrando a intransigência do regime em tolerar qualquer competição por poder ou lealdade que não fosse diretamente para o próprio Estado, garantindo a supremacia do governo e a uniformidade ideológica imposta de cima para baixo.

Como se deu a proibição das milícias partidárias em 1937?

A proibição das milícias partidárias em 1937 foi uma medida crucial implementada por Getúlio Vargas no contexto da instalação do Estado Novo, visando desarmar e desarticular qualquer grupo que pudesse representar uma ameaça ao monopólio da força do Estado. Antes de 1937, a existência de milícias partidárias era uma característica comum da vida política brasileira, com grupos como os “camisas-verdes” integralistas e as milícias da Aliança Nacional Libertadora (ANL), de esquerda, operando com certa autonomia e promovendo confrontos de rua.

O cenário pré-Estado Novo era de intensa polarização e violência política. Os confrontos entre integralistas e comunistas, muitas vezes nas ruas das grandes cidades, eram comuns e sangrentos, gerando um clima de instabilidade e insegurança. Essas milícias representavam forças armadas privadas, leais a partidos ou ideologias, e não ao Estado, o que era visto por Vargas como um obstáculo à sua autoridade e à estabilização do regime que ele pretendia construir, justificando a necessidade de intervenção.

A Intentona Comunista de 1935 serviu como um pretexto poderoso para Vargas iniciar uma ofensiva contra as milícias de esquerda, culminando na perseguição e prisão de seus líderes. Essa repressão inicial abriu caminho para que, posteriormente, a medida fosse ampliada a todos os grupos armados, independentemente de sua orientação ideológica. O governo soube explorar o medo do caos social e da revolução para justificar a centralização da força nas mãos do Estado, apresentando a proibição como essencial para a ordem.

Com o golpe de 10 de novembro de 1937 e a promulgação da nova Constituição, o Estado Novo foi formalmente estabelecido. Uma das primeiras medidas do novo regime foi a dissolução de todos os partidos políticos e, consequentemente, a proibição de suas respectivas milícias. Essa decisão foi fundamentada na ideia de que a unidade nacional e a autoridade estatal deveriam prevalecer sobre os interesses partidários e as divisões ideológicas, que eram considerados fontes de desordem.

Para os integralistas, a proibição foi um duro golpe. Os “camisas-verdes” eram a expressão visível da força e da organização da AIB, parte intrínseca de sua identidade e estratégia. Com a medida, a AIB foi forçada à clandestinidade, e seus membros foram desarmados ou tiveram de ocultar suas armas. Essa ação desmantelou a capacidade de mobilização e de demonstração de poder do movimento, fragilizando sua estrutura e impulsionando a radicalização de setores que viam na resistência a única saída.

A proibição não foi um ato isolado, mas parte de uma estratégia mais ampla de Vargas para eliminar qualquer forma de oposição organizada e consolidar seu regime. A criação do Estado Novo dependia de um controle absoluto sobre a força e a vida pública. Ao banir as milícias e os partidos, Vargas eliminou os principais concorrentes à sua autoridade e garantiu que o poder emanasse exclusivamente do Executivo centralizado, sem rivalidades armadas ou políticas que pudessem ameaçar sua hegemonia.

Essa medida foi crucial para a Intentona Integralista de 1938. Ao se ver sem a possibilidade de atuação política legal e com sua força paramilitar proibida, os integralistas mais radicais optaram pela via da insurreição armada. A proibição das milícias, ao invés de pacificar completamente, canalizou a insatisfação e o desespero de grupos como a AIB para a clandestinidade e a confrontação direta com o regime, culminando na tentativa de golpe que selaria o destino do Integralismo como força política de massa.

Qual foi o estopim e o plano para a Intentona Integralista?

O estopim para a Intentona Integralista foi a profunda frustração dos líderes da Ação Integralista Brasileira com a traição percebida de Getúlio Vargas após a instauração do Estado Novo em 1937. Plínio Salgado e outros integralistas, que haviam inicialmente apoiado o golpe varguista na esperança de que ele abraçasse os ideais integralistas, viram-se marginalizados e proibidos, junto com todos os outros partidos políticos e milícias. Essa sensação de abandono e a repressão governamental impulsionaram os integralistas a uma ação desesperada.

Apesar da proibição, muitos integralistas se recusaram a aceitar o fim de seu movimento. A cúpula da AIB, incluindo Gustavo Barroso e outros diretores da AIB que se encontravam no Rio de Janeiro, passou a articular um plano de insurreição. A ideia central era aproveitar a suposta fragilidade do recém-instaurado Estado Novo e a ausência de Plínio Salgado do Rio de Janeiro (ele estava em São Paulo e depois no sul do país) para realizar uma tomada rápida e decisiva do poder. Acreditava-se que um ato ousado poderia desencadear uma revolta em cascata.

O plano consistia em um ataque simultâneo a pontos estratégicos no Rio de Janeiro, então capital federal. O objetivo principal era o Palácio Guanabara, residência de Getúlio Vargas, onde o próprio presidente e sua família se encontravam. Outros alvos incluíam o Quartel-General do Exército, o Departamento de Correios e Telégrafos e as emissoras de rádio, para que os integralistas pudessem anunciar a “vitória” e convocar a população e as forças armadas rebeldes a se unirem ao levante, uma estratégia arriscada e otimista.

Acreditava-se que a população se levantaria em apoio aos integralistas assim que a notícia do golpe se espalhasse, e que setores das Forças Armadas, simpatizantes do movimento, também se juntariam à insurreição. Essa avaliação otimista e equivocada sobre o apoio popular e militar foi um dos principais erros dos conspiradores. Eles subestimaram a capacidade de reação do Estado Novo e a lealdade das tropas a Vargas, o que se provaria fatal para a efetividade do plano.

O armamento dos integralistas era precário e insuficiente para uma operação militar de grande envergadura. Muitos contavam apenas com revólveres, facas e armas caseiras, enquanto as forças governistas possuíam fuzis, metralhadoras e a estrutura completa de um exército regular. A desvantagem em armamento e treinamento era colossal, evidenciando a natureza desesperada e mal planejada da Intentona, que se apoiava mais na audácia e no fervor ideológico do que na logística militar.

A data escolhida, 11 de maio de 1938, tinha um simbolismo estratégico: era o aniversário do levante anti-Vargas em São Paulo em 1932 (Revolução Constitucionalista), embora com um viés ideológico oposto. A ideia era que a surpresa da madrugada e a simultaneidade dos ataques pudessem confundir as defesas do governo e permitir a tomada dos objetivos antes que a resposta fosse organizada. O plano, embora audacioso, carecia de um aprofundado conhecimento da capacidade de reação do regime.

Os conspiradores agiram na clandestinidade, mas a vigilância do governo já estava ativa. Embora os detalhes específicos do plano pudessem ter escapado, a tensão era palpável. A Intentona foi um ato de extrema ousadia e, ao mesmo tempo, de desespero político, representando a última cartada de um movimento que, de gigante popular, se via transformado em grupo perseguido e sem voz no cenário político imposto pelo Estado Novo de Vargas.

Como os integralistas tentaram tomar o Palácio Guanabara?

A tentativa de tomar o Palácio Guanabara, residência oficial de Getúlio Vargas e ponto nevrálgico da Intentona Integralista, foi o episódio mais emblemático e dramático do levante. Na madrugada de 11 de maio de 1938, um grupo de integralistas armados, cerca de duzentos a trezentos homens, dirigiu-se ao palácio com o objetivo de capturar ou assassinar o presidente e sua família. A ação era vista como o passo decisivo para o sucesso do golpe e a instauração do regime integralista.

O ataque começou por volta das 2h da manhã. Os integralistas se aproximaram do palácio, divididos em grupos, e tentaram invadir pelos portões principais e por acessos secundários. A ideia era surpreender a guarda presidencial, que era pequena e composta por um destacamento da Polícia Militar e alguns civis, incluindo os próprios filhos de Vargas. Os assaltantes contavam com a rapidez e o elemento surpresa para dominar a situação antes que reforços chegassem.

A resistência dentro do Palácio Guanabara foi mais tenaz do que o esperado pelos integralistas. Getúlio Vargas, conhecido por sua frieza e coragem, organizou a defesa junto com sua família e a guarda. Sua filha, Alzira Vargas, desempenhou um papel notável, alertando as autoridades e auxiliando na defesa. Os poucos defensores se posicionaram estrategicamente, trocando tiros com os atacantes e impedindo a invasão total do edifício, transformando a residência em um verdadeiro campo de batalha.

O combate foi intenso e prolongado, com tiroteios que ecoavam pelas ruas do bairro de Laranjeiras. Os integralistas, embora numerosos, enfrentaram a resistência determinada dos defensores e a falta de coordenação entre seus próprios grupos. A ausência de armamento pesado e a experiência militar limitada de muitos dos insurgentes os colocaram em desvantagem contra a defesa improvisada, mas eficaz, do palácio, que demonstrou a resolução do presidente em não ceder.

Apesar das inúmeras tentativas de arrombamento dos portões e de escalada dos muros, os integralistas não conseguiram penetrar nas áreas internas do palácio onde a família Vargas se abrigava. A chegada de reforços da Polícia Militar e do Exército, alertados pela própria família presidencial, selou o destino dos atacantes. A superioridade numérica e de poder de fogo das tropas governistas logo se impôs, forçando os integralistas a recuarem e se dispersarem, encerrando a tentativa de tomada.

A falha na tomada do Palácio Guanabara foi o golpe mais fatal para a Intentona. Sem o presidente como refém ou morto, e sem o símbolo da vitória, o plano dos integralistas desmoronou. O episódio, que poderia ter sido um triunfo audacioso, transformou-se em um fracasso humilhante, evidenciando a desorganização e a subestimação do poder de Vargas por parte dos conspiradores. A resistência do palácio se tornou uma lenda, usada pela propaganda oficial para exaltar a bravura do presidente.

O rescaldo da batalha do Guanabara foi marcado por mortos e feridos de ambos os lados, e pela prisão de dezenas de integralistas que não conseguiram fugir. A tentativa de assalto ao palácio, embora fracassada, chocou a nação e expôs a radicalidade dos integralistas, fornecendo a Vargas o pretexto ideal para uma repressão implacável e a completa desarticulação do movimento, eliminando-o de vez do cenário político nacional.

Quais foram os principais confrontos e cenários da Intentona?

A Intentona Integralista não se restringiu apenas ao assalto ao Palácio Guanabara, embora este tenha sido o epicentro e o mais notório dos confrontos. A ação integralista de 11 de maio de 1938 visava a uma tomada coordenada de diversos pontos estratégicos no Rio de Janeiro, então capital federal, em uma tentativa de paralisar o governo e impor a ascensão integralista. Os confrontos, embora pontuais, foram violentos e dispersos pela cidade, caracterizando a natureza complexa do levante.

Além do Palácio Guanabara, outro alvo crucial era o Quartel-General do Exército, localizado no Campo de Santana. Os integralistas esperavam que a tomada do QG pudesse desencadear uma adesão de militares ao golpe, ou pelo menos neutralizar a capacidade de reação das forças armadas. No entanto, a tentativa de invasão foi rapidamente repelida pelas tropas leais ao governo, que já estavam em alerta máximo após os primeiros relatos dos ataques, frustrando os planos dos insurgentes de angariar apoio militar.

O Departamento de Correios e Telégrafos e as emissoras de rádio também estavam na mira dos conspiradores. A tomada desses pontos era essencial para a propaganda do golpe, permitindo que os integralistas anunciassem sua “vitória” e convocassem a população para a rebelião. A posse da comunicação seria vital para controlar a narrativa e desmoralizar o governo Vargas. No entanto, essas tentativas foram igualmente frustradas pelas forças de segurança que guardavam esses locais, impedindo a difusão da mensagem integralista.

Cenários como as proximidades da Praça Mauá e outros bairros adjacentes no centro da cidade também testemunharam pequenos focos de confronto. Grupos de integralistas, muitos deles jovens sem experiência militar, tentaram criar distúrbios ou realizar ações diversivas para desviar a atenção das forças policiais dos alvos principais. Essas ações, porém, eram descoordenadas e insuficientes para causar um impacto significativo na segurança da capital, sendo rapidamente controladas pelas patrulhas.

A dispersão dos atacantes após o fracasso no Palácio Guanabara e nos outros pontos levou a perseguições e prisões por toda a cidade. Muitos integralistas, sem um plano de fuga ou retaguarda, foram capturados nas ruas, em suas casas ou em locais de refúgio improvisados. A eficiência da resposta governamental na localização e prisão dos envolvidos demonstrou a eficácia da inteligência e da organização das forças de segurança do Estado Novo, que agiram com celeridade e determinação.

As ruas do Rio de Janeiro, especialmente as que circundavam o Palácio Guanabara e os arredores do Quartel-General, se tornaram os principais cenários da violência. O confronto direto, a troca de tiros e o clima de terror foram a tônica da madrugada. Embora não tenham sido batalhas de grande escala, a natureza urbana dos confrontos e a presença de civis nas imediações contribuíram para a repercussão e o impacto psicológico do evento na população carioca.

A rapidez com que o levante foi contido, contrastando com a ousadia da tentativa, demonstra a disparidade de forças e a falta de preparação efetiva dos integralistas. Os cenários da Intentona, embora representassem a ambiência física da luta, eram, em última análise, o palco para o fracasso de um movimento que apostou todas as suas fichas em um golpe mal planejado contra um regime que já havia consolidado seu poder de forma autoritária.

Quem eram os personagens-chave envolvidos na Intentona?

A Intentona Integralista envolveu uma série de personagens-chave, cada um desempenhando um papel fundamental no planejamento, execução ou na reação ao levante. No comando da Ação Integralista Brasileira, embora Plínio Salgado não estivesse fisicamente presente na hora dos confrontos, a liderança imediata foi assumida por figuras como Gustavo Barroso e outros diretores da AIB que se encontravam no Rio de Janeiro. Esses indivíduos eram os principais articuladores e mentores da conspiração.

Gustavo Barroso (1888-1959), um proeminente intelectual e escritor, era um dos mais fervorosos defensores do Integralismo e um dos principais líderes que planejaram e coordenaram a Intentona. Conhecido por suas posições ultranacionalistas e anticomunistas, Barroso foi um dos principais ideólogos do movimento, atuando na linha de frente da insurreição e sendo um dos poucos líderes a ser efetivamente preso no dia do golpe. Sua participação ativa evidenciava a natureza desesperada da tentativa.

Do lado do governo, a figura mais importante era, sem dúvida, o presidente Getúlio Vargas (1882-1954). Sua presença no Palácio Guanabara durante o ataque e sua ação decidida em organizar a defesa foram cruciais para a derrota dos integralistas. A calma e a frieza de Vargas, bem como a sua capacidade de mobilizar as forças leais, foram elementos determinantes que garantiram a integridade do palácio e, consequentemente, a manutenção do Estado Novo no poder.

A família de Getúlio Vargas também se destacou. Sua filha, Alzira Vargas do Amaral Peixoto (1911-1992), teve um papel ativo ao alertar as autoridades e ao participar da organização da defesa dentro do palácio, demonstrando coragem e perspicácia sob fogo. Sua atuação é frequentemente citada como um exemplo da resistência civil contra os integralistas e um símbolo da bravura da família presidencial em um momento de extrema vulnerabilidade.

Entre os militares e policiais que atuaram na defesa do governo, destacam-se nomes como o do Chefe de Polícia do Distrito Federal, Filinto Müller (1900-1973), que teve um papel fundamental na organização da repressão e na coordenação das forças leais. Müller, conhecido por sua rigidez e eficiência, liderou a resposta rápida contra os integralistas, garantindo a mobilização das tropas e a posterior perseguição e prisão dos envolvidos, consolidando sua posição de confiança no regime.

O corpo de defesa do Palácio Guanabara, embora pequeno, contava com policiais militares e civis que demonstraram grande bravura. O tenente Benedito Maia, por exemplo, é lembrado por sua ação na defesa do portão principal, resistindo bravamente aos atacantes. A lealdade e a prontidão desses homens da guarda foram essenciais para sustentar a resistência inicial até a chegada dos reforços do Exército, que selaram o destino dos integralistas na tentativa de assalto.

Finalmente, milhares de militantes integralistas, a maioria anônimos e idealistas, compunham a massa que realizou a Intentona. Muitos eram jovens de classe média, atraídos pela retórica nacionalista e pela promessa de um Brasil novo. A participação desses militantes de base, embora instrumentalizada pela liderança, demonstrava o poder de mobilização da AIB e a profundidade da polarização ideológica que permeava a sociedade brasileira da época, culminando nesse episódio violento.

Quais foram as consequências imediatas da Intentona para os integralistas?

As consequências imediatas da Intentona Integralista para os membros da Ação Integralista Brasileira foram devastadoras e implacáveis, marcando o fim de sua existência como uma força política de massa no Brasil. O fracasso do golpe resultou em uma repressão brutal e generalizada por parte do Estado Novo, que aproveitou a oportunidade para desarticular completamente o movimento e consolidar seu controle autoritário sobre o país. Milhares de integralistas foram perseguidos e presos em todo o território nacional.

A prisão de líderes proeminentes como Gustavo Barroso, que foi capturado em pleno confronto, e de centenas de militantes de base foi a primeira e mais visível consequência. As cadeias se encheram de integralistas, muitos dos quais eram jovens sem experiência política ou militar, movidos por um forte idealismo. Esses prisioneiros foram submetidos a interrogatórios e processos, sendo muitos deles condenados a longas penas de prisão ou enviados para campos de concentração, como o da Ilha Grande.

Plínio Salgado, o Chefe Nacional, embora não tivesse participado diretamente dos combates, foi detido e exilado em Portugal, retornando ao Brasil apenas anos depois e com a AIB já desmantelada. Seu exílio simbolizou o fim da liderança carismática e centralizada do Integralismo, removendo a figura que unia e inspirava o movimento. A dispersão da liderança foi um golpe fatal para a capacidade de organização da AIB, que já operava na clandestinidade.

A Ação Integralista Brasileira foi oficialmente dissolvida e suas atividades foram terminantemente proibidas. A infraestrutura do movimento – sedes, jornais, publicações – foi confiscada e desmantelada. A propaganda integralista foi censurada, e o uso de seus símbolos, como o sigma e o uniforme de camisa-verde, foi criminalizado. Essa repressão visava a apagar qualquer vestígio da presença integralista no cenário público, garantindo que não pudessem se reorganizar ou ressurgir em curto prazo.

Muitos integralistas, temendo a prisão e a perseguição, foram forçados à clandestinidade ou ao exílio. Outros tentaram se adaptar ao novo regime, buscando anistia ou se reintegrando à vida civil longe da política. O movimento, que havia sido uma força de massa com milhões de simpatizantes, foi reduzido a pequenos grupos dispersos e sem capacidade de articulação nacional, perdendo toda a sua influência e poder no cenário político brasileiro.

A derrota na Intentona Integralista também teve um profundo impacto psicológico nos integralistas. A desilusão com o fracasso, a traição de Vargas e a brutalidade da repressão abalaram a fé de muitos na doutrina e na viabilidade do movimento. O “sonho integralista” de um Brasil forte e orgânico foi quebrado, dando lugar a um sentimento de derrota e desespero, que muitos levaram consigo pelo resto da vida, marcados pela memória daquele 11 de maio de 1938.

A Intentona Integralista, portanto, não foi apenas uma tentativa de golpe; foi o suicídio político da AIB. O resultado imediato foi a sua completa desintegração como força organizada, com seus líderes presos ou exilados e suas bases desarticuladas e amedrontadas, pavimentando o caminho para a consolidação irrestrita do autoritarismo do Estado Novo de Getúlio Vargas.

Como a Intentona afetou a imagem pública de Plínio Salgado?

A Intentona Integralista teve um impacto devastador na imagem pública de Plínio Salgado, o Chefe Nacional da Ação Integralista Brasileira. Antes do levante, Salgado era visto como um intelectual respeitado, um líder carismático e um potencial futuro presidente do Brasil. A AIB, sob sua liderança, havia conquistado milhões de adeptos e representava uma força política legítima, que participava de eleições e mobilizava massas, apesar de sua ideologia autoritária.

O fracasso retumbante do golpe, no entanto, manchou sua imagem de líder estratégico e visionário. Embora Salgado não estivesse no Rio de Janeiro e não tivesse participado diretamente dos combates, a Intentona foi creditada à sua responsabilidade final como líder supremo. A narrativa oficial do Estado Novo o pintou como um conspirador irresponsável e um traidor, que tentou derrubar um governo que ele próprio havia inicialmente apoiado, deslegitimando suas ações.

A decisão de tentar um golpe armado após ter sido marginalizado por Vargas foi percebida por muitos como um ato de desespero ou ingenuidade. A imagem de Salgado passou de um líder nacionalista a um revolucionário fracassado, associado à violência e à desordem que o Integralismo prometia combater. A propaganda do Estado Novo explorou exaustivamente esse descredito, utilizando o evento para desmoralizar não só Salgado, mas todo o movimento integralista aos olhos da opinião pública.

Seu exílio em Portugal após a Intentona contribuiu para a deterioração de sua imagem. Longe do Brasil, ele perdeu a capacidade de influenciar diretamente os acontecimentos políticos e de se defender das acusações. A ausência do líder deixou a base integralista órfã e sem direção, facilitando a repressão e a desarticulação do movimento. O retorno anos depois não significou a retomada do prestígio anterior.

Para muitos, Plínio Salgado se tornou o símbolo de um movimento que, por sua radicalidade e intransigência, acabou por se auto-destruir. A imagem dos “camisas-verdes” atacando o Palácio Guanabara, e o relato da resistência de Vargas e sua família, solidificaram a percepção de que a Intentona havia sido um ato de barbárie contra a ordem estabelecida, e Salgado, como seu líder, carregava o ônus dessa percepção perante a nação.

Embora Plínio Salgado tenha tentado uma reabilitação política em anos posteriores, fundando o Partido de Representação Popular (PRP) e concorrendo à presidência, ele jamais recuperou o status e a influência que possuía antes de 1938. A Intentona Integralista permaneceu como uma mancha indelével em sua biografia política, limitando sua capacidade de reconectar-se com as massas e ser visto novamente como um líder de relevância nacional.

A Intentona cimentou a imagem de Plínio Salgado como uma figura controversa, para alguns um intelectual visionário, para outros um líder autoritário e fracassado. A historiografia, posteriormente, continuaria a discutir seu papel e as consequências de suas escolhas, mas o 11 de maio de 1938 certamente foi o ponto de virada negativo mais significativo em sua trajetória pública e política no Brasil.

De que forma a Intentona Integralista impactou o Estado Novo?

A Intentona Integralista, embora um fracasso para os conspiradores, teve um impacto paradoxalmente positivo para o Estado Novo de Getúlio Vargas, servindo como um catalisador para a consolidação e o endurecimento do regime. O evento forneceu a Vargas o pretexto ideal para justificar a repressão política e a eliminação de qualquer resquício de oposição organizada, fortalecendo sua narrativa de único garantidor da ordem e da estabilidade nacional.

O principal impacto foi a eliminação de um rival político significativo. O Integralismo, com sua base de massa e sua estrutura paramilitar, representava a última grande força de direita que poderia rivalizar com o poder de Vargas. Com a Intentona, Vargas teve a justificativa para desmantelar a AIB de forma completa, prendendo seus líderes, dissolvendo suas organizações e silenciando sua propaganda, garantindo que não haveria mais oposição organizada daquele flanco.

A Intentona também permitiu que o Estado Novo reforçasse sua legitimidade perante a opinião pública. A propaganda oficial explorou o ataque ao Palácio Guanabara como uma prova da necessidade de um governo forte e vigilante contra as forças da desordem. A imagem de Vargas defendendo sua família e a nação contra os “rebeldes” foi amplamente divulgada, cultivando a figura do líder providencial e consolidando o apoio de setores conservadores e da população que ansiavam por paz e segurança.

A repressão que se seguiu à Intentona foi implacável e seletiva, atingindo não apenas os integralistas, mas servindo como um alerta para qualquer outro grupo que ousasse desafiar a autoridade do Estado Novo. A eficiência na captura dos envolvidos e a severidade das penas demonstravam a Vargas a capacidade de controle sobre o aparato repressivo, encorajando-o a usar a força sempre que necessário para manter a ordem e o silêncio político.

O episódio reforçou o monopólio da força nas mãos do Estado. Ao proibir e desarmar todas as milícias partidárias, Vargas assegurou que apenas as forças militares e policiais do governo teriam o direito de portar armas e de exercer o poder coercitivo. Isso eliminou uma fonte constante de conflitos de rua e garantiu que qualquer oposição, no futuro, seria desprovida de meios para desafiar o regime pela via armada, fortalecendo o controle do Estado.

A Intentona Integralista permitiu a Vargas apertar ainda mais o controle sobre a sociedade. A censura foi intensificada, a vigilância sobre os cidadãos aumentou, e a retórica de “ordem e progresso” foi utilizada para justificar a supressão de liberdades individuais e a perseguição a qualquer forma de dissidência. O episódio serviu como um exemplo contundente do que aconteceria àqueles que tentassem desestabilizar o regime varguista.

A Intentona Integralista, ao invés de enfraquecer o Estado Novo, acabou por fortalecê-lo, proporcionando a Vargas os argumentos e os meios para se livrar de um rival incômodo e para consolidar uma ditadura que se estenderia por mais sete anos. Aquele 11 de maio de 1938 foi um divisor de águas, marcando não apenas a queda do Integralismo, mas a ascensão definitiva do poder autocrático de Getúlio Vargas no Brasil.

Qual foi o legado ideológico do Integralismo após 1938?

Após o fracasso da Intentona Integralista e a subsequente repressão do Estado Novo em 1938, o Integralismo como movimento de massa deixou de existir. No entanto, seu legado ideológico não desapareceu completamente, persistindo de formas mais difusas e, por vezes, ressignificadas, em certos setores da sociedade brasileira. As ideias integralistas, com seu nacionalismo radical, anticomunismo e apelo à ordem, continuaram a influenciar pensadores e grupos, mesmo na clandestinidade ou em novas roupagens.

Uma das influências mais notáveis foi o anticomunismo intransigente. A bandeira de combate ao comunismo, levantada pelos integralistas, foi amplamente assimilada pelo próprio Estado Novo e, posteriormente, por militares e setores conservadores que veriam na “ameaça vermelha” uma justificativa para golpes e regimes autoritários. O discurso integralista contribuiu para a formação de uma mentalidade que via o comunismo como o inimigo número um da nação, reverberando em momentos cruciais da história brasileira.

O nacionalismo integralista, com sua ênfase na soberania, na autossuficiência e na valorização da cultura brasileira, também encontrou ressonância em movimentos posteriores, embora nem sempre com a mesma conotação autoritária. Elementos como a defesa da indústria nacional, o controle estatal sobre setores estratégicos e o culto aos símbolos pátrios foram incorporados por diferentes espectros políticos, demonstrando a perenidade de certos temas nacionalistas na política brasileira.

A doutrina corporativista, embora nunca totalmente implementada no Brasil, exerceu uma influência teórica em algumas discussões sobre a organização do trabalho e da economia. Elementos do corporativismo podem ser identificados em legislações trabalhistas e na criação de sindicatos atrelados ao Estado durante o Estado Novo, embora o modelo varguista fosse mais pragmático e centralizador do que o idealizado pelos integralistas. A ideia de uma harmonia social sob o Estado forte persistiu.

A preocupação com a moral e a defesa da família e da religião católica, pilares do Integralismo, permaneceram como bandeiras de setores conservadores da sociedade brasileira. Embora o Integralismo como partido tenha desaparecido, seus valores tradicionais continuaram a ser defendidos por grupos que viam na degeneração moral uma ameaça à nação, influenciando debates sobre costumes e educação ao longo das décadas, mantendo uma presença sutil no imaginário político.

Plínio Salgado, após seu retorno do exílio, tentou reorganizar o movimento através do Partido de Representação Popular (PRP) em 1945, adaptando-o à nova realidade democrática do pós-guerra. Embora o PRP não tenha alcançado a mesma magnitude da AIB, ele manteve vivos alguns princípios integralistas, como o nacionalismo e o anticomunismo, servindo como um nicho para antigos membros e como um ponto de referência para novas gerações de ideólogos de direita no Brasil.

Assim, mesmo após a desarticulação forçada, a Intentona não significou o fim absoluto da influência integralista. As sementes ideológicas plantadas na década de 1930 continuaram a germinar, influenciando discursos políticos, movimentos conservadores e a interpretação da história brasileira, demonstrando que ideias, mesmo derrotadas no campo de batalha, podem ter uma vida longa e complexa no plano cultural e ideológico.

Como a historiografia brasileira aborda a Intentona Integralista?

A historiografia brasileira aborda a Intentona Integralista como um evento crucial e multifacetado da década de 1930, que reflete a profunda polarização ideológica e a ascensão do autoritarismo no país. Inicialmente, a narrativa oficial do Estado Novo tendeu a demonizar os integralistas e a exaltar a figura de Getúlio Vargas como o salvador da pátria contra a “subversão”. Essa visão inicial foi fundamental para legitimar a repressão e consolidar o regime ditatorial.

Com o fim do Estado Novo e a redemocratização, a partir da década de 1950, a historiografia começou a revisitar o tema com maior distanciamento crítico. Surgiram trabalhos que buscavam compreender as causas sociais e econômicas do Integralismo, analisando o perfil de seus membros e a atração de suas ideias em um Brasil em transformação. Essa fase buscou ir além da mera condenação ou exaltação, procurando contextualizar o fenômeno dentro da história política brasileira.

Nas décadas seguintes, com a influência de novas abordagens historiográficas, como a História Social e Cultural, a Intentona Integralista passou a ser analisada sob novas perspectivas. Houve um interesse em explorar as vivências dos militantes, a simbologia do movimento, as relações de poder e a construção das identidades. Estudou-se a fundo a retórica integralista, seus rituais, suas publicações e a forma como dialogavam com as correntes fascistas europeias.

A relação ambígua entre o Integralismo e o governo Vargas é um ponto central de debate na historiografia. Discute-se se Vargas se utilizou do Integralismo como instrumento contra a esquerda antes de descartá-lo, ou se a Intentona foi uma reação inevitável à sua própria política de centralização. A historiografia atual tende a reconhecer a complexidade dessa relação, mostrando como ambos os lados tentaram manipular o outro em um jogo de poder intrincado.

As consequências da Intentona para o Estado Novo também são amplamente exploradas, com consenso de que o evento foi um divisor de águas para a consolidação da ditadura. A falha do golpe integralista permitiu a Vargas legitimar a repressão e eliminar a última grande força de oposição organizada, fortalecendo o caráter autoritário e personalista de seu regime. A historiografia mostra como a Intentona foi um pretexto conveniente para o governo.

Recentemente, com o resurgimento de discursos e movimentos que guardam semelhanças com o Integralismo, a Intentona e a doutrina integralista voltaram a ser objeto de renovado interesse. Pesquisadores buscam entender as permanências e as rupturas, alertando para os riscos do extremismo político e da negação da democracia. Essa abordagem contemporânea enfatiza a importância de revisitar esses eventos para a compreensão do presente político brasileiro.

A historiografia da Intentona Integralista evoluiu de uma narrativa oficialista para uma análise crítica e multifacetada, que busca compreender o fenômeno em suas raízes, suas nuances e suas consequências duradouras para a política e a sociedade brasileira. Os estudos sobre o Integralismo e a Intentona continuam a contribuir para a reflexão sobre o autoritarismo, a polarização e os desafios da democracia no Brasil, sendo um campo de pesquisa sempre relevante.

Existem resquícios ou influências do Integralismo na política atual?

A Intentona Integralista e a subsequente repressão do Estado Novo em 1938 desmantelaram a Ação Integralista Brasileira como uma organização de massa. No entanto, a ideologia integralista, com suas raízes profundas no nacionalismo, no anticomunismo e no conservadorismo, não desapareceu completamente do cenário político brasileiro. Embora não existam movimentos integralistas com a mesma magnitude ou visibilidade da AIB original, é possível identificar resquícios e influências em alguns discursos e grupos políticos contemporâneos, por vezes de forma subtil ou reconfigurada.

Um dos traços mais persistentes é o anticomunismo ferrenho. A retórica de combate à “ameaça vermelha”, tão central ao Integralismo, ainda ecoa em certos discursos políticos da direita brasileira, especialmente em momentos de polarização ideológica. A simplificação da política em um embate entre o “bem” (nacionalismo, ordem) e o “mal” (comunismo, desordem) é uma herança que perdura, justificando por vezes medidas autoritárias e repressivas em nome da segurança nacional.

O nacionalismo exacerbado e a defesa de valores como “Deus, Pátria e Família” também podem ser vistos como resquícios da influência integralista. Muitos grupos conservadores e religiosos contemporâneos utilizam essa tríade de valores para fundamentar suas pautas, buscando uma moralização da política e da sociedade. Essa ênfase na identidade nacional e nos valores tradicionais, embora presente em diversas correntes, tem no Integralismo uma de suas expressões históricas mais fortes no Brasil.

Embora o corporativismo integralista, em sua forma original, não seja uma proposta ativa na política atual, a ideia de um Estado forte e intervencionista, que regula a economia e as relações sociais em nome do interesse nacional, ainda pode ser detectada em certos setores. A desconfiança em relação ao liberalismo econômico e a valorização de uma governança centralizada para resolver os problemas sociais são pontos de convergência ideológica, mesmo que não haja uma adesão explícita à doutrina integralista.

Pequenos grupos e movimentos isolados, geralmente de extrema-direita, ocasionalmente se referenciam ao Integralismo, seja através da reativação de símbolos, da celebração de datas históricas ou da releitura de obras de Plínio Salgado. Esses grupos, embora minoritários, demonstram a persistência de uma memória e de uma identidade integralista que continua a se manifestar em nichos específicos da sociedade, buscando uma conexão com um passado glorioso e uma legitimação histórica.

A polarização política e a rejeição à “velha política” ou “sistema” também podem ser vistas como ecos de sentimentos integralistas. O movimento original criticava a democracia liberal e os partidos políticos, propondo uma nova ordem. Atualmente, a retórica antipolítica e a busca por líderes fortes que prometem “salvar” a nação podem, em alguns casos, tocar em cordas sensíveis que já foram exploradas pelo Integralismo em momentos de crise e desilusão com a política tradicional.

Assim, embora a Intentona Integralista tenha sido um fracasso militar e político para a AIB, e o movimento integralista original tenha sido desarticulado, suas ideias e sua maneira de ver o mundo continuaram a influenciar o debate político brasileiro. Essas influências não são necessariamente diretas ou explícitas, mas se manifestam na permanência de certos temas, na persistência de retóricas e na atração por modelos de ordem e autoridade em momentos de instabilidade social.

Qual a importância de estudar a Intentona Integralista para a compreensão da história brasileira?

Estudar a Intentona Integralista é de extrema importância para a compreensão aprofundada da história brasileira do século XX, pois o episódio revela a complexidade das forças políticas, sociais e ideológicas que moldaram o país. A Intentona não foi um evento isolado, mas o clímax de uma década de turbulências, e sua análise permite entender a ascensão do autoritarismo e a fragilidade das instituições democráticas em um período de intensas transformações globais e nacionais.

O estudo da Intentona Integralista ajuda a compreender a natureza e o alcance do Integralismo, o maior movimento de extrema-direita de massas na história do Brasil. Analisar suas causas, sua organização e seus ideais permite entender como uma doutrina nacionalista e autoritária conseguiu atrair milhões de adeptos em um contexto de crise econômica e polarização ideológica. Isso oferece insights valiosos sobre as condições que podem levar à radicalização política e ao abandono da via democrática.

A Intentona é um capítulo fundamental para entender a consolidação do Estado Novo. O fracasso do golpe integralista forneceu a Getúlio Vargas o pretexto e a justificativa ideológica para endurecer seu regime, eliminando a última grande oposição organizada e centralizando ainda mais o poder. Sem a Intentona, talvez o percurso do Estado Novo e suas consequências políticas tivessem sido diferentes. O evento é um marco na história da ditadura varguista, ilustrando a lógica de repressão do regime.

A análise da Intentona permite examinar a dinâmica das relações entre os grupos políticos da época, especialmente a disputa entre a direita (Integralismo) e a esquerda (comunismo), e como o governo Vargas soube manipular essa polarização. A Intentona, precedida pela Intentona Comunista de 1935, expõe a violência política e a intransigência ideológica que permeavam o período, oferecendo uma visão clara do clima de incerteza e conflito.

O estudo do episódio também oferece uma oportunidade para refletir sobre o papel da violência política e das milícias partidárias na história brasileira. A AIB, com seus “camisas-verdes”, representava uma força paramilitar significativa. A proibição e a subsequente tentativa de golpe mostram as consequências perigosas de grupos armados que atuam fora do controle estatal, bem como a tentação de recorrer a meios não democráticos para a tomada do poder.

Para além da conjuntura específica, a Intentona Integralista continua sendo um alerta sobre os perigos do autoritarismo, da xenofobia e do esmagamento das liberdades democráticas. Ao estudar esse período, é possível traçar paralelos e distinções com movimentos contemporâneos, compreendendo como certas ideias e estratégias podem ressurgir em diferentes contextos, alertando para a necessidade constante de defesa dos princípios democráticos e da vigilância contra extremismos.

A Intentona Integralista, portanto, é mais do que um evento isolado; é uma lente através da qual se pode examinar a formação do Estado moderno brasileiro, as lutas por poder, a influência de ideologias externas e a capacidade de resiliência (ou fragilidade) da democracia. Sua análise é essencial para qualquer um que busque uma compreensão profunda dos caminhos trilhados pelo Brasil e dos desafios históricos que ainda reverberam na sociedade atual.

• Compreensão do Autoritarismo: A Intentona revela como movimentos autoritários tentaram ascender ao poder e como o Estado respondeu, consolidando sua própria ditadura.
• Análise do Integralismo: Permite um estudo aprofundado do maior movimento fascista brasileiro, suas causas, ideologia e impacto social.
• Consolidação do Estado Novo: Demonstra como o fracasso do golpe integralista foi instrumentalizado por Getúlio Vargas para fortalecer e legitimar seu regime ditatorial.
• Dinâmica da Polarização: Ilustra a intensa polarização ideológica da década de 1930 (comunismo vs. fascismo) e a violência política que a acompanhava.
• Lições sobre Democracia: Serve como um alerta histórico sobre os perigos do extremismo, da desestabilização política e da negação das instituições democráticas.
• Influências Ideológicas: Ajuda a rastrear a persistência de certos temas ideológicos (nacionalismo, anticomunismo) na política brasileira ao longo do tempo.
• Papel da Força Armada: Evidencia o papel das milícias partidárias e do controle estatal sobre a força na definição dos rumos políticos do país.

Bibliografia

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